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56 Diário da Câmara dos Deputados

A função normal própria do Parlamento é fiscalizar.

Desde que estou no Parlamento todas as questões tributárias têm sido discutidas de afogadilho. Têm sido votadas urgências a altas horas da noite, parece que propositadamente para fazer crer que esta função primordial de fiscalizar é inteiramente inútil.

Sr. Presidente: lavrado assim o meu protesto, e declarando ao País que não voto uma proposta desta natureza, não porque concorde ou deixe de concordar, mas porque não nos foi concedido tempo para saber se isto que se nos pede é bom, mau ou péssimo, eu farei apenas as ligeiríssimas considerações que me foram sugeridas pela leitura rápida desta proposta, repetindo que elas não são o fruto dum estudo, que não fiz por não ter tempo de o fazer.

Basta aquilo que vou dizer para mostrar que as iniqüidades saltam inteiramente à vista pela simples leitura da proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Ministro das Finanças=

Até 1918 entendia-se, em matéria de contribuição de registo, que os contribuintes que possuíssem bens cujo valor não excedesse 50$ estavam isentos dessa contribuição, entendendo-se muito naturalmente que não devam sujeitar-se a ela pessoas cujos haveres mal chegavam para a sua subsistência.

Na proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Ministro das Finanças acabou-se com essa isenção.

Porquê?

Afirma-se catedràticamente que não há hoje propriedades que valham somente 50$.

De facto é verdade. O valor de 50$ desapareceu; mas aquela propriedade que hoje vale 500$ tem actualmente o mesmo-valor que tinha em 1918, quando valia apenas 50$.

As circunstâncias do contribuinte não melhoraram pelo facto de o Estado, pelos seus processos de administração, desvalorizando a moeda, ter dado lugar a que hoje se atribua um valor nominalmente alto àquilo que não ultrapassa o seu valor efectivo em 1918.

Assim, por exemplo, um pobre aldeão que tinha exclusivamente o buraco da sua casa a que era atribuído o valor de 50$,

pelo facto de hoje a desvalorização da moeda atribuir a essa mesma choupana o valor de 500$, não passa a ser mais rico nem tem mais haveres ou rendimentos.

O que é isto senão uma iniqüidade cometida contra os pequenos proprietários, que o Estado não se cansa de dizer que pretende proteger?

Se o Sr. Ministro das Finanças, antes de mandar a sua proposta para a Mesa, mandasse fazer um inquérito pelo menos em duas ou três. províncias de Portugal, S. Exa. encontraria que eram atingidos pela sua proposta centenas de aldeãos que têm apenas o buraco da sua casa e que vivem à custa do trabalho da sua enxada, moirejando de sol a sol.

Sr. Presidente: a iniqüidade dêste processo salta inteiramente aos olhos.

Tenho notado desde que estou nesta Câmara que êste regime que se diz democrático, que se ufana de o ser, e a maioria que tem o nome de Partido Democrático, é o primeiro a abolir as isenções a favor dos pobres e dos pequenos.

Em nome deles, eu protesto, e entendo que todo o País deve ser o primeiro a não deixar que se cometam iniqüidades como esta.

Em nome deles, eu protesto e afirmo que seria justíssima a cólera, e que será justíssimo um movimento de indignação e revolta com que o País inteiro há-de receber está iniqüidade.

O Sr. Sá Pereira: — Não apoiado.

O Orador: — Diz V. Exa. não apoiado, mas V. Exa. não percebe nada dêste assunto.

O Sr. Sá Pereira: — Não julgo a ninguém com o direito de viver à custa do que herda, sem querer trabalhar.

Àpartes.

Para a Câmara, ver a razão com que discute, basta notar-lhe que o Sr. Sá Pereira acaba de dizer que não julga a ninguém com o direito de viver com o que lhe, deixem os seus pais.

E esta a doutrina que sustenta a Câmara, porque não julga de direito que alguém trabalhe a vida inteira para deixar aos seus filhos ou a quem entenda.

Àpartes.