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28 DE NOVEMBRO DE 1988 1849

O Sr. José Magalhães (PCP): - Pode suceder é que não se apure futuramente o entendimento que presidiu à alteração da norma constitucional!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Isso era o que o Sr. Deputado queria!

Risos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Isso é seguramente o que está alcançado neste momento!

O Sr. Pais de Sousa (PSD): - Sr. Presidente, Sr s. Deputados: Quero apenas deixar uma, talvez duas breves notas face ao debate que está a ser travado.

A primeira é para, de alguma forma, contraditar a perspectiva que o Sr. Deputado José Magalhães tentou imprimir à concepção do PSD, lendo-nos aqui alguns extractos do programa do nosso partido. É que nós não confundimos a lei fundamental com o programa do partido. Para nós aquela está bastante para além do partido, e não colocamos no mesmo plano uma e o outro. É que a nossa proposta para o artigo 1.° visa substituir ou de alguma forma eliminar a expressão "empenhada na sua transformação numa sociedade sem classes", porque se nos afigura que esta expressão é ideológica, equívoca e restritiva.

Por outro lado, queríamos acentuar que de um artigo, emblemático, como é o artigo 1.° devem constar os grandes princípios de valor da nossa lei fundamental, e portanto as suas matrizes, que foram de alguma forma referidas pelo Sr. Deputado Alberto Martins, e desde logo a matriz democrática e a social. A nossa proposta visa expressamente a introdução dos valores "solidariedade e justiça social", que, no fundo, são comuns às várias forças políticas, o que, curiosamente, foi também certificado, directa ou indirectamente, pelo Sr. Deputado José Magalhães. E isto à luz da regra do máximo denominador comum sobre estes conceitos. Sobre estas perspectivas temos abundantes exemplos travados aqui na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional aquando da primeira revisão em 1982.

Para o PSD uma Constituição é, ou pelo menos deve ser, um conjunto de princípios e de normas jurídicas que, definindo democraticamente um projecto para um todo colectivo, se abre ao pluralismo. Nesse sentido a Constituição não tem que ser, sequer acessoriamente, depósito de qualquer princípio ideológico, ou, como alguém disse, "não tem de ser, não deve ser, não pode ser, um catecismo doutrinário". A proposta do PSD visa um mínimo de articulado, com conteúdo cabal, para um máximo de consenso nacional.

O Sr. Presidente: - Vamos ver se conseguimos ultrapassar este problema. Faria um breve resumo da posição do PS. Depois de vos ouvir com todo o enlevo e atenção, encontro-me, mais uma vez, na posição em que me encontrei com frequência nesta Comissão, ou seja, a de tentar, até onde posso, pôr alguma simplicidade naquilo que os meus colegas e amigos, por excesso de inteligência, de perspicácia e de cultura, por vezes dificultam, quando as coisas já são de si difíceis, como é o caso.

Queria dizer, pura e simplesmente, que para nós está em causa um problema de semântica constitucional. Fundamentalmente está o problema de uma frase. Cada

um de nós tem um entendimento do que isso quer dizer. Todos sabemos o que é uma sociedade sem classes e com classes. Isto pode ser dito de milhentas maneiras, não necessariamente desta. Que no nosso país continua a haver discriminações e classes e que na Suíça, que por acaso é capitalista, não há é uma evidência. Esta frase é um pomo de discórdia em termos de Constituição da República. Vamos então eliminar esse pomo de discórdia e eliminar o correspondente problema semântico. Em vez de dizermos - e é só esse o sentido da nossa proposta - "empenhada na sua transformação numa sociedade sem classes", linguagem datada e apropriada por alguns partidos, um dos quais é o meu, temos que reconhecer que do léxico comum dos nossos dias, em Portugal, esta frase não consta. Não vejo ninguém andar por aí a raciocinar em termos de luta de classes. É claro, e devo dizê-lo, que ainda hoje entendo que as lutas de classe e os antagonismos sociais são factores determinantes da história. Mas não os únicos! Mas valerá a pena este pomo de discórdia, só porque uns acham que tem um significado marxista ou que reflecte a ideologia do partido A ou do partido B, e a Constituição não deve estar arrumada à ideologia de nenhum partido, antes deve ser a Constituição de todos os partidos e de todos os Portugueses?

O que propusemos? Aquilo que, em nosso entender, pode ser um substituto razoável e não conflitual da expressão "empenhada na sua transformação numa sociedade sem classes". Assim: "[...] na igualdade, na solidariedade e no trabalho, e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e fraterna". Devo dizer que considero que isto é mais do que aquilo. O que o PS propõe - "[...] na igualdade, na solidariedade e no trabalho, e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e fraterna" - é mais do que "empenhada na transformação de uma sociedade sem classes". Mas é também aquilo...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas isso deve dilacerar o coração do Sr. Deputado Pedro Roseta.

O Sr. Presidente: - Para tranquilidade de V. Exa., no nosso entendimento, é também aquilo. Porque, se houver justiça social, se houver fraternidade, se houver solidariedade, claro que não há classes. E não é por ser ou deixar de ser uma utopia. Temos na Constituição mais 55 utopias - passe a caricatura -, entre grandes, pequenas e médias. Há metas na Constituição que neste momento são irrealizáveis, são pontos de chegada, são aquilo para que a Constituição nos manda caminhar. Têm o valor que têm. São setas apontadas ao futuro.

Com o voto do PS sai de cá o "empenhamento na transformação numa sociedade sem classes", desde que o PSD vote uma proposta com a qual estejamos de acordo, Estamos naquele domínio em que a revisão constitucional é para nós muito cómoda. Feito o acordo mínimo com o PSD, não morre ninguém se cá ficar o que cá está. Espero que nos entendamos. Quando todos os partidos que fazem propostas eliminam esta expressão, a meu ver a expressão está condenada.

Outra questão é saber o que vamos cá pôr em troca. Era isto que devíamos discutir, e não o fizemos. Esse é que é o verdadeiro problema, porque todos nós, à