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justificar "porquê estes crimes e não os outros?". O flagrante delito corresponde a uma situação objectiva que mais facilmente seria generalizado a um determinado tipo de crimes graves e não circunscrito a uma criminalidade muito localizada.
Por outro lado, no caso do flagrante delito, parece-me que há uma situação insustentável para um Estado de direito, como, por exemplo, aquela que lhe relatei há pouco, do espectáculo degradante de um crime, com a gravidade do do tráfico de droga, poder passar em directo nas televisões, perante a total inoperância, por impotência, das autoridades. Gostava também de ouvir o Sr. Procurador-Geral da República sobre esta questão.

O Sr. Presidente: - Sr. Procurador-Geral da República, talvez fosse melhor fazermos uma ronda de perguntas e, no fim, V. Ex.ª responderia a todos, porque, sem prejuízo, naturalmente, do direito de usar da palavra de todos os Srs. Deputados, se seguirmos este ritmo, as intervenções dos Srs. Deputados são mais longas do que as suas.
Como também estou inscrito, porque também tenho esse direito, vou colocar a V. Ex.ª duas questões.
V. Ex.ª não é um constitucionalista e não vem aqui nessa qualidade, mas tem uma experiência nas suas antigas funções, se me é legítimo chamá-las à colação, de participação na construção do espaço de liberdade, de segurança e de justiça da União Europeia, sobretudo no que diz respeito, naturalmente, a matérias de processo penal e às consequências da construção desse espaço no processo penal, deixando de lado matérias, que também são importantes, se não mesmo mais importantes, como a emigração, o asilo político, tudo aquilo que diz respeito à abertura de fronteiras, etc. Não lhe ponho a questão como constitucionalista porque, salvo o devido respeito, V. Ex.ª não está aqui nessa qualidade.
O que lhe pergunto é se V. Ex.ª julga que é importante - e como fazê-lo é uma questão sobre a qual teremos ocasião, certamente, de ouvir constitucionalistas que aqui virão também prestar o seu depoimento - que a Constituição Portuguesa contenha uma certificação para Portugal poder acompanhar os esforços de construção desse espaço, designadamente em matéria de extradição e em matéria de investigação criminal. Não nos podemos esquecer que está, possivelmente, em marcha acelerada a construção de uma procuradoria europeia, agora mais acelerada do que há tempos atrás.
Em conclusão: julga ou não importante que haja na Constituição e na lei portuguesa, mas sobretudo na Constituição, essa certificação, essa "autorização", para que Portugal possa, sem limitações que podem decorrer actualmente do quadro constitucional, participar nessa construção? Por exemplo, a extradição, como V. Ex.ª sabe, está a sofrer um processo de evolução para sistemas de entrega e situações desse tipo. Esta a minha primeira questão.
A segunda questão que quero colocar ao Sr. Procurador-Geral da República é a seguinte: o Sr. Procurador-Geral mostrou - como acontece com todos nós, certamente - um enorme respeito pelo domicílio das pessoas e pela protecção da sua vida privada. Mas até onde vai a noção de "domicílio"? Tive também alguma experiência nessa matéria e ouvi muito as queixas da polícia e até, também, de Procuradores da República no que respeita às limitações de entrada no domicílio, que V. Ex.ª aqui defendeu, à inviolabilidade do domicílio.
Ora, sabemos que, hoje, o quadro social em que nos movemos é muito diferente do que era há 20 ou 30 anos, para não ir mais longe, mas todos também sabemos que, debaixo da capa do domicílio, não poucas vezes está um armazém de crime ou um centro de criminalidade organizada. É assim, é a realidade! E suponho que o Sr. Procurador-Geral da República a conhece melhor do que eu ou, pelo menos, tão bem.
Põe-se, portanto, a questão de saber se ainda devemos trazer à colação uma noção antiga, que continua, naturalmente, a ser válida para a generalidade dos casos, mas que pode não ser válida para muitos, do domicílio como centro da intimidade, quando ele passou a ser o centro da criminalidade.
Então, esse domicílio, que de domicílio só tem o facto de se situar, eventualmente, numa zona que pode também servir para domicílio, terá de ter a mesma protecção do domicílio na concepção desse espaço de intimidade da vida pessoal? E se não tem, que consequências tirar, quando chegarmos à conclusão, ou melhor, quando as autoridades judiciais e a polícia chegarem à conclusão de que o que se trata não é de domicílio mas, sim, de centro de actividade criminosa? E que consequências tirar desta nova realidade, nova pela sua extensão, obviamente, não pela sua existência, porque ela existe, certamente, há séculos - é até existem casos históricos de que o criminoso tem um segundo domicílio, que é o seu centro de actividade criminosa. Só que hoje essa situação é uma situação que abunda e que nocet ou faz prejuízo. Era esta questão que queria colocar também ao Sr. Procurador-Geral da República.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Obrigado, Sr. Presidente.
Quero começar por saudar a presença do Sr. Procurador-Geral da República e aproveitar a oportunidade para colocar as questões sob forma considerativa, mas procurando ser célere, como o Sr. Presidente nos recomenda.
Em primeiro lugar, quero sublinhar que uma das observações que o Sr. Procurador-Geral da República fez, de alguma maneira, vai no sentido de uma que já tive ocasião de formular nesta Comissão, quanto à questão de inserir ou não, com relevância constitucional, a condição da complementaridade do Estatuto do TPI e da sua aplicação, em face da jurisdição nacional.
O Sr. Procurador referiu a circunstância de essa complementaridade derivar, de modo evidente e expresso, do Estatuto do próprio TPI e de, eventualmente, a sua consagração em sede constitucional acabar por significar não que o Estado português mantém a prerrogativa de fazer, digamos, a aplicação da sua justiça em primeira instância e, portanto, justamente, ao abrigo dessa relação de complementaridade com o TPI, mas que esse princípio da complementaridade se transforma num princípio vinculativo para o próprio Estado português, se tiver sede constitucional. E, consequentemente, aquilo que seria uma faculdade na relação entre a ordem jurídica interna e a ordem jurídica do Estatuto do TPI pode transformar-se numa aplicação vinculada. Suponho que é exactamente isso que pretendem os autores desta norma, mas é, porventura, nisso, que reside alguma divergência de posição.
Compreende-se que, em sede de declaração política, eventualmente em declaração complementar, no momento da ratificação, se assim se entender, alguma coisa possa ser dita sobre a disposição do Estado português nesta