DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS 1045
lhães Aguiar = Antonio Gonçalves da Silva e Cunha = Antonio Augusto da Costa Simões = Raymundo Venancio Rodrigues - Antonio Cabral de Sá Nogueira, com declaração = Manuel Joaquim Penha Fortuna.
Discurso do sr. deputado Joaquim Thomás Lobo d'Avila, pronunciado na sessão de 3 de agosto, e que deixou de ser publicado no logar competente.
O sr. J. T. Lobo d'Avila: - Tendo pedido a palavra para um requerimento, não quero abusar d'ella; e tambem não desejo tratar n'este momento a questão política, por isso que, tendo a palavra pendente sobre o assumpto que devia occupar a primeira parte da ordem do dia, que foi interrompida por motivos conhecidos de toda a camara, me reservo para tratar d'essa questão n'outra occasião, quando continuar o meu discurso; agora limito me a tratar do meu requerimento, que se refere a uma solução do incidente que se debate.
Diz-se que = não devemos perder o tempo, e devemos deixar o governo apresentar projectos = Eu entendo que a primeira necessidade que tem o paiz é ter governo (apoiados); e o systema parlamentar serve para se apurar se temos ou não governo, e se elle satisfaz ás indicações publicas, ás aspirações do paiz, e ás necessidades da situação (apoiados). Portanto entendo que a questão política é da mais alta importância, a fim de se conhecer se temos um governo que corresponda ás necessidades do paiz (apoiados).
Para que nos havemos de embalar com as esperanças nos projectos que nos hão de apresentar os Srs. ministros? Se nós soubermos de antemão, pelas suas declarações, que elles nunca hão de apresentar esses projectos, e que se ha de preterir de novo a solução do problema que nos afflige, para que havemos de estar com esta nova espera a aggravar cada vez mais as circunstancias do paiz, principalmente quando se diz que não ha dinheiro, que ha um perigo publico, e que ha até a ameaça de uma bancarrota!!
Emquanto para os seus fins políticos, para a sua conservação no poder, lhe pareceu que convinha conservar no ministério o sr. conde de Samodães, allegava se que a sua saida podia acarretar serias dificuldades, podia difficultar a realisação do emprestimo por elle contratado, podia deixar o thesouro sem meios de pagar as letras que representam a divida fluctuante externa, e que se vencem em prasos proximos e fataes; depois que por um calculo egoísta e contrario aos princípios da responsabilidade ministerial, que é solidaria, entenderam que deviam fazer demittir o sr. conde de Samodães, desappareceram immediatamente todos aquelles receios e escrupulos, e alijaram ardilosamente o seu collega, sem lhe importar mais com aquallas considerações! Logo este procedimento do governo não foi filho de rasões de conveniencia publica, mas de calculos políticos.
As nossas circumstancias aggravaram-se com a permanencia do sr. conde de Samodães no governo; e se não fosse esta especulação política teríamos evitado ao paiz os encargos enormes que resultaram de uma gerencia financeira inhabil e infeliz.
Agora repetem se as scenas. Sobem ao poder dois ministros que nasceram d'estas intrigas políticas, moços inexperientes, e que não inspiram confiança, e diz-se que é necessario esperar pelos seus actos, esquecendo que a questão financeira exige uma resolução immediata, e que estão imminentes os mesmos perigos com que nos ameaçam ainda aggravado pelo tempo decorrida!
Sacrificam as conveniencias publicas ao calculo mesquinho de se conservarem mais alguns dias no poder, capitulando com as ambições de alguns membros da commissão de fazenda, a quem pelas suas vociferações tinham desauctorisado! (Apoiados.)
O que devemos examinar e se temos rasão para esperar esses actos de que nos fallam, porque se tal rasão não existe, a primeira necessidade é deitar abaixo este governo, e organisar um que dê fundadas esperanças de que ha de tomar as providencias que as circumstancias requerem e o paiz reclama (apoiados). Esta é a primeira necessidade.
Portanto não se diga que se está perdendo o tempo com esta discussão, e que se devem esperar os actos dos novos ministros (apoiados).
Os actos dos membros do governo que ficaram, porque este governo, segundo a phrase do nobre ministro das obras publicas, não foi demittido completamente (riso), já nós os sabemos, já o paiz os sabe: nada ha a esperar d'elles para a salvação publica (apoiados).
Trouxeram-nos á critica posição em que nos achâmos. Depois de vexarem os funccionarios publicos e os contribuintes, vemos o deficit no mesmo estado, o nosso credito abatido, e os fundos descendo sempre!
Dos novos só sabemos os tristes precedentes da sua entrada no governo, e que pelas suas declarações nada nos promettem de positivo e definido, pois não apresentam plano algum, apesar do sr. presidente do conselho os apresentar como os mais competentes para resolver immediatamente a nossa questão de fazenda (apoiados).
O primeiro facto que se nos apresenta é uma irregularidade da parte do sr. ministro da fazenda, e que não nos deixa esperar factos mais auspiciosos para o paiz (apoiados).
E este incidente e esta perda de tempo é originada pela irregularidade com que o governo procedeu na apresentação de uma proposta de lei.
Se o sr. ministro tivesse feito como fazem todos os ministros, d'estes que não são predestinados para a salvação publica, que não trazem o elixir na algibeira, d´estes ministros communs, da classe dos mortaes, que costumam apresentar as suas propostas depois de as lerem e de as meditarem, sem se forrarem ao trabalho de as datarem e assignarem, como e do seu dever; se s. ex.ª, tivesse procedido assim, ter-se ia evitado esta discussão (apoiados)
Estes ministros predestinados esquecem-se porém de todas estas circunstancias (riso), e por causa d´este esquecimento, que denota uma certa leviandade, é que nós temos este incidente, que tem occupado a attenção da camara, porque ella não podia, sem faltar ao seu dever, deixar passar sem correctivo esta irregularidade.
Pois a camara podia aceitar o facto de um ministro apresentar uma proposta sem ser firmada com a sua assignatura? A camara podia deixar passar sem correctivo uma transgressão d'esta ordem? Uma proposta assignada por um cavalheiro que já não era ministro, e não assignada por aquelle que devia ter a responsabilidade d'ella, e com uma data anterior á sua entrada no governo? Não era possível.
S. ex.ª, disse que tomava a responsabilidade da proposta que apresentava, mas disse isto depois de se ter requerido que fosse lida na mesa, e de apparecer ali assignada pelo sr. conde do Samodães...
O sr. Luiz de Campos: - E o requerimento?
O Orador: - Ora, o illustre deputado que ainda ha pouco elevou á altura de questão vital para o paiz uma questão de transferencia de um empregado subalterno de obras publicas, e até invocou a auctoridade do seu bispo diocesano, devia ser menos exigente e menos rigoroso (apoiados).
O sr. Luiz de Campos: - Não infringi o regulamento.
O Orador: - Infringiu, trazendo o sagrado para o profano (riso).
O nobre deputado devia ser menos rigoroso e deixar isso ao sr. presidente, que já o não é pouco (riso). Temos conhecimento d´este seu rigor, temperado por um certo pensamento político, que elle sabe habilmente combinar com a imparcialidade que o caracterisa (riso). Não queira o sr. deputado ser mais rigoroso do que o sr. presidente, que o sabe ser.