76 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 111
tão aquele afluxo de circulação fiduciária?, O que explica este aumento de disponibilidades no mercado?
Parece que êle não proveio de uma maior actividade económica; a Câmara, Corporativa assim o concluo das cifras que exprimem o movimento das operações de crédito por bancos e banqueiros comerciais e dos empréstimos; julga antes que o facto se deve atribuir à circunstância de Portugal, mercê da guerra europeia, se ter convertido num tutíssimo refúgio de pessoas e capitais.
Com efeito, a nossa posição de estrita neutralidade no conflito mundial, a ordem e tranquilidade interna de que disfrutamos, o crédito que conquistámos, mercê da política de severo saneamento financeiro, o prestígio mundial de que disfruta o Chefe do Govêrno (por que não proclamá-lo?!) a que benèficamente se reflecte sôbre o País - a par da benignidade do nosso clima e da especial posição geográfica, levaram muitos foragidos aos horrores da guerra a escolher Portugal para residência temporária e muitos capitais ameaçados a buscar a segurança da nossa terra.
As disponibilidades em moeda estrangeira, que a partir de Setembro de 1939 já alinhavam no escalão dos 30 milhões, de liras, acusam a partir de Agosto de 1940 uma ascensão contínua, que, as faz entrar na casa dos 30 milhões de libras em Janeiro, do corrente ano, e que em Agosto as elevou a 47.320:000 libras, totalizando desde 1938, um aumento de quási 29 milhões de libras, libras, ou de 150 por cento!
Esta próspera situação nacional não deve: atribuir-se, como nota a Câmara Corporativa, ao movimento do nosso comércio externo, apesar de a respectiva balança ter passado de 1.146:000 contos de saldos negativos, em 1938, a 138.000 contos de saldos positivos, no fim do 3.º trimestre dêste ano.
Seja, porém, como fôr, o facto positivo é êste: estamos em maré alta de circulação fiduciária, mantém-se a previsão do excesso de disponibilidades monetárias no mercado, com a correspondente alta de preços (que o Banco de Portugal já estima, no comércio de retalho, em quási 39 por cento, em relação a Julho de 1939), e que todos nós pesadamente sentimos.
Entrámos, assim no círculo vicioso a que me referi; estamos a ser vítimas da teoria da espiral; o Govêrno assim o registou e com o projecto que traz à Câmara procura conjurar o perigo, oferecendo às disponibilidades privadas uma aplicação segura do capital, a uma taxa compensadora, procurando desviar de aplicações improdutivas uma massa de capitais que amanhã, quando, as circunstâncias mundiais mudarem há-de fazer falta.
Não somos, por temperamento, povo de poupadores; não fugimos, por via de regra, quando as circunstâncias nos trazem dinheiro a mais, a gastá-lo nem sempre produtivamente. São de nosso rifoneiro, estes adágios: «Quando a velha tem dinheiro, não tem carne o carniceiro» e «O bom ganhão faz o bom gastão». Mas
não vim aqui para, fazer concorrência aos Adágios Portugueses, do Padre Delicado, ou ao Ensaio Phraseológico de Pina Manique; quis apenas registar um facto conhecido.
Já era minha intenção, ao entrar neste debate, preguutar ao Govêrno se não julgava chegado o momento de pôr ordem e regra em certos desregramentos do consumo que depois do agravamento, da guerra, se não podem manter, sem sérias preocupações.
Antecipou-se no propósito o nosso ilustre colega Sr. engenheiro Cancela de Abreu com o sentido da oportunidade e a elevação de propósitos que, sempre manifesta, nas suas intervenções. Só tenho que me felicitar, e à Câmara, porque S. Ex.ª o fez muito melhor do que eu o poderia, ter feito, e daqui lhe endereço os meus cumprimentos e lhe manifesto a minha inteira concordância pelo que disse.
O Sr. Cancela de Abreu (interrompendo): - Eu regosijo-me com o apoio que as palavras de V. Ex.ª representam para as minhas considerações de há pouco. Mas não deixo passar sem protesto a frase de V. Ex.ª relativa ao valor das palavras de Ex.ª em comparação com as minhas. E, assim, sou eu que lastimo ter anteposto a minha iniciativa à de V. Ex.ª.
O Orador: - Agradeço ao Sr. Deputado Cancela de Abreu as suas boas palavras, e por estas se comprova que as virtudes e qualidades que todos lhe conhecemos junta S. Ex.ª mais a da modéstia.
Sr. Presidente: a proposta que o Govêrno trouxe à Câmara é da maior oportunidade, mostra que êle está vigilante e atento à marcha da economia nacional, e por isso não podemos recusar-lhe a nossa aprovação.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Botto de Carvalho:- Sr. Presidente: o Govêrno, por, intermédio do titular da pasta das Finanças, apresentou a esta Assemblea Nacional uma proposta de lei de autorização para emitir um novo empréstimo consolidado de 3,5 por cento. Sôbre essa proposta de lei, que vem precedida dum preambulo digno de nota pela sua concisão e pela sua perfeição, a Câmara Corporativa emitiu um parecer que, a todos os títulos, é admirável.
Na verdade a Camará Corporativa vem habilitando esta Assemblea Nacional com pareceres, como o proferido acêrca da lei de meios e êste a que me estou referindo, que hão podem deixar de ser alvo das nossas homenagens.
A forma como, no parecer da Câmara Corporativa, é estudado o aspecto técnico da projectada operação de crédito, é feita a demonstração da sua oportunidade, dispensaria nesta tribuna quaisquer comentários se esta Assemblea não tivesse uma função eminentemente política e se não houvesse, por consequência, que focar-se um aspecto político que interessa a Nação. Desde que a pasta das Finanças foi assumida por quem lhe imprimiu uma directriz certa é definida, por quem operou, a reorganização financeira do País, que constituo uma das pedras angulares da Revolução Nacional, desde que em matéria financeira se começou construindo objectivamente, criando uma situação de honestidade, uma situação de ordenado desafogo, num programa de equilíbrio em que, a pouco e pouco, a confiança se readquiriu; os capitais acorreram donde se haviam receosamente acolhido, e foi possível abandonar-se aquela situação de desordenada preocupação financeira em que os capitais chegaram a produzir o juro então normal de 18 por cento e em que o encontrar capitais era uma crescente e progressiva dificuldade.
Apoiados.
Ainda em 1929, no preâmbulo do decreto n.º 16:731 o Ministro das Finanças de então afirmava, em relação ao imposto sôbre aplicação de capitais, que nesse momento o movimento do juro era no sentido da alta e se notava a deficiência de capital disponível para satisfazer a procura. Era a consequência da desregrada e desordenada política financeira anterior.
Depois, ao readquirir-se a confiança, com o regresso dos capitais que andavam fugidios, com o estabelecimento duma política económica orientada e definida, começou verificar-se o fenómeno contrário. E nós assistimos consoladoramente à maior viabilidade o mais fácil possibili