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1986 II SÉRIE - NÚMERO 64-RC

contra ela e bem a denunciou como ferindo a identidade da Constituição. É à luz de tudo isto que me espanta que o Sr. Deputado José Magalhães tenha que vir dizer que é o projecto do PS, hoje, que rompe com o compromisso originário da Constituição renovado em 82 - esta da "renovação em 82" deixa-me boquiaberto! Porque já uma vez nesta Comissão citei de cor, agora cito por escrito, aquilo que o Sr. Deputado Carlos Brito disse a propósito da primeira revisão na sessão plenária da Assembleia da República de 12 de Agosto de 82, 1.ª série, n.° 132, p. 5581: "tal é o propósito verdadeiramente golpista contido na revisão que acaba de ser votada" (sic). Mais à frente dizia o Sr. Deputado Carlos Brito: "O PS cedeu às forças de direita, não as chaves de penetração em todas as salas, mas as que dão acesso aos paióis, às camaratas" (concepção curiosa) "e às posições mais estratégicas da fortaleza da democracia portuguesa" (como se as camaratas tivessem qualquer valor estratégico! - enfim, não discuto concepções militares). Neste quadro, não se vislumbra na revisão de 82 nenhuma confirmação, nem nenhuma renovação do tal "compromisso originário democrático", pelo menos nos termos do discurso do Sr. Deputado Carlos Brito na sessão que acabei de citar, no Diário da Assembleia da República que acabei de citar. Daí que não se introduza nesta segunda revisão nenhum modelo dissonante (como disse o Sr. Deputado José Magalhães), nem se abram as portas a regimes contrários às garantias do artigo 290.°, nem se possa falar em manipulação constitucional, porque todos os princípios constantes do artigo 290.° estão salvaguardados no texto da Constituição pelo projecto do PS. Caberá ao poder político legitimado pelo sufrágio accionar, a cada momento, esses mecanismos que subsistem na Constituição e definir o rumo da economia nacional. O Sr. Deputado José Magalhães já por várias vezes explicitou que o que o preocupava neste debate era a ligação a estabelecer entre esta revisão e, daqui a cinco anos, uma futura revisão. O que lhe digo, sinceramente, é que entendo pessoalmente que o facto de se eliminar, na alínea f) do artigo 290.°, a apropriação colectiva dos principais meios de produção e solos como limite material ao poder de revisão não implica que, daqui a cinco anos, se elimine a apropriação dos meios de produção no artigo 82.°, como nós propomos que a partir de hoje seja consignado. Pelo contrário: não implica automaticamente, nem em meu entender se deve consentir nessa eliminação. E isto porque se o PS preconiza uma transformação da Constituição no sentido da pluralização do programa económico constitucional, de permitir que a Constituição consagre um conjunto de mecanismos que o poder político usa, alternativa ou cumulativamente, consoante a vontade popular expressa no sufrágio, consoante as maiorias formadas em cada momento, não faria sentido que em contradição coonestássemos agora que, daqui a cinco anos, se procedesse à eliminação de todos os instrumentos de nacionalização, de socialização e de apropriação colectiva dos principais meios de produção, só porque neste momento entendemos que eles devem ser retirados do artigo 290.° da Constituição. Pelo que, em meu entender, não há nenhuma ligação legítima que se possa fazer entre a operação de alteração do artigo 290.° e a fórmula concreta segundo a qual esses princípios são hoje vertidos na Constituição em termos de articulado e que, em meu entender, devem continuar a ser vertidos para futuro no local próprio, mesmo depois da próxima revisão. Agora, também lhe dou o exemplo contrário: sou favorável a que, por exemplo, na próxima revisão não direi que se elimine tudo mas que se retirem, substancialmente, as referências às comissões de moradores (hoje organizações populares de base). Acho que, mesmo depois desta revisão, para respeitar o limite material do artigo 290.°, as normas que consagramos em matéria de comissões de moradores ainda são excessivas e que, na próxima revisão, é possível eliminar algumas delas. Até porque a única atribuição constitucional actual das comissões de moradores futuras (hoje, organizações de base) é o exercício de poderes delegados pelos órgãos da freguesia como faculdade (nem sequer como obrigação constitucional), isto é: se os órgãos da freguesia o decidirem, muito bem, exercerão esses poderes por delegação; se os órgãos da freguesia não o decidirem, não exercerão, portanto ficarão esvaziados de conteúdo prático.

Quanto à questão da identidade da Constituição, o Sr. Deputado José Magalhães aparentemente não gostou que se citasse o Alf Ross (talvez eu até compreenda porquê) mas a citação está feita e. por acaso, constitui um exemplo impressivo, e por ser impressivo não agradou ao Sr. Deputado José Magalhães. Quanto ao critério definidor da identidade constitucional, eu identifiquei-o na minha intervenção. Disse que o critério da definição do artigo 290.° e da caracterização da identidade da Constituição é exactamente o de garantir que nesse artigo 290.° se mantêm aqueles limites que manifestam o compromisso do ordenamento constitucional com os pressupostos políticos e sociais que se consideram fundamentais, no plano da legitimidade, para a sobrevivência do sistema político-constitucional português. E explicitei mesmo este critério: é um critério que se funda no elenco de pressupostos ideológicos e valorativos que constituem a base da legalidade constitucional. E essa legalidade constitucional, uma vez observada pelos detentores do poder político, é o principal instrumento de legitimação do exercício do poder político. De igual forma expliquei que de acordo com este critério, entendemos que os elementos do actual artigo 290.° referentes às organizações populares de base, ao planeamento democrático e à apropriação colectiva dos principais meios de produção e solos não integram na nossa interpretação este conceito de identidade da Constituição que explicitei, e que o facto de eles desaparecerem do artigo 290.° da Constituição não põe de forma alguma em causa a legalidade constitucional e nem de perto nem de longe se introduz qualquer factor de ilegitimação do poder político em virtude da alteração do artigo 290.° da Constituição. Portanto, eu disse qual era o critério de que me socorria na minha intervenção. Agora, quer outros critérios? Há debates doutrinários extensíssimos e interessantes sobre a sua determinação, debates esses que têm a ver, todos eles, com polémicas interpretativas da Constituição. Claro que ninguém é detentor da verdade sobre a identidade constitucional: o Sr. Deputado José Magalhães não pode aspirar a definir ex cathedra o que é o compromisso originário de 76, aparentemente renovado em 82 e que agora é subvertido - não pode pretender fazê-lo, nem sequer pode, em termos de seriedade intelectual, reivindicar para si uma tal responsabilidade histórica, que seria a de ser, mais e até para além do Tribunal Constitucional, o guardião do "es-