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16 DE MARÇO DE 1971 663

vincia. Nada nos diz que outros serviços nacionais se não devam instituir ou organizar, por serem porventura a melhor forma de assegurar a boa gestão dos próprios interesses de cada província e, de qualquer modo, dos interesses comuns a todo o território do Estado Português. Não é de excluir in limine, por exemplo, que serviços como os da saúde pública, do ensino em geral, da justiça e outros, não apenas possam, mas mesmo eventualmente devam ser organizados como serviços nacionais.
A Câmara entende que é preciso evitar, por todas as razões, que a Constituição fique redigida em termos de, pela omissão de um preceito sobre este assunto, se entender amanhã, que não pode haver lugar para uma integração administrativa, ainda que parcial ou limitada, estendida até onde for útil ou necessário. Por isso, sugere que, num último inciso, neste artigo 133.° se diga que na lei sobre o regime geral de governo das províncias ultramarinas se deverá prever a possibilidade de haver serviços públicos da administração provincial integrados na organização da administração de todo o território português.
Já não se tratará de se ser vítima de um pathos integracionista. Trata-se de, com mente fria e ânimo tranquilo, admitir, realisticamente, que há serviços públicos provinciais que devem ser integrados e outros que só «contra a natureza» o poderão ser.

152. Acrecenta-se, neste lugar da proposta, que as províncias ultramarinas poderão ter a designação de «Estados», de acordo com a tradição nacional, quando o progresso do seu meio social e a complexidade da sua administração justifiquem essa qualificação honorífica.
Assinale-se que se não trata de qualificação, digamos, científica, que às províncias ultramarinas caiba, analisado que seja o regime jurídico, especialmente o regime constitucional, a que ficam sujeitas. Esta Câmara, especialmente a propósito do artigo 5.°, já teve ocasião de evidenciar que a unidade política nacional não é negada ou quebrada ou mesmo simplesmente atenuada pelo facto de se prever a existência de regiões autónomas. As comunidades populacionais das regiões não são, isoladamente, detentoras de soberania própria, no exercício da qual elaborem a sua respectiva constituição ou modifiquem a que em certo momento lhes haja sido outorgada pelos órgãos da soberania do Estado. Os órgãos legislativos das províncias ultramarinas não exprimem a vontade soberana das suas populações; não existe um executivo local, responsável perante uma assembleia legislativa e concebido também como representante, ainda que indirecto, de cada uma dessas populações, entendidas como providas de soberania. Não existe, nas províncias ultramarinas, um «poder judicial» próprio de cada uma delas, e exercido apenas por cidadãos naturais de cada província, órgãos legislativos, executivos e judiciais, em cada província, não exprimem outra soberania que não seja a da Nação Portuguesa no seu conjunto, a qual, antes de mais, se manifesta ou exerce, no plano constituinte, elaborando uma única constituição e introduzindo-lhe, sempre que seja oportuno, alterações. Uma comunidade sem poder constituinte não é uma entidade soberana — não é, juridicamente, um Estado.
O facto de estas províncias deterem, para serem exercidos por órgãos locais, certos poderes legislativos e administrativos, não importa quebra da unidade nacional. A integração política continua a ser completa. A descentralização administrativa e legislativa, na medida em que é consagrada, não importa a estadualização porque não se atingem os limites além dos quais a «região» deixa de o ser para ser um «Estado», ainda que limitado na sua soberania interna e externa. Observados estes limites, todas as reformas são possíveis, porque a unidade nacional continua preservada e em nada se atenta contra ela. A descentralização administrativa e a autonomia legislativa não atingem a unidade da Nação. A participação das populações e dos interesses organizados locais, na vida administrativa e na feitura das leis que especialmente lhes respeitam, não é nada que, de per si, signifique um risco para a unidade política da Nação. O Prof. Oliveira Salazar, cuja concepção unitarista é incontestável, sentiu-o perfeitamente e não o ocultou, em mais que uma oportunidade. Na sua entrevista à Life, de 4 de Maio de 1962 (in Entrevistas, cit. p. 80), disse-o expressivamente:

À medida que os territórios se desenvolvem e a instrução se difunde, as elites locais tornam-se mais numerosas e capazes e as suas tarefas podem ser acrescidas sem risco, antes com vantagem, para a comunidade nacional. É esta a orientação do nosso trabalho.

Pouco antes, em 31 de Maio de 1961, dissera ao The New York Times, (ob. cit., p. 39):

O sistema então instituído (na alteração constitucional de 1951 e na Lei Orgânica do Ultramar de 1953) tenderá ainda a evoluir em harmonia com o progresso realizado nos domínios político, económico e social, a caminho de formas mais elevadas de autonomia...

Aliás, isto é coerente com o que afirmara na Assembleia Nacional em 30 de Novembro de 1960 (Discursos, vi, p. 101):

O Governo tem o espírito aberto a todas as modificações da estrutura administrativa, menos os que possam atingir a unidade da Nação e o interesse geral.

E com o que dissera em 30 de Junho de 1961, no mesmo local (ob. cit., pp. 153 e seg.):

A estrutura constitucional não tem, aliás, nada que ver, como já uma vez notei, com as mais profundas reformas administrativas, no sentido de maiores autonomias ou descentralizações, nem com a organização e competência dos poderes locais, nem com a maior ou menor interferência dos indivíduos na constituição e funcionamento dos órgãos da Administração [...]. Só tem que ver com a natureza e solidez dos laços que fazem das várias parcelas o todo nacional.

Apura-se que a denominação «Estado» foi utilizada em referência a mais que uma dependência ultramarina da Coroa Portuguesa, pelo menos a partir dos princípios do século XVII, para designar unidades político-administrativas mais ou menos extensas dos Descobrimentos portugueses na América do Sul, em África e na Ásia. No Regimento de 1642 do Conselho Ultramarino (in Colecção Cronológica da Legislação Portuguesa, compilada por José Justino de Andrade e Silva, 2.ª série, 2.° vol., pp. 152 e segs.), dizia-se que lhe competiam:

... todas as matérias e negócios de qualquer qualidade que fossem, tocantes aos ditos Estados da índia, Brasil e Guiné, ilhas de S. Tomé e Cabo Verde e de todas as mais partes ultramarinas e lugares de África...