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O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, penso que a intervenção do Sr. Deputado Luís Marques Guedes não arredou as preocupações interpretativas, há pouco expressas, relativamente à delimitação conceptual dos ditos cargos com natureza executiva e, portanto, desse ponto de vista, creio que o problema subsiste.
Por outro lado, há um aspecto novo relativamente ao qual gostaria de saber o ponto de vista do Sr. Deputado Luís Marques Guedes. A fórmula constante da proposta do PSD é no sentido de dar uma credencial ao legislador para, por via de lei ordinária, estabelecer restrições à renovação sucessiva de mandatos. Ora, isto coloca um problema muitíssimo delicado.
Estamos a falar de restrição ao exercício de direitos de participação política, de estabelecer a Constituição uma credencial ao legislador ordinário para que, por uma lei sem qualquer valor reforçado, designadamente sem as exigências conferidas às leis orgânicas - e nem isso bastaria, porventura -, possa vir a decretar restrição fundamental de direitos.
Pergunto se o PSD ponderou este aspecto na fórmula que nos apresenta, porque amanhã uma qualquer maioria conjuntural, em função de um qualquer circunstancionalismo político, encontrará a mais simples forma de limitar os seus próprios adversários, talvez com uma inserção no tecido social, designadamente na representação autárquica, estabelecendo por uma lei ordinária simples uma regra restritiva de consequências eventualmente avassaladoras.
Como os Srs. Deputados do PSD falavam dos riscos populistas, creio que a Constituição não pode cair na tentação de criar soluções utilizáveis justamente numa qualquer esquina, por um qualquer risco populista. Penso que estamos confrontados com um problema sério.
Depois, há a questão de fundo. Eu disse que não queria ainda abordar a questão de fundo, no entanto, gostaria de suscitar a circunstância de estas propostas relevarem de um pessimismo: o de que a sociedade aberta e pluralista e a alternância democrática não funcionam suficientemente bem para garantir o princípio republicano da renovação dos mandatos. É essa reflexão, que releva de um atitude pessimista, que tem de ser melhor clarificada entre nós, para saber se estamos a procurar resolver certos problemas pela porta certa ou se, eventualmente, não entraremos pela porta errada para solucionar alguns problemas que não estamos a resolver em sede própria.
Por exemplo, será que a questão da renovação dos mandatos dos altos cargos públicos se resolve melhor através de uma regra cega de proibição da renovação de mandatos ou através das regras de isenção e independência dos altos cargos públicos da Administração face aos poderes políticos circunstanciais? Ou seja, não estaremos a procurar resolver um problema pela "porta das traseiras", não enfrentando a questão real, que é a da excessiva dependência da influência partidária da nossa Administração Pública, com todas as sequelas e consequências negativas que isso tem para o princípio da independência da função administrativa? Este é um problema que tenho e que, certamente, alguns dos Srs. Deputados do PSD também são capazes de compartilhar comigo.
Por outro lado, ao nível das autarquias locais, infelizmente falhámos a tentativa de reforma do sistema eleitoral. Porventura, nenhum dos sistemas inicialmente apresentados era bom quanto ao conjunto das fórmulas propostas e todos careceriam de profundas exigências de revisão, mas interrogo-me sobre se não é por via da alteração do sistema eleitoral para as autarquias que criaremos regras muito mais autênticas de forma a garantir mecanismos de controlo, de responsabilidade que facilitem o princípio da alternância democrática.
Penso que tudo isto deve ser ponderado antes de nos precipitarmos numa decisão, mas estou a enunciar dúvidas que gostaria de ver comentadas por vós.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Deputado, posso interrompê-lo?

O Sr. Jorge Lacão (PS)r: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Compreendo as palavras bem intencionadas do Sr. Deputado Jorge Lacão, mas quero recordar que o PS, ainda muito recentemente, apresentou no Parlamento uma iniciativa que, no que diz respeito às autarquias locais, tinha como arquitectura de solução proposta o seguinte: a câmara municipal podia "cair" por força do voto da assembleia municipal, quem nunca "caía" era o presidente da câmara.
Isso, associado ao percurso que fizemos, ao longo destes 25 anos, de acentuar os poderes presidencialistas do presidente da câmara - e aí o PSD tem também responsabilidades, que não quero de forma alguma escamotear -, faz com que nessa circunstância concreta estejamos perante uma situação que nada tem que ver, por exemplo, com o caso do Primeiro-Ministro ou de um presidente de um governo regional. Quanto a este, nos termos do artigo 133.º, há sempre a possibilidade de o Presidente da República demitir o Governo e exonerar o Primeiro-Ministro ou dissolver os órgãos próprios da assembleia regional.
Portanto, no caso concreto da presidente da câmara, até por tentativa do PS, essa situação é única.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Miguel Macedo, muito obrigado pela questão que me colocou no quadro das minhas perguntas ao PSD, que ajuda a que faça sentido um diálogo entre nós para procurar clarificar pontos de vista.
Ainda bem que colocou essa questão, porque ela ajuda a compreender duas coisas. Não foi por acaso que nas minhas palavras de há pouco disse que nenhum dos projectos estava perfeito na sua versão original e que mereciam ser profundamente repensados.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Mas o vosso era o mais imperfeito!

O Sr. Jorge Lacão (PS): - O do PSD parecia-me muito insustentável, mas no caso do projecto do PS, obviamente, a exigência dos 2/3 para a operacionalização da moção de censura matava a lógica da alternância e da responsabilidade.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - É verdade!