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8 DE OUTUBRO DE 1992 77

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, permita-me que lhe confesse que fiquei completamente surpreendido. Admitia que a proposta do CDS não entraria sequer nessa matéria, não iria ao ponto, que V. Exa. acabou de deixar exarado em acta, de suprimir os controlos constitucionais.

O controlo constitucional, mesmo naquilo que V. Exa. qualifica como um referendo obrigatório, tem uma função imensamente importante em todos os domínios. Desde logo, o de verificar se estão cumpridas todas as regras de carácter formal, verificar se a entidade é competente, se cumpriu todos os trâmites necessários, etc. E mais. Deve emitir-se um juízo sobre a natureza do instrumento. O Sr. Deputado suprime a intervenção do guarda a pretexto do facto de se tratar de um referendo obrigatório. Confunde o referendo obrigatório com o referendo sem controlo sobre um acto eventualmente inconstitucional que V. Exa., por essa forma, constitucionalizaria ou imporia através da supressão dos elementos de fiscalização. É um absurdo!

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não é absurdo porque os controlos constitucionais sobre o acto sujeito a referendo pelo Presidente da República mantêm-se a propósito do próprio acto. O acto não é constitucionalizado pela sujeição a referendo por parte do Sr. Presidente da República. O que V. Exa. tem é um controlo constitucional consagrado no artigo 118.° para a própria decisão de referendo. Isso é o que acontece com o controlo constitucional actual, que não se justifica no referendo obrigatório. Justificar-se-á apenas hoje em dia e em relação ao referendo facultativo.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): - Srs. Deputados, têm de se inscrever um de cada vez, se fazem favor.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, trata-se de uma questão levantada pelo Sr. Deputado José Magalhães numa interrupção e a que respondi.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): - Não me importo que se interrompam, mas respeitem as recíprocas interrupções. Caso contrário será difícil o registo das vossas intervenções.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Quero agora responder à questão do Sr. Deputado Jorge Lacão. Não sei se o Sr. Deputado entende todo o maquinismo a que me tenho estado a referir, porque este é o do referendo obrigatório, pois o Sr. Presidente da República não tem escolha nesta matéria, desde o momento que cumprimos os pressupostos constitucionais.

Diz V. Exa.: mas há transferência de competências! Aliás, transferência de competências é uma expressão que utilizamos mais do que uma vez nesta revisão constitucional. Discutiu-se a distinção entre transferência de competência e transferência de poderes.

O Sr. Deputado faz uma pergunta e apela para uma distinção que realmente existe. Ou da transferência de competências resulta urna abstenção futura do seu exercício por parte do Estado Português, e deixa de as usar, e então V. Exa. fala em transferência de competências por integração; ou o Estado Português transfere competências para as usar em cooperação, em comum, com a organização internacional que é beneficiária da transferência.

Devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que não me preocupo muito com a distinção. Gostaria era de saber quais são os efeitos práticos imensos que V. Exa. atribui a esta distinção e à necessidade de a fazer.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Posso responder?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Por mim, pode. Não sei se o Sr. Presidente autoriza.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): - Claro que sim, se respeitarem temporalmente a intervenção de cada um. Só quero que cada um fale por si, sozinho, não quero que acumulem as intervenções.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Obrigado pela sua tolerância, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): - Não é tolerância nenhuma! É o normal!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - O processo de formação de vontade nas organizações internacionais por cooperação implica a aplicação da regra da unanimidade de todos os elementos que integram os órgãos de decisão, o que significa que um Estado nunca perde qualquer prerrogativa própria no exercício da sua soberania, apenas partilha o processo de decisão em cooperação internacional. Sendo assim, é de estranhar que o CDS não tenha cuidado em fazer a distinção, querendo abranger num regime de referendo obrigatório todas as modalidades de participação do Estado Português em todas e quaisquer organizações internacionais. Isto denota que o CDS teve, do meu ponto de vista, uma total imprevidência na forma como concebeu esta proposta.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Jorge Lacão,...

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Está respondido.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Está respondido, mas quero salientar um facto.

Quanto às consequências práticas desastrosas de uma imprevidência do CDS, devo dizer que o não são, obviamente, até porque, Sr. Deputado, a transferência de competências para decidir, de acordo com o princípio de unanimidade ou de consenso, pode, na prática, implicar uma perda de autonomia efectiva do Estado Português.

Portanto, o que digo é que não é o somatório de casos tão assustadores, digamos assim, que nos leva a tomar cautelas especiais nesta matéria. Não basta dizer que isto é uma enormidade. Vamos sujeitar os Portugueses, todos os dias, a referendar tratados em que as transferências de competências se destinam apenas a um exercício em comum?! Porque, na realidade, pode não haver transferência definitiva de competências nesse exercício em comum, mas pode haver consequências para o Estado Português, pelo que o povo português pode ter interesse em referendar.

Sr. Deputado, se estamos abertos a fazer essa distinção, se consideramos mais grave a transferência de competências que se vai operar devido a esse tratado actual do que, por exemplo, a transferência de competências que se operou através da Organização do Tratado Atlântico Norte poderemos, efectivamente, discutir essa matéria. É matéria que poderemos discutir e que não devemos abandonar numa primeira abordagem do problema.

Portanto, Sr. Deputado, suponho que não existem essas consequências graves, em termos de impraticabilidade do