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28 DE NOVEMBRO DE 1988 1847

possível de liberdades. E as desigualdades sociais e económicas devem ser organizadas por forma que se possa razoavelmente esperar que sejam vantajosas para todos. Acresce que devem estar ligadas a posições e funções que, embora detidas por alguns em determinados momentos históricos, estejam abertas a todos os outros, a todos sejam acessíveis.

Poderia ainda precisar as diferenças entre os conceitos de justiça comutativa, própria dos neoliberais, com os quais não nos identificamos obviamente, apesar daquelas confusões ideológicas e daquela amálgama, muito típica dos comunistas portugueses - lá fora, muito menos -, que aqui foram despejadas, e de justiça distributiva, esta sim essencial para os sociais-democratas. Quererão VV. Exas. que recorde as noções de justiça comutativa, nos termos da qual o Estado deve garantir a equivalência dos valores permutados, ou seja, que cada qual deve receber de acordo com a prestação que efectuou, bem diferente da justiça distributiva, segundo a qual cada cidadão deve receber proventos da colectividade atendendo não só ao tipo de actividade produtiva que lhe presta permanentemente mas também à situação social de carência em que se encontra?

Portanto, o nosso sentido de justiça social é baseado no pensamento social-democrata de hoje na doutrina social da Igreja e também em alguns filósofos contemporâneos que, distinguindo muito claramente entre a justiça comutativa e a distributiva, dizem que sem esta última não há verdadeira justiça. O primeiro é um conceito redutor neoliberal e, por isso, o PSD insiste que, embora não querendo de modo algum ideologizar, ele próprio, a Constituição, há um leque muito largo de valores que são aceites por variadas correntes de pensamento e forças políticas que delas se reclamam. E, sendo elas representativas de uma esmagadora maioria da população, seria perfeitamente defensável a introdução dos referidos valores na Constituição, sendo certo que, como já disse, na nossa opinião, este primeiro artigo deve ser emblemático e axiológico - um preceito que contenha valores, e não objectivos, pelas razões que já largamente expendi. Aliás, em relação a estes valores, como a solidariedade e a justiça, foi dito pelo Sr. Deputado José Magalhães que os aprovava. Não sei por que é que V. Exa. está à espera de subscrever...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Desculpe interrompê-lo, Sr. Deputado, mas o que V. Exa. acaba de dizer é impossível!...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - ... a nossa proposta de consagração destes valores neste artigo emblemático da Constituição.

Em conclusão, o PSD, para além da suspensão daquela expressão oriunda de doutrinas de raiz marxista que debatemos há pouco, propõe a consagração dos valores de solidariedade e de justiça social que dignificariam a Constituição da nossa República. Julgo, aliás, que vão congraçar em breve uma larguíssima maioria entre as forças políticas representadas nesta Câmara.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Lara.

O Sr. Sousa Lara (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não quero deixar de me congratular com a introdução feita pelo meu companheiro e colega de bancada Pedro Roseta, que assumo também integralmente.

Desejo ainda fazer um pequeno comentário a título pessoal, se me é permitido, às propostas formuladas pelos Srs. Deputados Sottomayor Cárdia e Helena Roseta. Suponho, aliás, que o poderei fazer, embora eles não estejam presentes na reunião da Comissão.

Ora, como já de disse, e mais do que uma vez, os primeiros artigos da Constituição são emblemáticos, pois assumem também a função de pórtico do edifício jurídico português, E, por isso mesmo, devem traduzir os parâmetros essenciais da sociedade portuguesa.

Na verdade, apesar de todas as críticas que tenho ouvido relativamente às propostas para o artigo 1.° dos Srs. Deputados, que referi, penso que elas têm uma virtude. Refiro-me ao facto de referirem no n.° 2 do proposto preceito a expressão "nação portuguesa". Portugal é uma das mais antigas nações da Europa. Trata-se, aliás, de uma característica que nem todos os Estados europeus podem reivindicar e, por isso, entendo que é feliz esta proposta. Evidentemente que é atendível a crítica que se aponta a ambas as propostas de pretenderem dividir o artigo 1.° em números, sendo ele um preceito especialmente solene. Suponho, aliás, que esta crítica é comumemente aceite por todos os presentes e, por conseguinte, não colhe nem uma, nem outra proposta. Mas fica feito o meu elogio do seu mérito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que estes artigos iniciais são princípios estruturantes do texto constitucional não só pela própria designação, mas pelo seu conteúdo. Nesse sentido, admito que haja um relativo consenso quanto a considerar o Estado Português como um Estado de direito, republicano, democrático e social. Por isso, esta questão da sociedade sem classes tem de ser vista e tida como uma referência histórica datada, cujo conteúdo continua a ter sentido, se for lida num sentido de solidariedade social, e não só individual, e igualitário.

Portanto, a supressão desta fórmula é mais uma superação de uma hipoteca nominalista da Constituição e menos uma transgressão de valores fundamentais. E não o é em nome da recusa da utopia, porque esta frase construiu-se como uma utopia concreta e tal verificou-se a partir da "Crítica do Programa Gotha", de Marx, que teve grande tradução no movimento operário e popular. No entanto, a ideia de utopia concreta está inserida no nosso texto constitucional.

Penso que quando se fala na construção de uma democracia económica, social e cultural e no aprofundamento da democracia participativa, estas não são realidades que estejam tout court realizadas hoje. Por isso, há neste ponto uma dimensão utópica, um sentido prospectivo. Assim, a utopia em si não é algo de liminarmente recusável, mas, pelo contrário, dá um sentido dinâmico à realização da democracia.

Além disso, tanto quanto sei, a ideia de classe social não é univocamente recusável no pensamento social-democrata ou no socialista. A ideia de classe so-