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mudam! De resto, os governos, em Estados democráticos, são autónomos do poder judicial. Para a Amnistia, "dar garantias" não significa que existam garantias suficientes.
Por outro lado - temos aqui um retrocesso em matéria dos direitos humanos -, a extradição para países que apliquem a pena de morte ou penas perpétuas constitui incumprimento de tratados internacionais a que estamos vinculados.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr.ª Dr.ª Cláudia Pedra.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Dr.ª Cláudia Pedra, é precisamente em relação à norma da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen que citou que poderá suscitar-se a questão de saber se a ordem constitucional portuguesa permite cumprir o que aí se estabelece.
Como a Sr.ª Dr.ª Cláudia Pedra teve ocasião de sublinhar, essa cláusula prevê que os países subscritores possam conceder extradição se conseguirem, por meios adequados, garantir ou promover medidas que permitam, precisamente no caso concreto, não aplicar a pena de prisão perpétua.
A lógica dessas medidas não é aplicar a prisão perpétua nem - menos ainda, naturalmente - a pena de morte mas, sim, evitar a aplicação da pena de prisão perpétua, através de medidas substitutivas dadas por entidade idónea.
Ora, sucede que, segundo uma leitura da Constituição Portuguesa, aliás, feita há pouco pelo Sr. Dr. José António Barreiros, face à redacção actual do artigo 33.º, não seria possível ao Estado português cumprir essa cláusula que a Sr.ª Dr.ª citou. Essa cláusula foi feita na base de uma interpretação da Constituição segundo a qual, se não houver aplicação em concreto da medida drástica, Portugal pode extraditar. Se não houver aplicação, repito!
Havendo uma dúvida interpretativa dessa matéria, podemos ter duas atitudes.
A primeira atitude é ignorar a dúvida interpretativa - o Sr. Dr. José António Barreiros pensa que a Constituição não permite a extradição, a Sr.ª Dr.ª Cláudia Pedra pensa que ela permite, eu também penso que permite, etc., etc. A verdade, porém, é que os tribunais são totalmente independentes e, portanto, nuns casos entenderão que ela é possível e noutros casos não. Haverá, porventura, até flutuação de critérios: umas entidades pensam que é possível; outras entidades não!
A segunda atitude é aclarar a matéria em sede constitucional. E o que resultou um pouco dos depoimentos dos Srs. Ministros da Justiça e da Presidência, do Sr. Procurador-Geral da República e dos Srs. Presidentes do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal de Justiça foi a ideia de que existe uma forma de aclarar essa questão, tornando inteiramente líquido que a Constituição, em princípio, não permite a extradição quando no Estado requisitante a ordem jurídica preveja pena de prisão perpétua. Mas, a título excepcional, em certas circunstâncias e com todas as garantias, poderia permitir essa extradição.
O que lhe pergunto é o seguinte: considera que essa cláusula da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen satisfaria, então, as garantias de segurança e de protecção dos direitos humanos? É que, em nossa opinião, tal seria até um pouco mais vago do que o que decorre do texto que temos discutido até agora.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Dr.ª Cláudia Pedra.

A Sr.ª Dr.ª Cláudia Pedra: - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, para a Amnistia Internacional não existem essas garantias. Quer dizer, um Estado dá essas garantias, seja através dos seus tribunais, seja através do seu governo - deveria ser através do tribunal porque é este que vai julgar a pessoa -, mas essas garantias podem não ser cumpridas, na prática. Pode não existir efectivação prática das garantias que são dadas. Temos o exemplo da China, que ratificou a Convenção de Genebra relativa ao estatuto dos refugiados mas que não cumpre essa mesma Convenção.
Portanto, quem nos garante que esses Estados irão cumprir as garantias dadas, as tais "garantias suficientes" ou o que constar da redacção final? Não há efectivação prática dessas garantias.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Dr. José António Barreiros.

O Sr. Dr. José António Barreiros: - Sr. Presidente, sem monopolizar, gostaria de prestar alguns esclarecimentos, uma vez que tenho vindo a meditar um pouco acerca do tom da discussão e constato que ainda não se abordaram certos aspectos.
A primeira questão que coloco, numa espécie de "abrir de alma", como cidadão, qualidade em que aqui estou, é esta: no fundo, porquê rever o artigo 33.º? Será que é porque estamos em sede de revisão constitucional e, já agora, vamos rever o artigo 33.º?! Por acaso, dá-se a circunstância histórica de estarmos a rever o artigo 33.º num momento em que já está estabelecida, desde 1996, uma Convenção da União Europeia que permite a extradição de nacionais! E, apesar de serem poucos os países que estão disponíveis para abdicarem dos seus princípios tradicionais (nacionais), parece que Portugal viabilizaria já, revendo a Constituição.
Impressiona-me, por exemplo, que um destes dias tenha de verificar que a responsabilidade das pessoas colectivas… - aliás, penso que o exemplo é sugestivo, é a pedra-de-toque da repressão da União Europeia às fraudes, desvio de fundos, etc. Isto é, em Itália entende-se que não há responsabilidade das pessoas colectivas porque a Constituição não o permite (e ponto!). E a Itália não se apressou a rever a Constituição para ser "agradável" à ideia repressiva que a União Europeia adoptou!
Penso, portanto (e aqui fala o cidadão), que a revisão constitucional terá, com certeza, as suas exigências próprias, mas não sei se deveremos fazer uma revisão constitucional para nos afeiçoarmos ao estado actual da política repressiva da União Europeia ,porque, aí sim, corre-se o risco de fragilizar a Constituição.
A União Europeia ainda não se entendeu quanto a um conceito-matriz, o de espaço judiciário europeu. Logo, os próximos anos significarão uma alteração profunda dos conceitos da União Europeia em matéria de política repressiva. Será que vamos rever a Constituição todos os anos ou de três em três anos para afeiçoá-la aos novos institutos emergentes dessa cooperação? Ou será que, como temos uma tradição secular nesta matéria (tal como o