O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

6 DE DEZEMBRO DE 1988 1913

afirma que, feito tudo o que o PS se dispõe a fazer, não haveria alteração do conteúdo fundamental da Constituição. O PS agiria meritoriamente no intuito de retirar "a carga ideológica", "o carácter unilateral", "o carácter marcado do conteúdo político da Constituição", e tudo o mais que o Sr. Deputado António Vitorino disse em linguagem própria de Partido Socialista e que o Sr. Deputado Roseta, numa outra óptica, qualificou como a "expurgação da vulgata marxista" e "da utopia totalitária", a "exclusão e postergação das normas programáticas", o "repúdio da demagogia panfletária", que, aliás, consta do programa do PSD, como ele, traumaticamente, referiu.

Tudo isso não conduz -segundo o Sr. Deputado António Vitorino - à alteração de uma característica fundamental da Constituição. Segundo o PS, trata-se de realizar e até aprofundar a democracia económica, social e cultural a que ficaria aludindo o artigo 2.° Em termos de definição principológica não haveria na definição das tarefas do Estado uma mutação essencial se fosse aprovado tudo o que o PS propõe - diz-se.

Creio que, sobre esse ponto, valeria a pena que o PS pudesse aprofundar um pouco os argumentos. A leitura que a proposta é susceptível de induzir é diferente; é, quiçá, contrária a essa. Ao suprimir-se a ênfase nos instrumentos - o instrumento transformação das estruturas económicas e sociais e socialização dos principais meios de produção - diminui-se uma componente, atenua-se e reduz-se uma componente fundamental do projecto constitucional e faz-se isso no pórtico, nas cabeças de capítulo da Constituição. Mas (como sabemos do texto do projecto do PS e até do texto do pacto entre o PS e o PSD) o PS e o PSD entendem que essa alteração quanto aos instrumentos deve ser praticada, também, nas sedes respectivas da constituição económica. E isso tem implicações muito concretas. Este artigo tem um valor a se, sabemo-lo, mas alterado assim e articulado com as outras alterações que o PS ou propõe ou se dispõe a pactuar, conduz ou pode conduzir a uma diminuição, uma redução, uma alteração, uma amputação de um dos vectores fundamentais do texto constitucional tal qual se encontra hoje conformado. E isso parece-nos profundamente negativo.

Por outro lado, gostaria de sublinhar que a alusão contida na parte final da proposta do PS ao conceito "modernização", decorrente de uma palavra polissémica por excelência, não diminui o alcance das questões que suscitei. Bem pelo contrário! Neste contexto, a palavra "modernização" pode assumir uma das suas leituras mais banais, menos alteradoras do status e menos compatíveis com um caminho de real aprofundamento da democracia económica, social e cultural.

Aquilo que afirmei aplica-se sem alterações e com agravamento àquilo que o PSD propõe, em particular à alínea d), que aparece inteiramente arrasada e esvaziada de conteúdo. Nesta matéria, aliás, o Sr. Deputado Pedro Roseta arvorou a alínea é) em pedra-de-toque definidora da entidade partidária e da distinção entre um social-democrata e um neoliberal. Mas não me parece, verdadeiramente, que a diferença entre tais famílias políticas possa estar nessa alínea - há-de estar seguramente até nas anteriores todas; nesta é que não está! Aliás, ela foi aprovada por unanimidade - aprovada por unanimidade pode ser a sua alteração, desde que o PSD precise um pouco mais as vantagens de introduzir na Constituição a expressão "ordenamento do território", que adiante já vem sugerida também.

Já tivemos ocasião de fazer um ligeiro debate sobre esta matéria, se não estou em erro, a propósito do artigo referente ao direito à habitação. Na altura, o PSD ficou de aprofundar pontos de vista que nos permitissem ter a certeza de que não estamos a introduzir na Constituição, por esta via, alguma coisa que poderia não ser mais do que uma homenagem a um jargão tecnocrático de voga passageira, que neste momento tem, por exemplo, projecção na designação de um ministério, mas que não é absolutamente seguro que tenha de ter projecção, por um lado, na designação dos próximos ministérios responsáveis pela mesma área e, seguramente, na Constituição, que tem uma aspiração de vigência superior à da duração do Sr. Ministro Valente de Oliveira. Gostaria que a norma "Valente de Oliveira" pudesse, apesar de tudo, ter uma duração de vida, política naturalmente, superior à do ministro em causa. Por outro lado, só assim ela poderá ter um conteúdo mais útil do que a mera menção, porque (como se sabe) não estamos a introduzir na Constituição, aqui, um conceito que tenha valor por si; ele há-de ter, como outros conceitos relativamente indeterminados da Constituição, um conteúdo correspondente àquele que decorre da conceptologia ordinária, comum, que a Constituição importa, de certa forma, absorve e perfilha, mas não tem um conteúdo constitucional autónomo, próprio.

Não faz sentido que a Constituição faça uma definição autónoma de ordenamento do território. Esta será, em grande medida, aquela que decorre daquilo que os nossos debates sejam. Sucede que o PSD, neste domínio, foi muito ateniense no apelo ao "salvai Atenas! Que Portugal nunca seja a Atenas da Europa!". Tal apelo poderia ter algumas vantagens e algum sentido, claro. Mas o PSD não foi muito específico em relação ao conteúdo concreto da sua proposta.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Era evitar a "atenização", no sentido de evitar o que é a Grécia hoje; isto é, que metade da população de Portugal se concentrasse na região de Lisboa e daí resultasse um enorme conglomerado à custa de toda a seiva económica, e até vital, demográfica, de todo o país. E seria mau mesmo se a concentração se desse para lá de Lisboa; também na cintura urbana do Porto, ou Grande Porto. Isto aconteceu na Grécia; certamente V. Exa. já visitou Atenas e sabe como é hoje horrível; uma cidade ultrapoluída, ultramegalópole, que tem quase metade da população daquele país. A minha referência era no sentido de que o ordenamento do território visa, entre muitas outras coisas, evitar isso. Julguei que tinha sido claro - nada tem a ver com a Grécia antiga, nem com a Atenas ideal, que todos nós amamos.

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado Pedro Roseta. Certamente todos nós visitámos já Atenas sem sair do nosso quarto, como manda um velho livro de viagens evocado por Garrett. Portanto, a questão que eu colocava não era essa. Como, obviamente, a definição do ordenamento do território não corresponde a esse excurso pela Atenas moderna e antiga que V. Exa. acaba de fazer, antes é um conceito com uma acepção