7 DE JUNHO DE 1956 901
tintamente nos ciclos de produção dos vários complexos económicos, prestando serviços em todas as fases do ciclo agrícola, industrial e comercial. Acompanham, pois, os escalões, sucessivos da produção, coadjuvando-os eficazmente numa intervenção a latere, que lhes atribui um cunho muito pronunciado de verdadeiros colaboradores do ciclo produtivo, seja qual for a actividade que se considere.
E, porque assim é, a generalidade dos autores, no campo do corporativismo, não põe em dúvida a conveniência de uma corporação para o ramo dos transportes, ou considerada isoladamente, ou conjugada com o turismo, por este constituir um sector que lhe está directamente vinculado:
E passemos de seguida à Corporação do Crédito.
A esta actividade económica - o crédito - podem aplicar-se de modo geral todas as considerações produzidas a respeito dos transportes.
Na verdade, também aqui se descortinam certas relações de instrumentalidade entre as empresas bancárias, muito embora prevaleçam notòriamente as interdependências complementares.
Isto quanto ao sistema bancário português, que não se apresenta largamente especializado, como acontece em tantos outros países, onde os laços de verticalidade, a relacionar as empresas que constituem a banca, se assinalam nitidamente, estabelecendo-se um curioso «ciclo de produção-crédito», que vai de umas para outras até ao banco central.
Tal acontece, por exemplo, nos Estados Unidos da América do Norte e em alguns outros países, cujo sistema bancário acusa uma especialização digna de registo. Mas entre nós, não sendo tão flagrantes os vínculos de instrumentalidade, é fácil surpreendê-los quanto a determinadas categorias de estabelecimentos bancários para com outras e de todas para com o nosso banco central.
É o caso dos depósitos de bancos e banqueiros no Banco de Portugal, e bem assim o da operação de redesconto também ali efectuada, apesar de não revestir um carácter de generalidade e frequência, que muito favoreceria a concessão do crédito. Para tal inconveniente, oriundo de tradições da nossa banca, que haveria toda a vantagem em alterar, já o parecer da Câmara sobre a última Lei de Meios incisivamente chamou a atenção, fazendo ressaltar os benefícios que resultariam para o nosso sistema de crédito duma atitude diferente da banca portuguesa para com o redesconto.
Por outro lado, também o crédito fornece serviços a todas as actividades ou indivíduos em geral, quer se situem nos domínios do comércio, da indústria ou da agricultura, participando assim, com uma colaboração a latere, nos ciclos produtivos de todos os complexos económicos de tipo agrícola, industrial ou comercial.
O crédito acompanha, desta maneira, os estádios sucessivos da produção, seja qual for o ciclo considerado, apresentando-se, pois, como seu valioso colaborador.
Em resumo, este facto já imprime um certo sentido de verticalidade à função-crédito. Mas, se lhe acrescentarmos a ligação instrumental entre as empresas bancárias, a que acima nos reportámos, pode atribuir-se ao crédito, sem grande esforço, o carácter duma actividade económica dominada por um conjunto simultâneo de relações complementares e instrumentais, embora com notória superioridade das primeiras.
Sendo assim, podemos concluir, como o fizemos relativamente aos transportes: uma corporação do crédito ou está logo de acordo com aquele princípio da simultaneidade que formulámos, respeitando conjuntamente relações de horizontalidade e verticalidade, ou, não se dando relevância a estas últimas, cair-se-ia na alçada de outro, princípio - da preferência instrumental-, que na sua última parte ressalva apenas os «casos particulares que requeiram tratamento especial».
De qualquer modo atingimos por esta via de raciocínio a mesma conclusão a que tem chegado a generalidade dos estudiosos da matéria, admitindo uma corporação para o crédito.
Saliente-se, todavia, que a proposta de lei prescreve uma «Corporação do Crédito e Seguros», embora seja certo que as duas actividades, bancária e seguradora, não mantêm entre si visíveis relações de complementaridade ou verticalidade.
O processo adoptado só pode, pois, legitimar-se mediante um critério exclusivamente restritivo do número de corporações a criar, chamando-se a atenção do Governo para tal circunstância.
78. E passemos ao exame da Corporação do Comércio.
Esta hipótese duma corporação do comércio é realmente curiosa, à luz dos princípios orientadores da integração corporativa. Na verdade, só com ela acontece a particularidade estranha, mas perfeitamente explicável, de os citados princípios a rejeitarem primeiro, admitindo-a depois. Decifremos o enigma.
À primeira análise parece que uma corporação do comércio terá de pôr-se de parte, porque estão ali representados actividades comerciais ligadas entre si por simples relações de interdependência complementar. Aplicando o princípio da simultaneidade que formulámos teríamos de averiguar se é viável para essas actividades organizarem-se com subordinação aos dois tipos de relações - instrumentais e complementares; e só na hipótese de não ser possível a sua, conjugação teríamos de recorrer então ao terceiro princípio - da preferência instrumental.
Ora, verifica-se que há viabilidade, quanto a essas empresas, de serem atendidas simultâneamente tanto as relações de complementaridade como as de instrumentalidade. Chegará para tal demonstração o exemplo dos comerciantes de tecidos, que podem perfeitamente enquadrar-se na corporação dos têxteis, respeitando-se assim as relações horizontais entre o comércio de tecidos de lã de algodão ou de seda e, ao mesmo tempo, a sua interdependência, vertical com as actividades do seu ciclo produtivo - indústrias têxteis e produtores de fibras. E o mesmo poderia dizer-se a propósito dos comerciantes de ferragens, relativamente a uma corporação de metalurgia e mecânica, dos comerciantes de vinhos, quanto a uma corporação dos vinhos, dos comerciantes de carnes, com referência a uma corporação da pecuária, etc.
E note-se, ainda, que o recurso ao terceiro princípio - se tivesse que descesse até lá, o que já está fora de causa - nos arrastaria ao mesmo resultado, porque ele postula a preferência instrumental, na impossibilidade de conjugação das suas espécies de relações, e era, portanto, o caminho do ciclo produtivo que teria de seguir-se, conforme se viu no caso anterior.
Não deixaremos de registar que uma penetração dirigida exclusivamente ao conjunto das actividades mercantis pode revelar a existência de relações verticais no seu campo especifico. É o caso da sucessão «comércio armazenista-retalhista», em que o primeiro fornece produtos ao segundo. Mas tal circunstância, poderá desprezar-se, não só porque o ciclo produtivo é diminuto aqui, como também porque deixa inteiramente de fora a sua parte fundamental -produção da matéria-prima e indústria. E, por isso, julgou-se aconselhável não alterar os dados fundamentais do problema