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urgência simultânea, a "nacionalização" dos crimes consagrados no Estatuto de Roma?
Lá voltamos nós à nossa questão: se no artigo 15.º suscitamos o globalismo, no artigo 7.º, ou no artigo 298.º-A - não interessa aqui a inserção sistemática - suscitamos o localismo. Perante o seu ponto de chegada, queria que nos ajudasse, se fosse possível, nesta reflexão de concretização normativa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria de saudar a presença do Sr. Professor Doutor Adelino Maltez, que há muito tempo conheço e admiro, e de aproveitar a circunstância para procurar continuar esta reflexão, que diríamos, talvez não seja tão imediatamente útil à função mais mesquinha do legislador, mas que pode ser, naturalmente, estimulante para a reflexão que podemos ter o privilégio de fazer consigo.
Nesse sentido, vou colocar-lhe uma primeira questão, que é esta: do ponto de vista civilizacional, tem uma leitura actual do momento internacional pós-guerra fria, em que, aparentemente, a condução desse mundo internacional vai dando sinais contraditórios: de um lado há alguém que se arvora como "polícia do mundo", do outro lado há a tentativa de estruturar uma verdadeira comunidade internacional. A leitura que faz destes sinais contraditórios leva-o a ter uma perspectiva basicamente preocupada ou céptica relativamente à avaliação que faz dessa situação, ou mais confiante e mais optimista quanto aos sinais da possibilidade de configurar uma verdadeira relação internacional fundada nessa ideia dominante da justiça?
Uma segunda questão, de natureza diferente, prende-se com o artigo 15.º e os projectos de revisão constitucional em seu torno.
A possibilidade de construir uma comunidade lusófona identificada por uma igualdade de direitos políticos com base no princípio da reciprocidade, do seu ponto de vista, poderá significar mais uma continuação daquilo que há pouco invocou como a "revolução atlântica", com uma perspectiva de afirmação civilizacional de uma identidade lusófona, ou lusitana, se preferirmos, ou, pelo contrário, representa mais um sentido de abertura ecuménica a uma lógica multiculturalista, em nome de uma herança reconciliada da história portuguesa?

O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições, tem a palavra o Sr. Professor Dr. Adelino Maltez.

O Sr. Professor Doutor Adelino Maltez: - Sr. Presidente e Ilustres Deputados, alguns conhecem o meu pensamento, permitam-me que diga esta heresia: eu advogo, e até defendi isso na minha dissertação de doutoramento, no final dos anos 80, que não há, não pode haver, um Estado só sobre o mesmo território e as mesmas pessoas. Isto é uma ficção.
Nós caminhamos para um mundo que foi aquele que já tivemos, que é o político como uma pluralidade de pertenças. A única realidade política é o indivíduo, é a pessoa. E a pessoa participa em vários círculos políticos. Cada um de nós é, ao mesmo tempo, cidadão da República dos portugueses (eu também gostava de ser da minha pequena pátria-chica, mas votaram contra a regionalização; também gostava de ter o meu espaço de pequena província…), cidadão europeu, também deveria ser cidadão de uma comunidade lusófona e, ao mesmo tempo, cidadão daquilo a que João Pinto Ribeiro, em 1640, chamava "república maior", a república universal (aquilo de que falava Kant).
Os nossos constitucionalistas ainda não se puseram de acordo sobre a forma como vão conciliar estes diversos círculos. É facílimo! Na Idade Média isso já acontecia e Portugal foi independente neste contexto: cada uma das repúblicas maiores tinha apenas competência para aquelas atribuições que lhe são cometidas.
O Tribunal Penal Internacional é um Estado mundial para aqueles efeitos! E para aqueles belos efeitos que o nosso Professor Eduardo Correia e o bom idealismo dos primeiros tempos da democracia portuguesa consagraram com tipificações que já estão no nosso código penal internacional. O TPI não nos ensina nada! Em termos de crime de genocídio, de crimes contra a humanidade, o nosso direito interno já os consagrou nos primeiros códigos penais da democracia portuguesa. O que há é grandes confusões teóricas!
Respondo, ou tento responder, dizendo o seguinte: nesta fase da globalização, ditada pelo pensamento único de escolas de Ciência Política e de Teoria das Relações Internacionais anglo-saxónicas, nomeadamente americanas, que são 90% da produção científica mundial, infelizmente, há uma confusão entre estes belos ideais kantianos, do Rangel e do Neto Paiva, com a tradicional hegemonia. Essa ideia considera que todos os centros políticos particulares devem ceder perante um deles para um eventual governo mundial! Ora bem, estou contra essa ideia, por isso é que disse, há pouco, que desconfiei muito da Sovereignty International e de alguns ideólogos da globalização que obedecem a um modelo destes! Isto gera incompreensões, como aquela que todos VV. Ex.as conhecem da confusão entre unitarismo e federalismo.
No discurso actual sobre a Europa, os mais federalistas de nome são os mais unitaristas. Eu, que sou claramente, sem medo, federalista, revolto-me contra o discurso federal do pensamento único europeu! Os que mais falam em federalismo acabam por ser tão ou mais centralistas que os unitaristas, ao advogarem, por exemplo, o imediatismo de um novo contrato, ou ao invocaram o federalismo funcionalista e gradualista que prevê, sem dor, a eliminação das autonomias anteriores! Nunca o Proudhon disse isto! Nunca o Kant disse isto!
A república universal não é um governo mundial, é a forma de os pequenos Estados poderem ter uma norma de direito que os ponha em pé de igualdade com os grandes Estados! Isto é que é a res publica universal; isto é que é a civitas humana; isto é que é o belo princípio do Wilson; isto é que é o falhado Pacto Briand-Kellog, dos finais do anos 20! E nós estamos a recuperar esta velha tradição.
Não sei se fui muito abstracto, mas quase dou uma resposta ao Professor Fernando Seara.
É evidente que eu concebo que o direito é igual à política. O Estado de direito é tão normativo quanto a democracia. Não há democracia em nenhum lado, nunca houve, nem na utopia, nem num paraíso terrestre!
Na educação da minha geração andámos todos à procura da democracia num sítio exótico, mas já chegámos à conclusão que nenhum outro país é mais democrático do que Portugal, porque também aqui não há democracia, e não há democracia como não há justiça. Mas ai de nós se não tivéssemos a exigência da democracia e da justiça para conformar todos os dias os actos do homem, uma