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1982 II SÉRIE - NÚMERO 64-RC

cão, por mais enfática que seja, não substitui essa coisa indispensável, que é a argumentação, a demonstração, a prova. E não basta citar Ross para desenhar em abstracto um trânsito constitucional e a seguir dizer "não, não é isto que acontece". Isso foi o que fez o Sr. Deputado António Vitorino, in illo tempore, há umas tantas sessões.

Sucede que é preciso fazer a demonstração de que com o projecto do PS está garantida a não alteração da identidade da Constituição. Aparentemente, o PS faz uma releitura do próprio acto definitório da identidade da Constituição para dizer que, verdadeiramente, aquilo que se julga fazer parte desse núcleo identitário, afinal, não fazia; que aquilo que se julgava que era estruturante, afinal de contas, não era estruturante; que aquilo que se julgava indispensável para a sobrevivência do projecto constitucional não o era; que as bases da legalidade constitucional e os instrumentos mais importantes para a legitimação do poder constitucional democrático afinal não o eram; e que os fundamentos da Constituição são alguns dos que em 1976, e em 1982, a Constituição admitiu e consagrou, mas nau todos os fundamentos que nessas alturas foram admitidos e consagrados.

E eu pergunto qual é a legitimidade para fazer essa subtracção. Que elementos e que argumentos é que podem escorar essa redução do núcleo identitário constitucional? Com que legitimidade se pode expurgar esse núcleo, sobretudo quando se considera que os elementos "não estruturantes" são, afinal de contas, precisamente aqueles que se relacionam com a delimitação do nosso modelo económico.

Em 1976, a definição dos limites materiais de revisão foi objecto de consenso, com excepção de uma alínea contra a qual o CDS votou. Nessa altura, o representante do PSD de então teve ocasião de dizer (o que, por uma questão de decoro, de memória e de fidelidade, é bom que se recorde) o seguinte: "O PPD está de acordo com todas as alíneas constantes deste artigo relativo à revisão constitucional, e é com profunda satisfação que vê aqui consagradas não apenas as conquistas da revolução republicana de 1910, mas também as conquistas da revolução democrática de 25 de Abril de 1974. As alíneas constantes do artigo definem aquilo que é para nós o essencial da Constituição, aquilo que marca a sua estrutura fundamental, aquilo que não pode ser alterado sob pena de esta Constituição deixar de ser a mesma Constituição."

O problema é que os que agora confessam que, afinal de contas, votaram em 1976 a constituição económica com reserva mental podem, mais tarde, numa nova fase, vir a dizer que, agora também, o seu voto se deveu a reserva mental, e contestarem, nessa mesma base, aspectos essenciais da liberdade e da democracia política.

Por sua vez, o PS, que entendeu em 1982 manter-se fiel ao compromisso democrático originário consagrado pela Constituição, pretende agora rever e reduzir o espaço desse compromisso. Entendemos que aquilo que o PS deve demonstrar é, por um lado, qual o seu critério para definir a não alteração da identidade constitucional. Por outro lado - exige-o a responsabilidade que assume, em termos de abertura de precedente de regime - tem de explicitar qual o critério que o leva a afirmar que este limite é "mais material" que outro. O que é que leva o Sr. Deputado Almeida Santos, horrorizado, a dizer: "O quê? Alterar" - como o PSD quer - "a norma que refere o pluralismo de expressão e organização política, incluindo o direito de oposição democrática, ou a forma republicana de governo, ou a independência nacional, ou os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos? Nunca! Isso seria um crime nefando!" "O PS" - dizia o Sr. Deputado - "tem muito medo que não seja respeitada uma Constituição democrática" (sic). O PS tem muito medo! Excelente frase, óptima preocupação! Pena que não tenha consequências!

O Sr. Almeida Santos (PS): - Isso foi em Macau ou aqui?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Foi aqui! É um medo continental!

Mas estes medos sazonais do PS, estes medos datados, estes medos selectivos, estes medos que aparecem ciclicamente e que, tal como aparecem, desaparecem - o PS vai mudando de medo - qual é o limite que têm? Hoje, mete um imenso medo ao PS que haja um decair dos limites materiais nas áreas compreendidas em diversas alíneas, mas não lhe mete medo nenhum, nenhumíssimo, que se verifique qualquer alteração em relação à diminuição da componente participativa, em relação à componente planeamento e em relação à componente, digamos, de controlo de riqueza nacional por meios públicos...

O Sr. Almeida Santos (PS): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do orador.)

O Sr. José Magalhães (PCP): - O grande problema do PS, nesta matéria, é apenas que alguém lhe diga que esta "revolução coperniciana" já estava descoberta há uns anos!

O Sr. Presidente: - E pur, si muove!

O Sr. Almeida Santos (PS): - E pur, si muove!

O Sr. José Magalhães (PCP): - O grande problema do PS é que alguém lhe diga que já andava há uns anos a falar e, até, a praticar o "movimento da Terra à volta desse Sol". Enquanto o PS, sentado nas cadeiras, ia fazendo a sua política no governo, aplicando, com problemas "gavetários", certas orientações, já o PSD tinha descoberto que era "prá frente, meia bola em força" e que Portugal haveria fatalmente de parar se não houvesse o tal constituicídio anunciado. Significa isto que por este caminho o PS ficará com revisão mas sem coerência!

Insisto: qual é o critério que permite afirmar que este limite é mais material que outro? Se se elimina a alínea f) por que é que não se pode eliminar, pela mesma ratio, a alínea sobre o republicanismo ou o sistema proporcional? Aceitam, porventura, que uma Constituição não deva ter qualquer elemento de garantia e que se possa fazer uma revisão conjuntural, em que se diga que há muitos limites, poucos limites, ou nenhuns limites? O problema ainda é que, fundamentalmente, aquele que o Sr. Deputado Almeida Santos - e regressámos a Macau - enunciava, de forma, infelizmente feliz, na sua citada conferência: "como evitar que a