O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

16 DE DEZEMBRO DE 1963 447

contra ambiente extremamente favorável e é fácil reconhecer-se quanto essa facto enfraquece a defesa jurídica da personalidade e como, em especial no tocante ao cadáver humano, ó grave a responsabilidade que lho pode caber nos piores desregramentos da teoria e da prática.
Á doutrina jurídica cumpria assegurar na vida social, pela contemplação das essências e pela firmeza dos princípios, a estrutura capaz de manter todos e cada um dos homens na posição que lhes pertence por natureza e garantir o respeito devido à autonomia pessoal e ao corpo humano, vivo ou morto, tem-se deixado, porém, resvalar para as maiores hesitações e incongruências, quando não para as soluções mais aberrantes, e bem se compreendem, por isso, os estranhos desvios da prática, a que já fizemos referência.
Importa, em tais condições, reconduzir-se a ciência jurídica aos sãos princípios pelos quais o homem, conquanto não possa considerar-se dono de si mesmo (ou, melhor, precisamente porque o não ó o porque o seu fim e perfeição lhe não pertencem), não tenha o direito de consentir em que, na teoria ou na prática, o rebaixem à vil condição das coisas.

17. NECESSIDADE DE BE EXAMINAREM AS PRINCIPAIS PERSPECTIVAS DO DIREITO, SEGUNDO UMA CONCEPÇÃO PERSONALISTA - À crise actual da distinção entre pessoa o coisa, que acabámos de descrever nas linhas gerais, põe em causa as concepções profundas do direito e só pode vencer-se revendo-se as ideias básicas donde há-de partir-se para definir aquelas duas realidades a luz da doutrina jurídica
13 óbvio, porém, que os limites naturais do um trabalho da natureza do presente parecer não permitem versar o problema em toda a sua amplitude e profundidade E, aliás, não seria próprio desta Câmara tomar posição perante controvérsias puramente doutrinais para se inclinar para esta ou aquela solução, que sempre teria de apresentar certas facetas pessoais.
Desde que se queira, todavia, apreciar o projecto em exame perante critérios jurídicos rigorosos, não se poderão deixar de considerar aqui os aspectos fundamentais do problema, e por isso vamos tentar fazer um esboço de uma concepção personalista do «direito, restringindo-nos àquilo que nela se afigure mais relevante e mais adequado a concepção do homem de que, segundo dissemos, temos de partir para o nosso estudo.
Vista nestes estreitos limites, a crise actual desenvolve-se em torno da possibilidade de a pessoa ser objecto de direitos em termos aparentemente semelhantes aos das coisas Partindo-se de posições doutrinárias que apresentam o homem como isento de qualquer vínculo ético e dominado por interesses que, por influxo do positivismo, mais ou menos francamente se declaram egoístas, e concebendo-se o direito como simples superstrutura sobreposta à natureza humana com o fim de resolver os conflitos levantados entre esses interesses, coordenando estes em relações jurídicas, vem-se a reduzir todas as realidades do mundo do direito a ideia de relação jurídica e a caracterizar-se a pessoa, tal como acontece com a coisa, pelo simples aspecto do lugar ou função que desempenha nessa relação.
As pessoas e as coisas aparecem-nos assim colocadas no mesmo plano formal, e por conseguinte como realidades em certa medida contíguas. E aquelas outras realidades que, como as partes separadas do corpo vivo ou o cadáver do homem, verdadeiramente não podem qualificar-se, num critério de bom senso, nem como pessoas, nem como coisas equiparáveis às do mundo exterior, têm de enquadrar-se forçosamente, para esta orientação, em algumas daquelas realidades, geralmente são confinadas na noção de coisa, mas submetidas a princípios que são mais próprios das pessoas, e daqui resulta que passam a constituir, entre as pessoas e as coisas, uma zona de penumbra que mais esbate a diferença entre aqueles dois pólos fundamentais a mais facilita a transição de um deles para o outro.
Só a revisão dos postulados fundamentais do direito nos permitirá vencer esta crise, demonstrando-nos que, respeitando-se a própria natureza do homem, se tem de concluir que as pessoas e as coisas se movem sempre em planos essencialmente distintos e que a noção de pessoa tem o primado entre todas as outras noções jurídicas relativas a situação do homem e nunca pode sei, por isso, aproximada da ideia de coisa.
Demonstrar esta tese e os corolários a que conduz acerca do cadáver humano é o objectivo que, com a brevidade possível, nos propomos atingir nos números subsequentes.

18. CARÁCTER DE NATURAL E ESSENCIALMENTE INTRÍNSECO DO DIREITO - Como primeiro passo desta nossa investigação, cumpre-nos demonstrar que o direito é um elemento intrinsecamente constitutivo da essência do homem, e não simples coloração exterior e artificial, como resulta das concepções decisionistas e normativistas a que nos temos referido Para versar esse aspecto da questão, importa, antes de mais, pôr em evidência a origem natural do direito e assentar ideias acerca da forma como ele se distingue da moral.
Ao examinarmos a concepção custa do homem, verificámos que ele foi criado a imagem e semelhança de Deus, verdade sublime que se manifesta, antes de mais, na personalidade humana o homem é um ser racional e livre dotado de certo poder de criar e a quem foi conferido o senhorio do mundo, e por isso se possui a si mesmo como ser radicalmente autónomo. Não vive, porém, fechado em si mesmo, antes é aberto ao encontro com o mundo exterior, com os outros homens, assim na comunidade como na história, e acima de tudo ao encontro com Deus como todos os seres incompletos, ele experimenta a exigência ontológica da realização por um bem

____________________

-se senão pela força do espírito, Carnelutti não deixa de considerar o homem como coisa - coisa sus generis, uma coisa-pessoa.
A especialidade da construção está no modo do se conciliarem estes dois aspectos contraditórios. O homem teria aã características gerais da coisa, mas, além delas, teria os qualidades própria da pessoa, a pessoa não seria um atributo do homem, mas um doa elementos que o compõem (ob cif, p 114), e, por isso, o homem não seria uma «não coisa», mas sim uma «mais do que uma coisa» - como pessoa, seria sujeito e, como coisa, seria objecto (ibid p 125).
O facto de em geral não se distinguirem estes elementos do homem seria a causa de relutância manifestada pela doutrina relativamente aos chamados «direitos sobro a pessoa própria» e «direitos sobre a pessoa alheia» no entendei de Carnelutti, enquanto o homem ao confundir com a pessoa, melhor, enquanto não se distinguir no homem a pessoa da coisa, a repugnância da doutrina acerca daquelas figuro» é legitima o, por isso, não há direitos sobre a pessoa, mas direitos da pessoa, isto, porém, não quererá dizer que haja só direitos do homem, e não direitos sobre o homem, precisamente porque o homem não ó só pessoa, moa também coisa (ibid , p. 127).
Sem se ignorar o brilhantismo com que se apresenta esta construção, ó manifesto o exagero de abstracção em que ela cai; a pessoa não ó um elemento do homem, nem sequer um atributo dele - é o próprio homem, cada homem, como ente concreto e vivo, e a pessoa (humana) só é compreensível através de todos ns aspecto» peculiares ao homem, evolando-se em fumo logo que for contemplada como realidade distinta dele