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6 DE DEZEMBRO DE 1988 1911

É verdade aquilo que o Sr. Deputado Pedro Roseta diz, que não pode o Estado arcar sobre os seus ombros com a exclusiva responsabilidade dessa tarefa gigantesca. Porém, a verdade é que o artigo 9.° não refere que seja exclusivo atributo do Estado a promoção da igualdade real entre os Portugueses. Não menciona, pois, que a igualdade real dos Portugueses só pode ser alcançada através da acção do Estado. Pelo contrário, dispõe-se que o Estado, tal como interpreto e com a devida vénia, na esfera da sua competência própria ou no quadro da sua actuação promove a igualdade real entre os cidadãos. No entanto, para além do Estado, todas as outras instâncias, com relevância para a vida comunitária, podem e devem, no meu entendimento, contribuir no mesmo sentido, até porque aqui a referência ao Estado tem de ser entendida num sentido bastante amplo, ou seja, que não se restringe aos instrumentos político-jurídicos que a lei fundamental consagra às instituições político-jurídicas, que consagram o Estado em sentido restrito, mas tem de ser considerado como englobando o conjunto da comunidade em que nos inserimos. Aliás, só assim se pode entender alguma das outras referências que se contêm também neste artigo. De facto, não é só ao Estado que cabe, por exemplo, valorizar o património cultural. As esferas de iniciativa da sociedade e dos cidadãos como tais, por exemplo as iniciativas privadas de valorização desse património, são extremamente relevantes. O facto de se referir neste articulado que cabe ao Estado proteger e valorizar o património do povo português não significa que não haja outras iniciativas, também convergentes com este objectivo, fora do aparelho do Estado propriamente dito, isto é, dos órgãos e instituições do poder político. E o mesmo critério se poderia referir à garantia da independência nacional, que não é apenas garantia através da instituição militar ou do Estado armado, mas também de uma plêiade de entidades e de factores que ultrapassam em muito o sentido estrito da acção do Estado.

Estes são os comentários que faço às propostas do PSD no sentido da adesão à alínea e) e de reafirmar que preferimos a nossa redacção da alínea d).

Vozes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou, de seguida, exprimir o juízo da minha bancada sobre os preceitos em debate.

Na verdade, tudo está verdadeiramente na espada a que fez alusão há pouco o Sr. Deputado António Vitorino ou, então, no camartelo. A questão está mais no resultado do que na causa.

Já debatemos, a propósito dos artigos 1.° e 2.°, com que o artigo 9.° está inequivocamente conexionado, a parte substancial ou a questão fulcral que é suscitada nesta sede. A discussão sobre o socialismo constitucional tem neste ponto um corolário mas não a sua sede principal. Isto quer dizer que dou por reproduzidas as considerações feitas na altura própria sobre o significado das opções que o PS e o PSD pretendem praticar nesta esfera.

Não citarei de novo as declarações do Sr. Deputado António Vitorino na sede própria, em 1982, sobre a importância de que não se perdesse o norte da Constituição nesta vertente de orientação programática. Não reproduzirei, também, as declarações do Sr. Deputado Almeida Santos a propósito do mesmo tema e, designadamente, as suas fogosas congratulações pelo facto de as propostas da AD, com o seu conteúdo denso, não terem sido acolhidas nessa revisão constitucional "graças ao voto do PS". Hoje, é o PS que entende fazer as suas propostas, que então rejeitou e repudiou veementemente. Neste momento, o têmpora, é o PS que invoca a "necessidade de alijar" aquilo a que chama "a carga ideológica da Constituição", em busca de uma pax constitucionalis que não encontra interlocutor disponível. Revela-o bem o discurso do Sr. Deputado Pedro Roseta, mas outros há ainda mais ajivarados e assanhados nessa esfera. No futuro, partindo-se desta concepção, é possível imaginar outros discursos ainda mais carregados ideologicamente e, de resto, nada inocentes a propósito da supressão que o PS se dispõe a admitir...

Gostaria ainda de lembrar uma coisa, porventura esquecida: o artigo que estamos agora a discutir foi aprovado por unanimidade em 1982, como traduz o Diário da Assembleia da República, n.° 130, 1.ª série, de 30 de Julho de 1982, p. 5474.

Vozes.

Ora, na sua versão originária, o artigo 9.° referia qualquer coisa como isto: "b) Assegurar a participação organizada do povo na resolução dos problemas nacionais, defender a democracia política e fazer respeitar a legalidade democrática." Isso foi objecto do desdobramento que é patente. A alínea c) estatuía o seguinte: "Socializar os meios de produção e a riqueza através de formas adequadas às características do presente período histórico, criar as condições que permitam promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo, especialmente das classes trabalhadoras, e abolir a exploração e a opressão do homem pelo homem."

O que verdadeiramente é notável é que todo o debate desta matéria em 1982 foi percorrido por uma preocupação de tornar não fixa, ou não imobilista, mas, apesar de tudo, caracterizada por um certo número de balizas, a modelação dos contornos da organização económica nesta sede de fixação das tarefas fundamentais do Estado (em consonância com as grandes opções firmadas nos artigos 1.° e 2.° e, posteriormente, materializadas no título da organização económica propriamente dita). Em 1982 foi também eliminada a expressão "classes trabalhadoras", o que, aliás, aconteceu como critério geral, de resto proposto pelo PS em homenagem ao tal princípio da "descarga ideológica", com os resultados que hoje estão à vista, em relação aos quais não creio que o PS se possa congratular excessivamente (mas em matéria de morbidez política os limites são infinitos, como se sabe).

Curiosamente, na altura invocou-se a favor dessa opção uma linha de argumentação sintetizada, por exemplo, pelo Sr. Deputado Jorge Miranda que, a pp. 3332 e 89 do Diário da Assembleia da República, 2.ª série, n.° 108, de 8 de Outubro de 1981, dizia o seguinte: "Iria ao encontro de algumas preocupações da Aliança Democrática e não deixaria de conter referência à socialização dos principais meios de produção, entendida não como objectivo fixo, imobilista e absoluto, mas com um certo número de balizas que a organização económica teria de aceitar." Depois, o mesmo depu-