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86 II SÉRIE - NÚMERO 5-RC

Por outro lado, também não vale a pena dizer, como o Sr. Deputado António Filipe, que a nossa posição põe em causa a democraticidade. Tão democrática é a democracia representativa como a directa: uma é aplicável nuns casos, outra, noutros. Mas afirmo mais uma vez que a democracia directa não é melhor em todos os casos. Não vale a pena termos essa ilusão! É que, senão, não tinha sido substituída, como veio sendo, em todos os países evoluídos, em termos democráticos, pela democracia representativa. A democracia representativa é uma necessidade dos nossos tempos; justificou plenamente a sua existência e não vamos agora pôr tudo isso em causa com todas as consequências que daí poderiam derivar.

No fundo, isto significaria, não uma norma transitória, como se disse aqui, mas suspender pontualmente a Constituição relativamente a um facto isolado, o que, devo dizer, criaria um precedente da maior gravidade, uma vez que estava legitimado o referendo para fazer revisões constitucionais. Só que, em vez de se fazer isso genericamente, fazia-se pontualmente. Isto é, cada vez que houvesse um dispositivo que não agradava ao povo português ou que os partidos entendiam que não agradava ao povo português - porque os partidos também fazem a interpretação da vontade popular, mas não dão, ao que parece, aos outros o direito de o fazer - suspendia-se a Constituição, ou seja, agora durante três meses a Constituição não valia relativamente a esta matéria...

Era gravíssimo, porque a Constituição não é para ser suspensa em casos pontuais e a propósito disto ou daquilo!...

Assim, faço outro desafio: é sempre possível referendar o plano europeu. Aliás, como acaba de dizer o Sr. Presidente - e vou-vos lembrar que a alínea f) do artigo 164.° só põe em causa a aprovação das convenções e não a sua revogação. Na verdade, entrámos para a CEE sem referendo, aprovámos a alteração do Tratado sem referendo - ninguém o exigiu nessa altura! Se isso era assim uma exigência tão indeclinável do povo português, nenhum dos partidos nem dos políticos que agora se levantam a defender o referendo o fez.

Ora, no meu entender, na altura, é que se justificava o referendo, isto é, quando da nossa entrada na CEE! Porém, ainda está de pé a possibilidade de um referendo para sairmos. Tenham a coragem de propô-lo!

O Sr. João Amaral (PCP): - Nós temos a coragem de propor uma coisa mais pequenina!...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Está bem, mas eu estou a justificar a minha posição contra a vossa proposta. Tenho esse direito, como certamente calcula.

Portanto, nós votaremos isso se se entender que é constitucional; se se acha que estamos lá a mais. E cada um assume a responsabilidade pelas consequências! Por que não? Isso aí é que seria coerente! Aliás, há um facto curioso: é que os partidos que propõem um referendo sobre Maastricht são, por coincidência, os que não gostam do Tratado. Portanto, não me venham dizer que é por razões que não são políticas e que as razões políticas são só as nossas!...

Aliás, o Sr. Deputado António Filipe disse que não considerava que houvesse razões válidas. Bom, se cada um de nós se põe a ajuizar sobre a validade das razões dos outros, veremos que todas elas são válidas, pois todas têm direito ao respeito daqueles a quem se dirigem, pelo que tanto são válidas umas como outras e são tão políticas umas como as outras, como é óbvio!

Então não é política a vossa posição contra Maastricht? Claro que é! Claro que é uma posição política! E têm direito a que seja! Afinal o que é que há de extraordinário em que a vossa posição ou a nossa seja política?!

Portanto, Sr. Deputado Mário Tomé, não venha dizer que há aqui parti pris em relação ao referendo e que não tem sentido o argumento de que o referendo é inconstitucional... Claro que tem! É evidente que se o referendo não fosse constitucional era muito mais fácil, e por esta razão: quando nós votámos, e os senhores também, as objecções, as dificuldades e as restrições ao referendo, sabíamos o que estávamos a fazer. E não julguem - e desculpem-me dizê-lo com toda esta frontalidade - que foi alheio ao facto de termos na mente a própria Comunidade Europeia... É claro que sim! Assumamos a nossa responsabilidade! Na altura, se alguma coisa ponderou no nosso espírito foi a preocupação de que viesse a ser exigido um referendo sobre a nossa permanência na CEE! Mas para isso até ficou a porta aberta, pois permanecer lá está em aberto; se o povo português entender que devemos sair, nós respeitaremos essa vontade. Isto tem sentido!

Se dissessem que, por exemplo, entrámos mal, as coisas têm estado a correr mal, o Tratado de Maastricht deu um salto de corsa, e, nesse caso, vamos sair com todas as consequências, assumindo cada um as suas responsabilidades - e quando digo cada um refiro-me a cada eleitor, pois nessa altura deixaremos de ser nós a ter todas as responsabilidades... Acho muito bem isso! Mas também é preciso respeitar a posição daqueles que são contrários ao referendo, porque se há razões - e reconheço que elas existem - favoráveis à convocação de um referendo, também há razões, e muito ponderosas, contra ele. Por exemplo, fala-se da menoridade do povo português e pergunta-se por que razão é que, se houve referendo em França, na Dinamarca e na Irlanda, não há-de havê-lo em Portugal? Bem, mas ainda há nove países que não fizeram o referendo! Será que também o consideraram um estatuto de menoridade para os seus povos?

A maioria dos países da CEE, até este momento, não aceita o referendo, pelo que estamos em boa companhia. E não vamos pensar em que somos uns irresponsáveis, uns antidemocratas, uns indivíduos que não percebem que o povo é que deve ter todo o poder nestas matérias... Pelo contrário, entendemos, bem ou mal, que há matérias que podem e devem ser referendadas e que há outras que não convém que o sejam. É o nosso ponto de vista, pelo que peço que o respeitem como nós respeitamos o vosso. Estamos em discordância, mas não devemos partir do princípio de que somos antidemocratas e que democrata é só aquele que quer ouvir o povo e que o povo deve ser ouvido sempre que quer. O povo provavelmente, quereria ser ouvido sobre muitas outras matérias, como é óbvio, e toda a gente reconhece que há matérias sobre as quais não deve ouvir-se o povo em termos de consulta directa.

Srs. Deputados, desculpem esta ênfase, mas a verdade é que vejo colocar a questão em tais termos que até parece que não somos democratas e que aqueles que querem o referendo é que são.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria de tecer algumas considerações sobre as observações que o Sr. Deputado Almeida Santos proferiu relativamente à nossa proposta respeitante ao referendo obrigatório.