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expresso e com a bondade do sentido desta proposta, sendo certo que gostaríamos que nos fossem feitos mais alguns acrescentos. De qualquer forma, temos a ideia de que a adequação em termos constitucionais do que aqui é proposto deve ser sempre filtrada na sua aplicação concreta por uma intervenção prudente do legislador.
Como tal, a pergunta que coloco aos autores da proposta é a seguinte: como os Srs. Deputados sabem, esta questão do segundo grau de jurisdição é uma das razões que leva a que ainda não tenha sido depositado o instrumento de ratificação de um dos protocolos do Conselho da Europa por parte de Portugal. É verdade que já aderimos e que já ratificámos este protocolo, pelo que até já há uma resolução da Assembleia e um decreto do Presidente da República, mas o nosso instrumento de ratificação ainda não foi depositado relativamente a esta questão do segundo grau de jurisdição e não o foi precisamente porque havia dificuldades de aplicação.
E as dificuldades radicam em dois pontos, sendo um aquele que o Sr. Deputado Luís Sá agora enunciou e que me leva a fazer uma pergunta. Quando se coloca o problema do recurso de decisão administrativa que aplica coimas de pequeno valor, por exemplo, deve haver lugar a um segundo grau de jurisdição?
O outro ponto é relativo ao processo penal. A própria Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que é muito precisa e preocupada na defesa de um segundo grau de jurisdição, admite excepções quando diz, num dos seus artigos, que a ideia de segundo grau de jurisdição admite excepções em relação às infracções menores, definidas nos termos da lei, ou quando o interessado tenha sido julgado em 1.ª instância pela mais alta jurisdição ou declarado culpado e condenado no seguimento de um recurso contra a sua absolvição.
Portanto, a dúvida que eu coloco aos Srs. Deputados é a que decorre do n.º 2 do Protocolo VII do Conselho da Europa, que é a extensão sem limites e que nalguns casos pode até não ser a solução mais adequada para a defesa dos interesses das pessoas. Qual é o limite do segundo grau de jurisdição? Não tem limites? Trata de forma igual a matéria administrativa, penal e cível? O que fazemos a estas restrições do Conselho da Europa e às dificuldades até de haver segundo grau de jurisdição no caso do recurso judicial de coimas de pequeno montante, ou seja, inferiores a 50 contos?

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, darei a palavra ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes, a quem se seguirão os Srs. Deputados do Partido Comunista para responderem.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, no fundo, como dizia a Deputada Odete Santos, esta questão já foi debatida longamente e a posição do PSD, também já expressa publicamente, pode ser sintetizada da seguinte forma: no fundo, concordamos com as preocupações do Partido Comunista no sentido de que poderá, de facto, haver determinado tipo de situações em que a não existência de um duplo grau de jurisdição seja fonte de injustiça. Mas também temos a consciência de que, de acordo com alguns dos exemplos dados aqui pelo Dr. Alberto Martins, há outro tipo de situações onde, a criar-se a obrigatoriedade absoluta de ser assegurado um duplo grau de jurisdição, isso pode ser contraproducente, tornando-se até pouco útil à administração da justiça.
Face a este impasse, temos dúvidas de que a consagração de um princípio de obrigatoriedade absoluta seja adequada. Parece-nos que actualmente a situação é resolvida pelo legislador ordinário e, do nosso ponto de vista, deve continuar a ser, se bem que, obviamente, com o âmbito das preocupações que foram expressas pela Deputada Odete Santos, pelo que o legislador ordinário deve procurar, no âmbito da nossa ordem jurídica, encontrar caso a caso as soluções em que a não existência deste duplo grau é foco e causa de injustiças graves, eliminando-as.
O que nos parece é que a forma como está arrumada a nossa ordem jurídica talvez não permita ainda a consagração de um princípio absoluto deste tipo, sob pena de obtermos, em alguns casos, resultados que se revelariam contraproducentes com aquilo que pretenderíamos atingir.
Em suma, não deixando de manifestar aqui a nossa receptividade às preocupações que estão subjacentes a esta proposta, temos algumas dúvidas - ou, pelo menos, deixamos a questão em aberto para uma melhor reflexão da nossa parte - de que se possa dar este passo no sentido de criar uma obrigatoriedade, ainda por cima com este carácter perfeitamente absoluto, quanto à exigência de existência de um duplo grau de jurisdição. A posição do PSD, neste momento, é mais de reserva, embora concordando com o fundo da questão.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Dou agora a palavra ao Sr. Deputado Strecht Ribeiro, também para intervir.

O Sr. Strecht Ribeiro (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, penso que não será errado constitucionalizar esta figura, embora seja sensível a uma fórmula que a limite. Digo que não acho errado porque mesmo onde o duplo grau de jurisdição já está consagrado não tem havido, em matéria de processo criminal, jurisprudência compatível com o próprio inciso constitucional que agora se propõe.
Na verdade, o Supremo Tribunal de Justiça e o Tribunal Constitucional rejeitaram sistematicamente a inconstitucionalidade das normas do Código de Processo Penal no tocante ao recurso para o Supremo Tribunal nos processos comuns colectivos, normas que, na minha óptica, são manifestamente inconstitucionais, porque, na verdade, não asseguram minimamente o segundo grau de jurisdição em matéria de facto.
Mas o mais estranho é que o Supremo Tribunal faz uma leitura restritiva daquela norma que, mesmo isoladamente considerada, exigiria um grande esforço para ser considerada constitucional. No fundo, fá-lo talvez por se achar um simples tribunal de recurso em matéria de direito, pelo que a forma mais simples passa por dizer "Esta norma nem esse conteúdo tem! Tem menos do que isso!" Ou seja, se a norma não fosse inconstitucional - e, do meu ponto de vista, é -, seria inconstitucional a interpretação que o Supremo Tribunal lhe dá. No entanto, essa inconstitucionalidade não tem sido assegurada no Tribunal Constitucional, porque este não tem revogado as decisões do Supremo Tribunal de Justiça.
Portanto, entendo que, mesmo como valor simbólico - e a Constituição também tem esse valor -, não seria incorrecto que ficasse consagrado constitucionalmente e de uma forma genérica o duplo grau de jurisdição. Apesar disso, reconheço que haverá situações em que este duplo grau de jurisdição não realiza o efeito pretendido e acaba por ser contrário ao interesse que visa proteger.