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8 DE OUTUBRO DE 1992 81

A seguir diz-se: "a aprovação de tratados". Mas, pela Constituição, quem aprova os tratados é o Governo, é a Assembleia da República, e o Presidente da República apenas os ratifica Há também aqui alguma confusão. Como é? O Presidente da República deixa de ratificar para aprovar directamente ele próprio? Desaparece a figura da ratificação ou ele ratifica aquilo que ele próprio tiver aprovado?

Tudo isto cria terríveis perplexidades técnicas e eu penso que o CDS, no seu entusiasmo de ver consagrada uma abertura ao referendo sobre Maastricht, não meditou profundamente sobre estes aspectos técnicos (para não falar nos políticos).

A seguir diz-se: "que comportem a atribuição a uma organização internacional". Mas o que é atribuir? O que é uma organização internacional para este efeito? E só o exercício de competências não também a atribuição das próprias competências? Quer dizer o menos justifica um referendo e o mais não justifica?

No caso de Maastricht, entende-se que há uma atribuição de competências quando se põem em comum algumas delas para serem exercidas por órgãos de gestão de que faz parte o próprio País? Pode dizer-se que essas competências são próprias de organização internacional?

Por outro lado, a expressão "competências do Estado Português" é tão vasta que dificilmente poderíamos deixar de fora algum tratado que viesse a ser assinado pelo Estado Português. Pelo menos, seriam muito numerosos os tratados que obrigassem a uma consulta referendaria e íamos com certeza bater a Confederação Helvética em número de referendos, o que, até aqui, tem sido praticamente impossível em termos de países europeus.

Há ainda um outro aspecto relativo ao n.° 4 do artigo 118.° que gostaria de referir: é que, ao mesmo tempo que se vincula o Presidente da República a um referendo nacional para a aprovação destes tratados, continuaria na Constituição a competência da Assembleia da República para "aprovar as convenções internacionais que versem matéria da sua competência reservada, os tratados de participação", etc.

Esta situação pode gerar alguma confusão, pois trata-se de duas competências que não podem existir em simultâneo. Logo, ou se expropria a Assembleia desta competência ou temos de fazer uma distinção subtil, segundo a qual a Assembleia continua competente quando não se trate de transferir ou de atribuir o exercício de competências. Mas, como a expressão "competências" é tão vaga e indefinida, não estou bem a ver como é que alguma vez um Estado assina um importante tratado internacional sem transferir competências, sejam elas maiores, menores, mais relevantes, menos relevantes.

Tudo isto, na verdade, gera um conjunto de perplexidades que desaconselha a consagração constitucional desta proposta e vem reforçar a razão daqueles que chamavam a atenção para as cautelas necessárias a um referendo sobre tratados complexos de direito internacional. Isto vem demonstrar que é muito mais difícil formular que defender ideias políticas, as quais, não obstante, poderão ser porventura generosas, bonitas, atraentes e apelativas para o povo.

E se, então, saltássemos desta para a formulação de um concreto referendo, veríamos que as dificuldades seriam ainda maiores, pelo que, provavelmente, os próprios defensores dessa ideia generosa acabariam por ver-se enredados em dificuldades das quais não seria fácil sair. Por esta razão, a posição do nosso partido sobre esta proposta não é diferente da que assumimos relativamente ao problema que lhe esteve na base.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, ainda no âmbito desta discussão, começo por dizer que, apesar de haver uma relação entre todos os projectos que abordam esta questão, parece-me que esta compartimentação não tem paredes muito sólidas, diria mesmo que tem paredes de vidro.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado, como sou o responsável por esta metodologia, devo referir que V. Exa. não levantou qualquer objecção, o que poderia ter feito na altura em que formulei a sua adopção, de forma a permitir-me reconsiderá-la.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Almeida Santos, uma grande vantagem deste sistema é o facto de V. Exa. poder usar da palavra após eu ter expressado uma determinada ideia, o que lhe permite dizer aquilo que pensa ser oportuno, mas agradeço que me deixe terminar.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Também tenho sido vítima desse direito!

O Sr. João Amaral (PCP): - Aliás, devo dizer-lhe que não o interrompi quando fez essa observação, pois começou por anunciar uma metodologia diferente e só depois da inscrição dos Srs. Deputados Nogueira de Brito e António Filipe é que propôs que fizéssemos um minidebate sobre este projecto, passando depois ao seguinte. Claro que admito que este é o sistema em curso, embora seja evidente a relação entre os três ou quatro debates que vão realizar-se.

Sr. Deputado Nogueira de Brito, o CDS apresentou um projecto de revisão constitucional com um preâmbulo detalhado, longo, exclusivamente centrado na temática europeia, porque é em torno desta temática que esta revisão constitucional está a ser feita. E quando o CDS justifica a proposta de referendo enquadra-a exclusivamente na necessidade de um debate em torno dessa temática.

O CDS parte da premissa de que o Acto Único Europeu foi adoptado sem o debate suficiente e, depois de reflectir bastante sobre essa questão e diferentes componentes, diz, a certa altura, o seguinte: "Se a necessidade de debate público era evidente em 1986 - Acto Único - e a advertência não foi ponderada, a mudança qualitativa de agora exige ainda maior audiência do eleitorado, mantido intencionalmente afastado do conhecimento do processo, das suas alternativas possíveis e das suas imposições prováveis." Em seguida, faz algumas reflexões acerca daquilo a que se chama "o europeísmo de confidencialidade."

Portanto, parece-me que o enquadramento com que a proposta é apresentada, como, aliás, já foi sublinhado também pelo Sr. Deputado Almeida Santos, se refere exclusivamente ao processo europeu e, concretamente, ao Tratado da União Europeia, mas entendo que a formulação que depois o CDS adopta ultrapassa claramente esse quadro, porque projecta uma solução geral e abstracta para todos os casos em condições tais que - e era este o ponto que queria levantar - suscita um debate em termos que acabam por ser desfocados da intenção inicial. Isto é, a norma é apresentada com uma certa justificação e num certo enquadramento e a discussão acaba por fazer-se em torno de outra questão e num enquadramento diferente.

Por exemplo, o enquadramento que acaba por ser chamado aqui é o da história constitucional do referendo e das considerações feitas por várias pessoas, nomeadamente o