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16 DE DEZEMBRO DE 1963 451

mismo e de auto-suficiência) e, portanto, necessitados de serem coordenados entre si, e não apenas justapostos.
Este diverso aspecto que a moral e o direito revestem nas zonas de periferia riflo prejudica, contudo, a identidade de natureza e de fundamento, tal diversidade resulta apenas da perspectiva por que cada um, partindo embora dos mesmos princípios básicos (a lei natural), encara o objecto quo lhe é próprio e específico.
Todas as considerações anteriores nos levam a reconhecer a função intrínseca e essencial da moral e do direito na vida humana.
Partindo da exigência ontológica de realização de um fim último, predeterminado e fixo, e, a par dela, da autonomia radical do homem, logo tivemos de reconhecei o dever básico de fidelidade àquele fim, como meio essencial de ajustar a este aquela autonomia Esse dever básico revela a existência de leis destinadas a conformar com esse fim as actividades parcelares do homem e que tendem a desenvolver-se em diversos planos e sentidos - leis naturais e leis positivas, leis morais e leis jurídicas, estas últimas ainda com a tendência para se diversificarem em ordens distintas, segundo as comunidades em que se formam Estas ordens brotam, assim, naturalmente, do próprio dever básico de fidelidade ao fim último e não representam, por isso, meros limites convencionais à liberdade do homem, como pretendia o liberalismo, nem simples normas arbitrárias derivadas da necessidade social ou do capricho da autoridade, enquanto são conformes à lei natural, derivam, antes, do modo de ser próprio do homem, e por isso, conquanto diversas entre si, fundam-se todas nos mesmos princípios básicos e correspondem a aspectos essenciais da estrutura da vida humana.
Àqueles diversos sectores em que, por este modo, se desenvolvem e desdobram as leis derivadas do princípio básico de fidelidade ao fim último não correspondem, portanto, a zonas recortadas arbitrariamente na vida do homem e susceptíveis de mutuamente se desconhecerem ou contradizerem, mas sim extractos diversos da estrutura natural do homem e da sua actividade. No seu conteúdo concreto, esses extractos podem envolver aspectos mas ou menos fixos nu variáveis, podem ser impostos pela natureza ou mostrarem-se dependentes do arbítrio ou das circunstâncias, podem tender para o mesmo universalista, como a moral, ou para o pluralismo de ordens diferenciados, como o direito, mas, mesmo na medula em quo assim ao apresentam (e desde que não contrariem a lei natural), correspondem, quando vistos no plano ontológico, maneira de ser essencial do homem, como ente autónomo, com missão singular para exercer na vida individual e no seio da comunidade o aberto à realidade transcendente e, portanto, com natureza que se define tanto pelos resultados obtidos como pela base donde parte a actividade humana, mas que, em toda a sua expansão e no exercício do seu poder criador, o essencialmente subordinado à ordem ética, emanada do seu fim último
liste carácter integral que, através das suas manifestações pluriformes, assume a ordem ética é, portanto, consequência intrínseca da própria natureza humana Sem um fim último, fixo e sublime, o homem seria um ente absurdo e contraditório, condenado à condição de aspirar, por exigência radical e ontológica, a um bem supremo que nunca poderia atingir, mas sem autonomia o homem perderia a nobreza e sublimidade da missão que há-de desempenhar relativamente a esse fim, visto se tornar então inapto para atingir este pelo seu esforço e mérito, e, portanto, com adesão viva da sua pessoa Para que, todavia, não falte nenhum destes dois aspectos, é essencial a existência de um princípio que ajuste a autonomia do homem ao cumprimento do seu fim, e que isto é outro senão o dever básico de fidelidade a este último, a que temos aludido
Significa isto que não pode haver manifestação alguma da autonomia que não esteja sujeita a esse dever básico e que nenhum acto humano pode, por conseguinte, ser eticamente indiferente Todos os actos - decerto com valores relativos muito variáveis e por isso hierarquizados - hão-de ser bons ou maus, lícitos ou ilícitos e justos ou injustos.
Esta subordinação à ética nem sequer respeita apenas tios autos do homem, vistos isoladamente Na medida em que tais actos são actuação da personalidade, a ética (e portanto tanto a moral como o direito) confere-lhes sentido e valor de conjunto Por isso a vida (na acepção de existência do homem, actuante por entre factores exteriores à vontade, que ora a- coadjuvam ora a contrariam, mas sempre lhe oferecem oportunidade para se aproximar do bem e da justiça) não é simples sucessão de factos, mas actuação diuturna das potências contidas na personalidade, e por isso com significado de conjunto, em que cada acto remata e reelabora o passado e prepara, no bom ou no mau sentido, o futuro, através da vida o homem vai, assim, acumulando mérito ou demérito, enriquecendo ou empobrecendo a personalidade e tornando-a assim mais ou menos apta para o cumprimento do fim último, até que no momento da morte se fixa definitivamente o valor dessa vida e do homem que a viveu Nesta perspectiva se afirma que o jovem mártir ou herói viveu plenamente e que a morte dele «envergonha a velhice ociosa».
Por isso, sem se conhecer a «vida» de um homem não se conhece verdadeiramente este dentro dos limites da impei feita realização do homem na existência terrena, a vida é o acto da personalidade, mas é-o enquanto encarada como subordinada à ética, e portanto como julgada por cia perante o fim último do homem.
Limitar-se a moral ou o direito a meros aspectos restritos da vida, contrapondo-se o «homem moral» ao «homem jurídico» ou ao «homem político» ou ao «homem económico», é, por conseguinte, cindir-se a personalidade e a vida por forma tão absurda como seria a de se imaginai um homem sem cor ou sem volume. A ética é um princípio intrínseco e essencial do homem e, para a vida dele, é como o imã para a limalha de ferro é ela que lhe dá sentido e sem ela a vida é como a limalha sem a acção magnética - não passa de um amontoado de poeira sem figura e sem harmonia.
O direito, como modo de ser da ética, é por isso um aspecto desse princípio e dimensão essencial do homem, e portanto igualmente intrínseco e essencial, e não mera superstrutura exterior e arbitrariamente imposta à natureza humana
Mas, para desempenhar esta função de princípio estruturante do homem, tem de sempre ser conforme à natureza dele e às leis fundamentais que ela revela e impõe, se assim não for, não será direito, mas «torto», será a violação e deturpação do próprio homem.

19. PRIVADO DA PESSOA HUMANA CONCRETA - Assente a solução que, a respeito da interpretação geral do fenómeno do direito, parece adequada à concepção cristã do homem, cumpre tomar-se agora posição sobre alguns pontos básicos da estrutura da ordem jurídica, vista à luz das conclusões precedentes.
O primeiro aspecto que importa salientar-se é o de que a ideia de pessoa humana, ou, melhor, a pessoa humana viva e concreta, tem o primado em toda a construção do direito