16 DE ABRIL DE 1941 244-(7)
serviçais que a procurem, tudo aconselhando, portanto, que se chame à «colonização» das terras, pela concessão de vantagens atraentes, os braços de que precise para o trabalho permanente.
Em todos os domínios coloniais a obrigação maior e mais indeclinável da administração é a defesa intransigente das populações suas tuteladas e promover por todas as formas; ao seu alcance a conservação, aumento e valorização do capital humano de que depende a sua prosperidade. Um dos preceitos máximos da nova política portuguesa está consubstanciado nestas palavras: temos obrigação de sacrificar tudo por todos, não devemos sacrificar todos por alguns.
8. É indiscutível que sempre uma idea de assistência material e moral às populações indígenas do Império predominou no espírito português. Assegurou-se-lhes a paz e a justiça. Efectuou-se o apostolado cristão para a formação espiritual das almas. Concede-se-lhes hospitalização a socorros médicos. Cuidou-se da sua riqueza agrícola e pecuária. Deram-se-lhes escolas e oficinas. E, finalmente, defenderam-se no seu trabalho contra os abusos ou os tratamentos susceptíveis de correcção.
A obra de protecção às populações indígenas nas colónias portuguesas é justo título de orgulho para a actividade colonial da Nação. Com essa protecção despendem as colónias valiosas quantias. E o que se tem feito neste campo no ultramar português bem demonstra que, através de todas as circunstâncias, Portugal tem cuidado, com especiais desvelos, os indígenas das suas colónias.
Mas é inegável que uma organização mais conveniente do povoamento indígena, o seu estabelecimento em lugares mais acessíveis para que a assistência a todos alcance e favoreça poderá tornar ainda melhor e mais eficaz a protecção, que jamais deixou de ser dispensada com extremos de solicitude.
É também certo que nenhuma organização seria duradoura se não procurasse criar no indígena o sentimento que fixa os homens à terra: o amor à propriedade. E eis por que no Acto Colonial já ficou preceituado que o Estado garantiria aos indígenas a «propriedade e a posse dos scus terrenos de cultura».
Mas a propriedade deve ser mais que um campo arável. As culturas anuais são insusceptíveis de criar o amor ao chão: após a colheita sucede o ervedo, e nenhuma afeição fica ali enraizada. Tem-se notado porém que o indígena estabiliza nos lugares onde possua ou crie arvoredos que lhe prodigalizem frutos. E, assim, a propriedade indígena deverá ser parcialmente constituída por culturas permanentes, correlativamente se associando a esta idea a constituição do «casal de família», que é um princípio do estatuto orgânico da Nação.
Assim melhor se organizará a propriedade privada. Mas ao mesmo tempo convém que se não destrua, e, pelo contrário, se mantenha e aperfeiçoe a comunidade agrícola, tradicional em muitos povos, para que entre os lares independentes se perpetue o espírito de «associação» de que resulta o bem colectivo.
Daqui o pensamento de se reservar, em tôrno das «aldeias» organizadas, o terreno bastante para o trabalho colectivo da respectiva população, e do seu produto ser extraído um «fundo» de previdência e assistência que consinta a melhoria progressiva das suas condições de vida e o amparo a necessitados.
9. Ficaria, porém, incompleta toda a obra de civilização que não procurasse a reforma dos espíritos.
Todos os povos inferiores que se isolaram nos seus costumes e superstições, e nos seus ritos bárbaros, desapareceram ou vão em caminho de desaparecimento. O progresso é mais um produto da alma do que do braço. Mas a formação do espírito só pode ser obra das missões católicas portuguesas, na religião se buscando o elemento da unidade social, que só por si tem criado nações, agregando povos diferentes.
Ora pelo Estatuto Orgânico das Missões Católicas Portuguesas (1926) já o ensino de práticas agrícolas e profissionais se acrescentava ao da religião e da língua nacional. E no programa de acção que a lei lhes estabeleceu há tudo quanto pode querer-se para a desejada elevação moral e material dos povos nativos, até à constituição perfeita do lar e da família.
Dar-se-á, pois, um papel primacial às missões católicas portuguesas na formação e direcção das «aldeias» que o Estado vai organizar. Tudo recomenda que as populações cristãs sejam agrupadas em povoações isoladas dos agrupamentos gentílicos, evitando-se assim o contacto e o abandono espiritual que faz regressar o homem à selva.
10. Em suma, o que o Estado Novo vai agora tentar é a organização das sociedades indígenas dos territórios coloniais de modo que dela resulte «o maior aumento possível dos bens do corpo, do espírito e da fortuna», com primazia do aperfeiçoamento moral, entrando definitivamente no caminho de, pela fé, pela língua, pela educação, pela comunidade dos sentidos e das ideas, dos hábitos e dos gostos, criar os laços naturais que ainda mais justifiquem a unidade e indestrutibilidade do Império.
Deslocadas as populações para os lugares mais férteis e mais salubres e tanto quanto possível na proximidade das vias de comunicação; agrupadas segundo as raças, para que as misturas de sangue não produzam depauperamentos o receptividades prejudiciais; organizada a sua vida económica em condições de bem-estar e de maior apêgo à terra, pondo esperanças no termo dos seus hábitos vagabundos; facilitada a assistência dos serviços sanitários e de fomento pelo agrupamento e melhor distribuição dos povos que agora vivem disseminados; produzida a maior abastança e melhor combatidos os males destruidores legìtimamente, pode esperar o Estado que as populações se multipliquem e, em consequência, toda a riqueza aumente, atraindo o comércio e as indústrias, que são fontes permanentes, de colonização.
E, assim, todos os problemas de administração, de povoamento, de civilização, de fomento e de nacionalização aparecem deminuídos nas suas dificuldades, pois que em grande parte se resolvem com a simples melhoria das condições em que vive e trabalha a quási totalidade da população indígena.
É evidente que o objectivo proposto terá de ser alcançado lentamente, por forma a não violentar as populações indígenas, que precisamente se deseja beneficiar.
Nesta matéria temos de caminhar devagar, para caminharmos com segurança, pois não é de repente que se podem alterar hábitos muito antigos.
Importa porém começar.
É possível que na grandiosidade da tarefa que o fim proposto impõe se gaste a vida de mais de uma geração. Mas por isso mesmo a sua realização deve iniciar-se sem demoras, para que de ano para ano os benefícios da organização vão produzindo seus frutos.
Foi êste projecto largamente debatido na II Conferência dos Governadores, que o aprovou.