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O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, está agora esclarecido o único - vamos chamar-lhe assim - mistério que o debate de ontem suscitava. O outro não era mistério e foi "sherlockianamente" induzido pelo Sr. Deputado António Filipe, o que compreendemos. Mas não desejaríamos transformar a hermenêutica deste artigo…

O Sr. António Filipe (PCP): - "Elementar meu caro Watson!"

Risos.

O Sr. José Magalhães (PS): - … numa espécie de inquirição de uma coisa que não era elementar, "meu caro Watson"! Aliás, nem toda a gente é Sherlock e Watson. Só havia um, que, infelizmente, não tem presença na Comissão. Tenho pena!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, já agora, um pouco perversamente, esperaria que este qui pro quo tenha provocado o resultado contrário àquele que o Sr. Deputado António Filipe queria!

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto! Porque não há nenhuma razão para rejubilar sobre o caso concreto.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à discussão da proposta do PCP relativa ao n.º 5.
O actual n.º 5 do artigo 33.º da Constituição estabelece o seguinte: "A expulsão de quem tenha entrado ou permaneça regularmente no território nacional, de quem tenha obtido autorização de residência ou de quem tenha apresentado pedido de asilo não recusado só pode ser determinada por autoridade judicial, assegurando a lei formas expeditas de decisão." O PCP propõe que passe a constar: "A expulsão de quem tenha entrado ou permaneça no território nacional, de quem tenha obtido autorização de residência ou de quem tenha apresentado pedido de asilo só pode ser determinada por autoridade judicial, assegurando a lei formas expeditas de decisão com todas as garantias de defesa".
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, esta é uma proposta que vai contra a corrente dos últimos anos.
Efectivamente, o que se tem verificado, em particular no caso dos requerentes de asilo, é uma diminuição progressiva de garantias de defesa da sua posição, que nalguns casos vai ao ponto de nem sequer poderem apresentar os respectivos pedidos de asilo.
O texto constitucional actual parece-nos inadequado para tutelar direitos fundamentais de cidadãos que requeiram asilo a Portugal, na medida em que refere que é necessário que haja uma decisão judicial de expulsão só relativamente a cidadãos cujo pedido de asilo não tenha sido recusado. Ora, como se sabe, hoje em dia, e por força de alterações legislativas das quais discordamos profundamente em matéria de direito de asilo, a generalidade dos pedidos de asilo apresentados são apreciados no chamado processo acelerado, que não dá as garantias mínimas de defesa aos requerentes.
Existem casos, aliás - desconheço se estão a ser aplicados em Portugal mas, seguramente, já o estão a ser noutros países da União Europeia -, em que nem sequer se permite que os cidadãos apresentem os respectivos pedidos de asilo, sendo imediatamente expulsos, sumária e administrativamente, do respectivo território.
Creio, pois, que era importante que se prevenisse constitucionalmente, em Portugal, a ocorrência de situações dessa natureza. Daí que nos pareça fundamental, sem prejuízo da necessidade destas situações serem resolvidas de forma expedita (aliás, a Constituição já refere no seu texto actual esse carácter expedito), mas com garantias mínimas para os cidadãos, que seja uma autoridade judicial a tomar decisões que impliquem a expulsão de cidadãos do território nacional, não deixando essa decisão à discricionariedade administrativa, que é o que actualmente acontece com cobertura constitucional.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está à consideração a proposta do PCP.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a análise da evolução dos últimos anos tem sido feita por nós de forma crítica e, naturalmente, após o dia 1 de Outubro, nos termos que são conhecidos, de uma política que representa uma viragem significativa, que vai culminar numa revisão - já culminou! - de legislação polémica e traduzir-se na aprovação, esperamos nós unânime, de legislação correctiva em relação ao diploma que desfigurou o enquadramento legal do direito de asilo em Portugal, num certo Verão quente…
Mas, hoje, que estamos a analisar o quadro constitucional enquanto tal, não gostaríamos de transpor as entorses, os desvios de percurso e, francamente, as violações da Constituição, em casos significativos, para uma espécie de releitura da Constituição à luz da sua interpretação disforme, deficiente e, digamos sem brejeirice, "loureirista".
Esse período está encerrado e todos estamos a libertar-nos desse espírito (não foi por acaso que aprovámos por unanimidade os diplomas que aprovámos, e fizemo-lo à sombra desta "árvore" constitucional). E a Constituição interpretada correctamente - como muito bem o foi, ao longo de todo esse tempo, persistentemente, por muita gente, felizmente, incluindo o Sr. Presidente, por escrito, em determinada circunstância -, é clara quanto à consagração do direito de asilo, ou seja, não pode ser lida ao contrário. Não é obrigatório que façamos uma leitura em "zebra", mas é bom não esquecer que ela consagra e garante, de forma absolutamente inequívoca, o direito de asilo, o que tem implicações constitucionais e, também, legais extremamente precisas.
Tal significa que não é legítimo, nunca será legítimo, será sempre abusivo às autoridades do Estado português, quaisquer que elas sejam, inviabilizar o exercício do direito de asilo, impedindo aqueles que aportam ao território de disporem dos meios de declararem a sua vontade de o obterem, bem como de terem o direito a um tratamento equitativo e a um procedimento claro que lhes permita, de forma compreensiva, directa e clara, expor a sua pretensão e ver deduzida essa pretensão pelas autoridades portuguesas, com todas as garantias.
Portanto, o que gostaria de dizer - talvez um pouco mais economicamente - é que não leremos aquilo que já é património constitucional, face à "desleitura", "tresleitura" ou leitura violadora que foi feita num determinado período da história portuguesa. Ou seja, há "obras" de que nós não sentimos necessidade, porque consideramos que a Constituição sempre o estabeleceu.