DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 269
Voltando, porem, ao assumpto, limito-me a pedir licença para ler uma disposição dá companhia de agricultura do Alto Douro, disposição que está perfeitamente em harmonia com a doutrina de incompatibilidades por que tenho aqui pugnado constantemente.
Essa disposição, que encontrei no Diario do governo, diz o seguinte.
(Leu.)
"Artigo 47.° Os cargos da direcção e da mesa da assembléa geral são entre si incompativeis.
"Artigo 48.° Não podem ser simultaneamente membros da direcção e do conselho fiscal individuos que tenham entre si sociedade ou parentesco até ao quarto grau.
"Artigo 49.° Não se dá incompatibilidade entre os membros effectivos e substitutos de um mesmo corpo, mas o substituto que for parente ou socio do vogal effectivo só póde ser chamado ao serviço na falta ou impedimento do mesmo vogal.
"Artigo 50.° Não podem ser eleitos membros da direcção nem do conselho fiscal os accionistas que negociarem nos mesmos generos em que negoceia a companhia."
"Artigo 51.° Não podem igualmente ser eleitos membros da direcção nem do conselho fiscal:
"1.° Os devedores á companhia;
"2.° Os fiadores dos seus devedores ou dos seus empregados;
"3.° Os que com ella tiverem contratos;
"4.° Os que com ella tiverem pleitos.
"Artigo 52.° No caso de incompatibilidade, a eleição para a direcção prefere a todos os. outros cargos, e a eleição para o conselho fiscal prevalece sobre a eleição para a mesa da assembléa geral. Se a incompatibilidade se der entre pessoas do mesmo corpo, eleitas no mesmo acto, prefere a mais votada, e sendo igual o numero de votos proceder-se-ha como no caso de empate, (artigo 43.° § unico).
Eis aqui a sancção desses principio por uma companhia importante que sabe zelar os seus interesses.
E estes factos são a approvação mais formal das minhas idéas, que converti em preceitos na proposta de lei sobre incompatibilidades que aqui apresentei ha tantos annos!
Nada mais direi, e concluirei repetindo o que disse ao tomar a palavra, que v. exa. teve a bondade de me conceder nesta occasião, e vem a ser: que não voto o projecto em discussão, nem votarei reforma alguma d'esta camara, ou do parlamento em geral, sem que se haja votado a lei sobre incompatibilidades, porque sem isto póde resultar o demorar-se o effeito que hão de ter os principios verdadeiros, segundo os quaes não devem os interessados nos objectos ser os proprios que decidam d'elles. A lei de suspeições para os magistrados mostra essa verdade, e portanto que é indispensavel que haja uma lei de incompatibilidades, porque assim como os juizes, quando se acham em determinadas circumstancias, não podem julgar de certas causas, assim tambem as pessoas que estão ligadas a certos interesses não devem fazer parte de assembléas, onde se tem que julgar esses interesses, ou, para melhor dizer, os do paiz, aos quaes muitas vezes aquelles outros podem ser oppostos. Sem a lei do incompatibilidades não ha, pois, independencia possivel no parlamento.
O sr. Conde de Rio Maior: - Entendo que a discussão que se vae encetar deve recair sobre os differentes artigos com as alterações apresentadas pela illustre commissão. E esta, ao que me parece, a praxe que se tem sempre seguido n'esta casa. Desde o momento que se discutissem apenas as alterações que propõe a commissão, ficavam os membros d'esta camara inihibidos de apresentar as considerações que tivessem por conveniente produzir sobre quaesquer artigos do projecto, com os quaes não possam concordar.
O sr. Presidente: - Perdôe o digno par, mas era exactamente a minha intenção propor á discussão todos os artigos do projecto, o era isso o que me competia fazer visto a materia estar só votada na generalidade.
O equivoco que possa ter havido sobre a maneira por que eu desejo submetter á discussão o projecto e as alterações propostas provem de não ter eu podido fazer-me comprehender pelos dignos pares.
O que a camara tem a fazer, repito, é discutir cada um dos artigos do projecto com as alterações que foram propostas, algumas das quaes foram adoptadas pela commissão. (Apoiados.)
Assim nenhum digno par fica inhibido de apreciar as differentes disposições do projecto com as alterações que a commissão propõe, nem tão pouco de propor qualquer modificação a essas disposições.
A minha intenção é declarar com relação a cada artigo quaes foram as propostas mandadas para a mesa, e aquellas que foram approvadas pela commissão, para que os dignos pares fiquem habilitados a discutir o assumpto com toda a largueza e clareza.
A folha que acompanha o projecto facilita o conhecimento das propostas, que foram mandadas para a mesa por diferentes membros da camara com relação ao projecto de que a camara vae occupar-se.
Vamos, pois, entrar na discussão da especialidade do projecto de reforma d'esta camara.
O texto para a discussão é o parecer n.° 284.
Os artigos 1.°, 2.° e 3.° do projecto da commissão são disposições da carta constitucional, e por isso não estão sujeitos á deliberação da camara, porque não tem faculdade para os rejeitar ou modificar.
O digno par, o sr. conde de Rio Maior, propoz a eliminação d'esses artigos, que, torno a repetir, são artigos da carta.
Eu entendo que a commissão só incluiu estes artigos no projecto com o fim de apresentar um trabalho completo, e nunca na idéa de pôr em duvida a sua doutrina ou de a sujeitar á discussão da camara. (Apoiados.)
Creio que fui esta a idéa da commissão?
O sr. Barros e Sá: - A commissão está completamente de accordo com o que v. exa. acabou de dizer. Ella só quiz apresentar um trabalho completo e facilitar assim a discussão.
O sr. Presidente: - É exactamente o que eu acabei de dizer á camara.
O sr. Visconde de Seabra: - Peço a palavra.
O sr. Presidente: - A substituição que v. exa. mandou para a mesa diz respeito ao artigo 4.°, e agora está se tratando dos artigos 1;°, 2.° e 3.°
O sr. Visconde de Seabra: - A minha substituição recáe sobre o artigo 4.° e seus paragraphos, e então peço a palavra para a sustentar quando se tratar do artigo respectivo.
O sr. Presidente: - Darei a palavra a v. exa. quando se tratar de discutir o artigo 4.°, que é por onde devemos começar, pois me parece que a camara concorda em que não temos de discutir nem de votar os tres primeiros artigos.
O sr. Conde de Rio Maior: - Peço a palavra.
O sr. Presidente: - Tem v. exa. a palavra.
O sr. Conde de Rio Maior: - Eu propuz a eliminação dos tres primeiros artigos porque estão consignados na carta, e não ha vantagem nenhuma em votar o que já se acha estabelecido no codigo fundamental.
Não se trata de crear, de fundar o pariato, porque ha principios essenciaes, quanto á instituição d'esta camara, que não é preciso serem novamente auctorisados com o nosso voto, e julgo estarmos todos concordes n'esta parte.
Esta questão já se tratou em 1845, e então se discutiu, se os artigos da constituição deviam ser repetidos numa lei organica do pariato, por consequencia não me parece que possa ser considerada uma excentricidade a minha insistencia n'este ponto.