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1842 II SÉRIE - NÚMERO 58-RC

esses valores - os que não nos dividem e, estou em crer, que nem os dividem do Sr. Deputado José Magalhães - que devem constar desses artigos. Portanto, esta ideia de transformação, de transitoriedade, não é própria de uma Constituição; para além da carga ideológica-programática, dá uma ideia de devir à sociedade portuguesa a caminho de uma meta fixa que se me afigura completamente inadequada ao texto constitucional. É este o conjunto de razões que nos levam a propor a alteração do artigo 1.°

Congratulamo-nos também com a circunstância de esse conjunto de razões ser mais ou menos comungado por um amplo leque de partidos autores de projectos de revisão. Diria mesmo que, em relação a tais artigos, as razões são comungadas por todos os que propõem a sua alteração. Há um mínimo comungado por todos, embora haja aqui gradações. E o CDS faz votos para que nesta matéria - embora congratulando-se com a evolução positiva verificada, designadamente pela parte do PS - não nos quedássemos pela formulação do PS. Supomos que seria importante, apesar disso, ir mais além nessa tentatvia de expurgo da ideologia e da transitoriedade em relação a estes artigos.

O Sr. Presidente: - Pedia ao Sr. Deputado José Magalhães que presidisse por cinco minutos, e pode começar por se inscrever a si mesmo. Perguntava então quem é que quer usar da palavra entretanto.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Se houver alguma observação complementar da bancada do PSD, no sentido de justificar a proposta que apresentou, não usaria da palavra e aguardaria; no caso de ter sido feita a apresentação em termos cabais, ainda que não tenha sido feita a fundamentação em concreto da proposta do PSD quanto à parte, vamos chamar-lhe, positiva, usaria eu da palavra, sem esgotar a margem de apreciação possível.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pedro Roseta, quer usar da palavra?

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Preferia usar da palavra no fim.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: não nos contamos entre aqueles que apresentaram propostas de alteração nesta matéria. Entendemos que não cabia, da nossa parte, qualquer alteração do sentido e natureza da Constituição em relação ao que se dispõe neste seu primeiro artigo, com o conteúdo e as implicações que a hermenêutica lhe vem reconhecendo e que, pela nossa parte, consideramos correcto. Não vale a pena reconstituir as raízes, a genealogia e os meandros da confecção desta disposição da Constituição da República Portuguesa. Apenas sublinharia, pela minha parte e neste momento, que seria falsear a realidade histórica e elementares aspectos de reconstituição dos processo de elaboração da Constituição da República Portuguesa, sustentar que, na elaboração desta preceito, não houve um esforço compromissório. Os diversos partidos, com assento na Constituição, puderam, na verdade, terçar armas, gizar expressões de concepções de mundo diferentes e elaborar uma norma constitucional com a mesma dignidade das demais inserida nos princípios fundamentais. Tratou-se de um acto livre, tratou-se de um compromisso constitucional, fixado em condições históricas pelo próprio devir das coisas, alteradas, designadamente pela mudança de posicionamento de alguns dos protagonistas do processo constituinte. Que se ofereça hoje um outro conspecto não nos suscita senão uma discussão e uma crítica quanto aos seus aspectos negativos; que se dissociem da Constituição, reescrevendo a história, aqueles que são os seus autores, parece-nos mais questionável do ponto de vista político, e isso mesmo criticamos. O que seja o socialismo constitucional é alguma coisa que só pode atingir-se fazendo uma análise seguramente aprofundada das diversas disposições constitucionais a partir das quais ele se pode reconstituir. Não se trata do decalque de qualquer noção importada, não se trata da cópia do programa político-partidário de qualquer partido, não se trata de uma pura imitação; trata-se de uma construção que é o produto de uma conjugação de esforços. Isto é alguma coisa que não sofre contestação razoável; afirmá-lo é dizer o direito tal qual ele foi gerado num determinado contexto.

Sucede que o CDS confessou aqui que tinha in itinere descoberto uma outra verdade, concluindo que fora enganado. Não poderá esquecer-se, em matéria de enganos, que foi ele próprio defensor de um "socialismo personalista" consoante nos disse em 1974, nesses anos de brasa, ele próprio defensor de uma "sociedade sem classes" (e tal, a "amaldiçoada", a "horrível", a "dogmática", a "determinista"), defendeu uma sociedade sem classes talvez por ser apenas de proprietários, proclamou a "necessidade de supressão do capital" através da sua absorção por todos, uma migalha a cada um, porventura uma "migalha" maior para alguns do que para outros, etc.. Mas, afinal de contas, o CDS tinha sido completamente enganado. Tendo sido enganado, votou contra a Constituição.

O PSD não! O PSD, em relação a este artigo, achou que devia projectar na Constituição a sua própria concepção de socialismo, e é saboroso reler as actas desse tempo e verificar as considerações que os deputados de então do PSD fizeram sobre a sua própria noção de socialismo. Pouparei aos Srs. Deputados do PSD o horror, ou pelo menos o incómodo, de terem de ser confrontados com os seus próprios irmãos de sangue a propósito das coisas "deletérias" e "horrendas" que. eles disseram, absolutamente insensíveis a estas ideias aqui evocadas tão, tão, tão "modernas" de "mutabilidade", "antidogmatismo", "pragmatismo", "historicidade", "complexificação social", "aclassismo", etc. Os pensadores sociais-democratas de hoje são seguramente muito diferentes dos pensadores sociais-democratas de ontem, e seguramente diferentes dos pensadores sociais-democratas de amanhã, o que, obviamente, valerá o, que valer para o PSD como partido, mas não deixará de suscitar aos portugueses alguma perplexidade. Não é por acaso que o PSD se apresenta hoje como um partido pragmático, um partido que não confere à questão principológica uma importância tão grande, um partido empregador, um partido garantidor. Ora um