O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

1354 II SÉRIE - NÚMERO 43 -RC

Na verdade, resignava-me se acaso não houvesse outras leis para as quais VV. Exas. pedem a aprovação reforçada de dois terços. E para aquelas a que atribuem valor reforçado VV. Exas. prescindem da maioria qualificada, ou seja, de um consenso alargado!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado, em termos de coerência intrínseca adiantei aquilo que lhe posso adiantar nesta sede e neste momento. Já em termos de posição face ao quadro movente da revisão constitucional os Srs. Deputados terão a nossa maior atenção e empenhamento na consecução de soluções de defesa da Constituição. Não encontrou da minha parte nenhuma espécie de objecção a alguns dos argumentos que foram expendidos para legitimar ou justificar a exigência de uma maioria especialmente qualificada para aprovação de certas leis.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não duvido da sinceridade de V. Exa. mas, sim, de que tenhamos o mesmo conceito de Constituição a defender. De facto, o Sr. Deputado pensa que a Constituição a defender é a que está, enquanto que o PS considera que é a do País em qualquer das suas formulações. Porém, a que está não é, para nós, necessariamente, a melhor de sempre. Portanto, o PS quer outra melhor do que a que existe, enquanto o PCP pensa que a vigente é melhor do que qualquer outra que venha. É esta a divergência entre nós.

O Sr. José Magalhães (PCP): - V. Exa. acaba de enunciar - em termos que são, quanto a nós, extremamente negativos, mas que exprimem e sintetizam rigorosamente o vosso pensamento - um dos problemas centrais deste processo de revisão constitucional e um dos aspectos-chave para o futuro do regime e dos nossos próprios partidos...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não há dúvida nenhuma! Temos, aliás, consciência disso!

O Sr. José Magalhães (PCP): - ... e do sistema político. Também não tenho dúvida nenhuma sobre esse aspecto. Essa é, de facto, uma questão cuja ultrapassagem dificilmente poderia ser feita neste momento e nesta sede.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não tem solução!

O Sr. José Magalhães (PCP): - No entanto, em relação à questão que se suscitou sobre a técnica normativa utilizada pelo PS e o seu modelo gostaria de fazer algumas observações que, de resto, dão resposta a interrogações colocadas pelo PS.

Quanto à questão da maioria de dois terços, creio que o problema é que o PSD quer libertar-se dos limites constitucionais praticamente em todas as zonas - não apenas naquelas que o PS considera justificadas, mas noutras. E isto é uma margem de discordância entre o PS e o PSD, o que, aliás, é visível. O PSD quer o "bom senso" consensual sem "constrangimentos"; quer forçar resultados e consensos sem negociações, baratos e sinalagmáticos; quer, por exemplo - isso resultou muito claramente da intervenção do Sr. Deputado Rui Machete -, poder (como já ocorreu!) restringir à vontade os direitos dos partidos da oposição, aprovar a Lei da Rádio, o Regimento e a Lei Orgânica da Assembleia da República e, ao mesmo tempo, pedir consensos para alteração da organização económica... Eis todo um estão de fazer política e encarar o regime...

O Sr. Presidente: - Isso não resultou daquilo que eu disse! V. Exa. está a fazer uma interpretação que considero abusiva, mas isso é consigo!...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Lamento muito, Sr. Deputado Rui Machete. A experiência que tivemos da discussão da Lei Orgânica da Assembleia da República e do Regimento legitima todas as desconfianças. Nesse sentido, estou inteiramente de acordo com as afirmações produzidas pelo Sr. Deputado António Vitorino, no sentido de que se trata de uma questão de garantia e de segurança. Acontece que as questões de garantia e de segurança se colocam perante a natural desconfiança existente entre forças políticas e partidárias num determinado sistema político e este funciona como maneira de gestão e de arbitragem, de conglobação, e não apenas de somatório dos conflitos desenvolvidos por esse sistema de mútuas e recíprocas desconfianças, com todas as suas dimensões e afloramentos em todos os terrenos: no político, económico, social, cultural, etc.

Há, de facto, a esse nível muitas evidências contrastantes e chocantes. O espaço de compromisso deveria constar da Constituição em todas as suas dimensões e corolários. A luta pela transformação da Constituição no sentido de favorecer o partido que alcançou uma maioria absoluta num determinado momento histórico coloca problemas e desafios que põem em causa o sistema constitucional e a própria vitalidade da Constituição. Há riscos de dissolução do seu normativismo numa espécie de decisionismo, sujeito às incertezas da gestão do sistema pelo partido que o controla e que aspiraria a dominá-lo integralmente. A desconfiança existe, a experiência concreta das leis que referi é fundamental que esteja presente nesta sede, porque as descargas projectadas podem ser fundadoras de processos de maior gravidade ainda do que os que se verificaram na constância desta Constituição com o seu texto (refiro-me, por exemplo, à lei dos 49%).

Estou, repito, de acordo com as observações feitas pelo Sr. Deputado António Vitorino quanto à inaceitabilidade da visão que o PSD tem da intangibilidade do princípio maioritário e da leitura maximalista que dele faz, que é, no limite, aniquiladora dos direitos das maiorias e propiciador de uma concepção nos termos da qual a Lei Fundamental acaba por ser propriedade da maioria. A Constituição não seria então apenas minimalista, mas também minimalista e apropriada monopartidariamente. E essa seria a pior das soluções imagináveis, sobretudo se somada a um princípio que permitisse a transcedência plebiscitaria (camuflada ou não) da Constituição, através de mecanismos de intervenção ou pseudo-intervenção popular na decisão de conflitos accionados pelo chefe, em conjunturas controladas pelo partido do Poder, e só por este, à margem de mecanismos institucionais de controlo (descrevi a solução proposta pelo PSD em matéria de referendo).