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952 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 90

tendência para a extensão das dimensões das empresas, como está aí também uma das razões, porventura a fundamental, da criação de agrupamentos de empresas como solução conciliatória dos ditames da técnica e dos desejos de sobrevivência de unidades preexistentes, sujeitando-se estas embora a amputações da sua liberdade de acção. A evolução desenvolve-se, como querem alguns, no sentido do capitalismo atomístico para um capitalismo molecular.

18. Se no campo empresarial este sentido do processo histórico faz surgir a eventualidade da criação do poder económico pela formação de grupos de interesse, aos inconvenientes desse poder se deverá obstar pela chamada de dois outros poderes com susceptibilidades de actuação também no domínio do económico: o poder sindical e o poder do Estado, poderes compensadores na terminologia já consagrada. E a forma mais correcta de estabelecer o jogo desses três poderes é dispô-los e enquadrá-los de tal sorte que. as respectivas forças constituam um sistema cuja resultante responda ao bem comum - o sentido do capitalismo benéfico, capitalismo progressivo ou, mais expressivamente, da economia de organização.
Em outros termos, para que seja salvaguardado b interesse colectivo é necessário institucionalizar os três poderes, ou, numa palavra, importa conceder-lhes organicidade corporativa. E a verdade deste asserto assume tal evidência que em países ainda apegados a um pluripartidarismo político com representação, e onde se verificam as pressões dos três poderes, não salutarmente canalizadas pela via institucional, antes defeituosa e perigosamente exercidas através dos partidos políticos, cujos programas doutrinários ficam de tal sorte postergados, se levantam vozes a reconhecer os malefícios de um regime híbrido definido pela sobreposição de um arremedo corporativo, sem existência legal e, portanto, com presença apenas de facto, a uma orgânica que com impropriedade se apoda ainda de politicamente representativa. O mesmo significado assume a recente proposta, da Comissão Cohen, em Inglaterra, de criação de um conselho representativo das Trade Unions, das organizações patronais e do Estado, para a negociação de contratos colectivos de trabalho. E assim naquelas comunidades não assinaladas por economias de direcção central o pendor para a organização corporativa é um facto, reconhecido umas vezes; outras, talvez por necessidade de política partidária, ainda não declarado.
Torna-se necessário um Estado forte, com autoridade que dimana, da independência e da isenção, sem ligações políticas que arrastem a compromissos. Só um Estado forte pode, com o seu poderio, manter o equilíbrio das outras duas forças em presença - a dos grupos empresariais e a dos grupos sindicais. Mas que cuidado e vigilância exige o exercício do poder do Estado! Ele tem de se conter nos limites estritamente marcados pelo interesse colectivo e pelo risco de se tender para a estatização socializante, para um cripto-estatismo ou, como querem alguns, socialismo sem programa, campo árido em que deixam de ter voz o estímulo e a iniciativa criadora de que só as unidades privadas são detentoras.

19. Somos, constitucionalmente, uma república unitária, e corporativa. A esse princípio ético se dirige, como importa, a nossa legislação. Nela se encontra fortemente assinalado o desígnio de substituir à luta ou oposição pela cooperação ou solidariedade, como nela se sublinha a consagração de um Estado forte e a este se impõem limites no exercício do poder económico.
E assim, só para citar, além da Constituição, um dos diplomas fundamentais, se invoca o Estatuto do Trabalho Nacional. Logo no seu artigo 2.º se ditam os fins a contemplar na organização económica da Nação: «realizar o máximo da produção e riqueza socialmente útil e estabelecer, uma vida colectiva de que resultem poderio para o Estado e justiça entre os cidadãos». No artigo 4.º traça-se já uma fronteira intransponível ao exercício do poder estadual: «O Estado reconhece na iniciativa privada o mais fecundo instrumento do progresso e da economia da Nação», fronteira cuja definição o artigo 6.º completa nos seguintes termos: «O Estado deve renunciar a explorações de carácter comercial ou industrial, mesmo quando se destinem a ser utilizadas no todo ou em parte pelos serviços públicos, e quer concorram no campo económico com as actividades particulares, quer constituam exclusivos, só podendo estabelecer ou gerir essas explorações em casos excepcionais, para conseguir benefícios sociais superiores aos que seriam obtidos «em a sua acção ...». Depois, no artigo 7.º, define-se o sentido de actuação do Estado:

O Estado tem o direito e a obrigação de coordenar e regular superiormente a vida económica e social, determinando-lhes os objectivos e visando designadamente o seguinte:
1.º Estabelecer o equilíbrio da produção, das profissões, dos empregos, do capital e do trabalho;

3.º Conseguir o menor preço e o maior salário compatíveis com a justa remuneração dos outros factores de produção ...;
4.º Promover a formação e o desenvolvimento da economia nacional corporativa num espírito de cooperação que permita aos seus elementos realizar os justos objectivos da sociedade e deles próprios, evitando que estabeleçam entre si oposição prejudicial ou concorrência desregrada, ou que pretendam relegar para o Estado funções que devem ser atributo da actividade particular;
5.º Reduzir ao mínimo indispensável a esfera do . seu funcionalismo privativo no campo da economia nacional.

As imposições aos detentores dos factores produtivos são enumeradas da seguinte forma: «A propriedade, o capital e o trabalho desempenham uma função social, em regime de cooperação económica e solidariedade» - assim reza o artigo 11.º; no artigo 14.º particulariza-se: «Sobre o capital aplicado em explorações agrícola, industrial ou comercial impende a obrigação de conciliar os seus interesses legítimos com os do trabalho e os da economia pública»; no artigo 20.º continua-se: «Compete às entidades patronais cooperar com o Estado e com os organismos corporativos na melhoria das condições económicas dos seus trabalhadores dentro dos justos limites ...», estes definidos, num sentido de perfeito equilíbrio, no artigo 16.º, ao dispor-se que os interesses ou os direitos do trabalho não podem prevalecer so- bre o direito de conservação ou amortização do capital das empresas e sobre o direito do seu justo rendimento, e ao particularizar-se, agora em relação ao trabalho, no artigo 22.º: «O trabalhador intelectual ou manual é colaborador nato da empresa onde exerça a sua actividade e é associado aos destinos dela pelo vínculo corporativo».
E até se encontra expressa no Decreto-Lei n.º 23 049, de 23 de Setembro de 1933, que instituiu as regras de organização facultativa dos grémios, a menção do repúdio pelo «predomínio das plutocracias», como um dos deveres a eles impostos - eles, os grémios, «órgãos representativos das entidades patronais e do capital», como esclarece o mesmo diploma.