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11 DE FEVEREIRO DE 1942 189

São colectados os lucros extraordinários de guerra e não outros.
E entendeu-se por lucros extraordinários os que excedam em mais de 15 por cento os correspondentes à contribuição industrial.
É natural que parte do comércio ou da indústria esteja a pagar uma contribuição industrial inferior à devida. E, neste caso, ver se-iam muitos forçados a pagar um imposto pela taxa dos lucros de guerra, quando o deveriam ter pago pela taxa ordinária da contribuição industrial. Mas então seria necessário rever-se o assunto, pois o Estado não pode ter interesse em aplicar taxas elevadas sôbre rendimentos que as não suportariam.
Talvez que a proposta de lei sõbre os lucros de guerra venha ainda a contribuir para êste são objectivo, com o qual todos terão a beneficiar.
Causou-me, porém, maior impressão o argumento de que há lucros que, bem examinados, tais se não podem considerar, pois representam apenas lucros em moeda cujo poder de compra, na renovação dos stocks, em muito deminuíu.
Parece justo considerar êste caso, que será certamente discutido quando se debater a proposta na especialidade. Deixo-o, porém, aos técnicos, pois não me sinto com suficiente competência para o tratar.
Outras considerações tenho ainda a fazer, mas reservar-me-ei para a discussão na especialidade.
Por agora dou o meu inteiro apoio nu generalidade à proposta governamental, convencido de que o imposto sobre lucros de guerra, além de ser um imposto justo, é um poderoso meio de corrigir a anomalia social que vem a ser poderem enriquecer alguns, sem nada para tal terem feito além de aproveitar de um estado de cousas que é fruto de muita e inenarrável tragédia que vai por êsse mundo fora e que também, em pequena parte embora, já entrou cá dentro das nossas fronteiras.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Carlos Mantero: - Sr. Presidente: não é dado ao homem de Estado ignorar as realidades para assentar a sua acção no mundo efémero das ilusões.
No campo restrito cem que nos cinge o debate, esta verdade impõe-se em toda a sua extensão.
Os lucros extraordinários de guerra devem ser tributados por quatro ordens de motivos - morais, económicos, fiscais e políticos.
Tem sido orientação constante do Estado Português conservar a Nação tanto quanto possível imune dos malefícios da guerra. Mal havíamos transposto o limiar desta trágica época, quando o Chefe do Govêrno, ao enunciar os princípios que haviam de guiar o Estado, verberou, com a calma das suas fortes convicções, o espirito de lucro que amealha tesouros sôbre tumbas, escarnecendo dos sofrimentos que gera.
Condenado no campo moral pelo Estado e, acima dêle, pelas consciências, como se compreende que, mesmo assim, o lucro de guerra seja reconhecido pela lei? A lei permite-o deminuído, reduzido a proporção justa, por razões de ordem puramente económica, porque êle é o prémio pago à iniciativa privada com o fito de estimular a produção num período de desequilíbrio acentuado entre a produção e o consumo, quando a produção escasseia e os consumos se desbordam.
Mas se a ética o repele e a economia o tolera, a finança pública, intervindo a meio caminho, quási o acarinha. E que êle lhe pode dar farta receita sem agitar as camadas fundas da economia nacional, sem afectar as fontes essenciais da receita pública. É, por excelência, a contribuição directa menos susceptível de ser retransmitida, e atinge um número limitado de contribuintes.
Assim se explica o conflito de ideas e de sentimentos que o lucro de guerra levanta.
Sr. Presidente: o Govêrno apresentou a esta Assemblea uma proposta de lei criando o imposto sôbre os lucros extraordinários de guerra. Não se pode, em verdade, acusar o Govêrno de ter andado precipitadamente. Com efeito, êle foi paciente, não interveio logo, quis assegurar-se primeiro, por forma indiscutível, da existência de lucros de guerra, e só agiu quando estes eram evidentes e estavam atingindo, em certos casos, proporções que excediam a justa medida da sua função económica.
A proposta do lei tem dado aso a acaloradas discussões e profundas divergências, de que o parecer da Cãmara Corporativa é a expressão mais autorizada.
Há no fundo destas divergências uma verdade comum que ressalta, talvez vagamente sentida - o empobrecimento nacional. Com efeito, por mais estranho que isto pareça, esta guerra, com os seus altos preços, com os seus lucros fabulosos, com as suas serras de notas, tem consumido a riqueza nacional.
O nosso capital flutuante, o stock do mercadorias, está desfeito.
Em contrapartida da riqueza perdida, os depósitos nos bancos aumentaram. As mercadorias sumiram-se na voragem dos consumos acrescidos, ou trocaram-se por ouro o por moeda estrangeira, e estes por notas do Banco de Portugal; ouro, cambiais o notas inconvertiveis em novas mercadorias, na sua maior parte.
Não vi nunca um cálculo dos stocks de mercadorias do País. Portugal é tanto um país de comerciantes como de agricultores. Comerciar é vocação nacional. A nossa história responde por esta afirmação. O português emigra para comerciar, não se expatria para lavrar. Por isso eu creio que a parte da riqueza nacional que cabe ao comércio è mais elevada do que geralmente se pensa; penso que em tempos normais os stocks de mercadoria são proporcionalmente maiores aqui do que em muitos países mais ricos do que o nosso. Está no jeito do português possuir mercadorias. Dêste espirito de providência derivou, em grande parto, a solidez da nossa economia. Muito do que se poupou em séculos aqui se acumulou em mercadorias, que, por vezes, afogaram o mercado em crises prolongadas, mas representaram sempre verdadeira riqueza, que nos salvou de apuros em tempos difíceis. Se a acção previdente das economias particulares durante esta guerra não foi mais longe foi porque a iniciativa privada teve, muitas vezes, de ceder o passo a organismos do hierarquia superior, onde nem sempre a previsão foi acertada e a previdência norma.
Por isso, a enorme redução sobrevinda nos stocks nacionais gravemente afectou a riqueza pública, e portanto a solidez da nossa economia.
Ficamos com menos mercadorias e mais notas, as das mercadorias e as dos capitais aqui refugiados. A situação monetária interna agravou-se pois em progressão geométrica.
Contra as notas emitidas ficou-nos ouro e moeda estrangeira. Êsse ouro e essa moeda são dificilmente convertiveis em mercadorias. Estão, praticamente, congelados. Assim se encontra a nossa acrescida circulação monetária sem representação em bens úteis. O ouro só consolida a nota quando tem poder de compra internacional e a livre disposição dos bens comprados. E assim, apesar de estritamente ortodoxa, a nossa política monetária criou um estado de cousas que tem todas as características da inflação.
São numerosos os índices que a confirmam. Os preços de retalho no continente tinham subido em Novembro