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24 DE OUTUBRO DE 1988 1573

soluções que não são compatíveis .com um quadro constitucional ,em que a regionalização da justiça não é, pura e simplesmente, concebível.

As confusões entre críticas por carências reais e pretensões inconstitucionais são, neste contexto, um risco real. Não posso esquecer que no último congresso do PSD, pela enésima vez, o Presidente do Governo Regional da Madeira entendeu desferir mais, uma violenta diatribe contra magistrados que labutam na Região Autónoma da Madeira, e deles disse o que o diabético não diz da glicemia: algo de uma veemência, de uma fúria e de. um furor completamente perturbadores, que não têm a mínima justificação. Mas, além de não terem a mínima justificação, são formas ínvias de assumir este facto: é que o governo regional não põe as mãos nos tribunais - mas não põe, nem porá, nem pode pôr!

Qualquer solução que faculte qualquer aproximação a essa solução é nefasta, não pode ser assumida, não pode ser aceite! O Presidente do Governo Regional da Madeira (nos Açores a situação é diferente)'pode ter uma coluna própria, diária, em que martele magistrados da Região com um azorrague, com toda a espécie de alusões, críticas, calúnias, ataques, o que quer que queiram. Mas uma coisa não pode: é ter quaisquer poderes na cadeia que se relaciona com o Ministério Público!

A proposta de artigo 230.°-A incorre num equívoco porque ou não diz coisa nenhuma e - para usar um símile da argumentação dos Srs. Deputados do PSD em relação ao artigo 230.° - é, puramente, redundante (diz o que lá está, e então não vale a pena estar com esta suspeição de que a República não compreende a necessidade de respeitar as especificidades da organização judicial) ou então diz algo de inaceitável.

Sucede que a República tem de compreender as especificidades! Por exemplo: a lei orgânica dos tribunais judiciais, embora tenha aberrações, não deixou de distinguir entre o regime dos Açores e da Madeira; contudo, quanto a nós, não teve minimamente em conta algumas das especificidades que devia ter tido em conta - mas o que é que, constitucionalmente, impede isso? O que é que impede a Assembleia da República de fazer uma sábia lei orgânica dos tribunais judiciais? A incapacidade de uma maioria conjuntural, mais nada! Está inteiramente livre o caminho para isso: os Srs. Deputados regionais do PSD é que não tiveram voz ou, se a tiveram, não tiveram no Governo ouvidos com qualidades de recepção adequadas para que esse vosso eco chegasse e fosse traduzido em lei. Mas não há nenhum obstáculo constitucional a isso.

Tomemos outro exemplo: a alteração da organização em matéria de tribunais administrativos e fiscais. É perfeitamente possível! De que é que se está à espera? Pela nossa parte, estamos inteiramente de acordo em facilitar o acesso à justiça fiscal e administrativa das populações dos Açores e da Madeira. É óbvio que sim! Adeqúe-se a orgânica! Inventem-se as fórmulas! Já se inventaram algumas no estatuto em vigor. Já se permite a entrega de petições junto dos tribunais comuns, para efeitos de serem encaminhadas para tribunais administrativos. Vá lá! Já é um passo! É um passo positivo, mas não chega! Há algum obstáculo constitucional em que se avance? Não há obstáculo nenhum, constitucional.

Uma norma deste tipo seria (retomando o fio à meada) ou prejudicial, equívoca, ou uma redundância e, nesse sentido, uma "suspeição inútil", para utilizar o vosso código analítico, em relação à capacidade, à percepção, à razão da República. Realmente, o vosso governo não inspira muita confiança nessa matéria e tem dado uns passos desgraçados, que inspiram uma certa suspeição, lá isso é verdade! Mas não eternizemos essa suspeição, dando-lhe dignidade constitucional. Ou quer-se outra coisa, regionalizar a justiça, por exemplo? A vossa proposta é muito inespecífica porque, embora falando de uma "organização judicial específica", não define em que é que consiste essa especificidade; em segundo lugar, permite - como o Sr. Deputado Guilherme Silva, sabiamente, acabou de revelar - através da conjugação com a vossa ideia do artigo 229.°, sucessivas delegações através das quais chegaríamos a que a Assembleia da República delegaria na assembleia regional a decisão sobre a definição das especificidades, com as consequências que bem se podem calcular...

Por outro lado, quanto à participação no estabelecimento da divisão judicial: se a vossa proposta traduz uma reacção ao facto de não ter sido respeitada pelo Governo da República, da última vez, aquilo que já é prerrogativa das regiões, não sei; agora, transformar aquilo que já consta do artigo 229.° num elemento adicional aqui repetido, também não me parece sábio. VV. Exas. já pensaram no que pode ocorrer se isto não for consagrado? Já pensaram no efeito negativo da apresentação desta proposta ocorrendo a sua rejeição? Entendo que a participação no estabelecimento da divisão judicial já é qualquer coisa que flui do disposto no artigo 229.° - mas VV. Exas., desgraçadamente, apresentam esta proposta. E se esta proposta é rejeitada? Que hermenêutica perversa não se pode gerar? Não seria melhor pensarem retirar, sabiamente, esta proposta, para evitar efeitos perversos? É que o artigo 230.° está e está! O facto de a vossa proposta ser rejeitada não tem nenhum significado. Em relação à vossa proposta 230.°-A, a ideia nela contida não está inequivocamente! E se não vier a estar, a título nenhum? O conteúdo constitucional deixa de ser aquele que é? É óbvio que sustentarei que não, e farei o melhor que me for possível, mas pode haver quem, malevolamente, faça interpretações perversas - que acho, aliás, absolutamente inaceitáveis - que conduzam ao resultado inverso daquele que VV. Exas. consideram ardentemente desejável...

O Sr. António Vitorino (PS): - São raras nesta Comissão!

O Sr. José Magalhães (PCP): - São raríssimas nesta Comissão, como VV. Exas. compreendem! Portanto, eu apelaria a que VV. Exas. reconsiderassem esta matéria toda, tendo em conta que o tiro está dirigido ao alvo errado, e mais: que o tiro pode ter boomerang, acertando em aspirações legítimas das regiões autónomas, caso em que VV. Exas. se transformariam não em benfeitores das autonomias regionais mas precisamente no contrário.

O Sr. Presidente: - Eu pedia a VV. Exas. o favor de avançarmos. Estamos a malhar em ferro frio! Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme da Silva.