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10 Diário da Câmara dos Deputados

Ditada, sem dúvida, na melhor das intenções e no desejo sincero que o Govêrno tem de servir o regime e acautelá-lo contra futuras perturbações, a proposta ministerial, nos termos em que se encontra, não pode, porém, ser votada pelo Parlamento.

Pela minha parto declaro desde já, com todo o desassombro, que a rejeito porque ela me repugna à minha consciência de homem e á minha consciência de Deputado.

Sancioná-la com o meu voto equivaleria, Sr. Presidente, a abdicar por completo. da minha liberdade de pensar, da minha liberdade de sentir.

Sei bem quanto se tem abusado das autorizações concedidas aos Governos em muitas e variadíssimas circunstâncias.

O mal não é de agora; o mal vem já de há muito.

Já nos tempos da monarquia pediam-se ao Parlamento autorizações largas que êle concedia e das quais muito só usava o... abusava.

O Legislativo delegava a cada passo no Executivo as suas mais nobres e alevantadas atribuições, o daí resultou muitas vezes transformar-se o Executivo em órgão principal da função legislativa.

Pretende agora ressuscitar-se o mesmo condenável processo. Não pode ser. Esta Câmara, a meu ver, e salvo o muito respeito que tenho pelos seus membros, não tem o direito de o consentir.

Não tenho a pretensão de convencer ninguém. Se sou chamado a falar sôbre êste assunto, é porque tenho sôbre êle convicções assentes e definidas; e como não sou um homem de partido, mas um homem de dever, não posso nem quero deixar-me afogar por quaisquer ondas de ódio ou de vinganças que neste momento surjam diante de nós para nos intimidar ou acobardar...

Entendo que é um dever discutir e combater a proposta, nos termos em que ela foi apresentada. Eis a razão porque pedi a palavra.

Sr. Presidente: foi em 1908. Toda a gente se lembra do que foi a ditadura feroz que o Govêrno de então inaugurara no país. A atmosfera que se respirava era de opressão e terror.

Em, Janeiro dêsse ano foi promulgado um decreto ditatorial, que assombrou, todo o país e lançou o pânico em todas as consciências!

O Partido Republicano dizia então que êsse violentíssimo decreto era como que a corda, com que o queriam enforcar!

Os Deputados republicanos que mais tarde o atacaram nesta casa consideravam-no como sendo um monumento de ignomínia!

Em que se cifrava, porem, êsse decreto? Cifrava-se em última análise em concentrar nas mãos do Govêrno o direito de dispor dos destinos dalguns cidadãos portugueses, implicados em movimentos revolucionários, desde que fôssem indiciados por um tribunal criado ad hoc.

Toda a gente se revoltou contra tam monstruoso arbítrio!

Toda a gente dizia que a sua consagração era um crime!

Daquele lado da Câmara ouvi eu um dos mais insignes Deputados republicanos verberar com frases repassadas de dor e indignação tam espantoso diploma!

Era o que se dizia então.

Pois bem: comparado com esta proposta de lei é êle duma grande generosidade

Naquele era necessária, a pronúncia ou indiciação dos acusados ou suspeitos por um tribunal, para que o Govêrno pudesse agir contra êles.

Aqui dispensa-se por completo esta instrução do processo, deixando-se ao Govêrno a faculdade de, por seu livre arbítrio, sem dependência de quaisquer formalidades, eliminar do quadro do funcionalismo público, civil ou militar, quem muito bem lhe pareça!

Sr. Presidente: eu não sei falar a linguagem do ódio em caso algum e penso até que só há lugar onde ela não deva ser permitida, onde destoa por completo, é aqui no Parlamento...

Reservem-na para a imprensa, para as assembleas partidárias, para os comícios.

Aqui, repito, não deve ela penetrar!

E por isso, Sr. Presidente, que chamado a discutir êste projecto na generalidade - e não desistindo de o discutir na especialidade - venho desde já expor serenamente e muito sumariamente as razões pelas quais entendo que êle não deve ser aprovado nos termos em que se encontra. Diz o artigo 1.°:

Leu.