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198 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 124

Tais são as conclusões que se podem tirar da apreciação, em confronto, da nossa lei com as leis similares.
Também o nossa lei dispõe singelamente, e foi fácil verificar nas sessões de estudo como era possível tomar contacto com a própria lei e com a sua mecânica.
Ora tanto o fisco como o contribuinte, tanto o credor Estado como o devedor pelo imposto exigem e requerem simplicidade.
Todos precisam de uma ordem fácil e razoável no conhecimento daqueles fins e da mecânica, todos querem que sejam eliminados os elementos de incerteza, pois a maior parte das leis de lucros de guerra têm sido marcadas de uma complexidade inextricável. Suponho que entre nós, analisando rapidamente a proposta de lei sujeita à discussão da Assemblea Nacional, é fácil, tomar conhecimento de toda a mecânica prevista e dos seus fins.

O Sr. Melo Machado: - V. Ex.ª acha-a fácil?

O Orador: - Julgo-o. A alta dos pregos derivada da desvalorização da moeda é geral e uniforme, em certo modo lenta e segura, conforme se vê do índice geral do Boletim de Estatística e do índice particular do Banco de Portugal. Eles mostram que ela é mais reduzida do que geralmente se supõe. Por outro lado, a sanidade bancária, a capacidade exterior da moeda, a falta de inflação de crédito confirmam e garantem tal leitura.
Mas, pregunta-se: não haverá lucros de guerra?
Pois não haverá realmente lucros de guerra?

O Sr. Melo Machado: - E a lei é sôbre lucros de guerra?

O Orador: - É sobre lucros de guerra; leia V. Ex.ª particularmente a base nova da proposta. Mas, repito, não haverá realmente neste País e neste momento lucros de guerra?
Certos negócios não têm progredido espantosamente?
Não haverá mesmo novos-ricos?
Não haverá lucradores conhecidos e desconhecidos?A, que tinha o negócio mal parado e que dispõe já de cabedais imensos, não pertencerá à classe dos que ganharam com a conjuntura?
B, que tinha 100 há dois anos e que compra agora por 1:000, não terá um excesso marginal sôbre os lucros da sua classe?
Certas classes conhecidas não terão lucros excepcionais?
A lenha, o volfrâmio, o papel, a cortiça, o estanho, os adubos, o ferro, a sucata e tantos outros, quando não tenham dado a muitos, não terão realmente dado benefícios excepcionais e marginais a alguns?
Claro que os lucradores e especuladores formam minoria; maioria são, em regra, os explorados por estes!
Portanto não interessa propriamente a grande marcha dos fenómenos, quer monetários, quer de equilíbrio económico. Interessam, sobretudo, as particularidades verificadas em cada sector, aqueles negócios que fogem àquilo que é a sua lei usual. Interessam os casos concretos, os casos que o fisco e as comissões hão-de acabar por conhecer, se não sabem já o bastante.
Podem um ou dois ganhar, quando todos da mesma classe perderam. Podem ganhar os de Lisboa, quando perderam os da província, e inversamente.
Podem alguns ter possibilidades de monopólio no mercado e, por isso, tornarem-se também lucradores de guerra. Pode não aumentar o volume das transacções, pode deminuir mesmo. Podem na marcha geral não subir os preços e, entretanto, fazerem-se os maiores lucros de guerra.
Pode vender-se menos calçado, faltarem as peles; mas se se venderem os coturnos com dois ou três andares de cortiça ou madeira por 2, 3 e mais libras também aí não faltará um lucro certo de guerra.
Pode haver sobrelucro mesmo quando haja proibições e restrições, porque é naturalmente nessa altura que alguns fazem subir os seus negócios e se abalançam a ter ganhos marginais, conseguindo passar por cima de tudo.
Enfim, alguns ganham, muitos perdem, a Nação perderá mais, e será bom e justo que aqueles não ganhem tudo para si e alguma cousa devolvam à sociedade onde vivem, a qual lhes permitiu a magia de converter o sacrifício alheio em fortuna própria.
Conhecem-se as dificuldades. Como se distinguirá o sobrelucro da conjuntura do lucro usual?
Como distinguir o sobrelucro não só das vantagens aparentes como do aumento natural das actividades?
Pregunta-se mesmo:
Haverá um ficheiro dos açambarcadores, de lucros clandestinos e de negócios fraudulentos? Haverá um catálogo dos volframistas? Como se ultrapassam todas estas dificuldades? Como se resolvem os novos problemas?
E os negócios ilegais e clandestinos? Conhecerão as repartições e as comissões todos os enriquecidos fulgurantemente?
Em primeiro lugar, o legislador não pode restringir a base da contribuição, de molde a torná-la dispendiosa e infecunda - a cultura forçada não pode substituir a seara.
O legislador terá de tomar uma posição sensata e equilibrada. Estabelece limites e fixa percentagens, procurando-se desagravamentos e atenuações ...

O Sr. Melo Machado (interrompendo): - V. Ex.ª falou em atenuações?

O Orador: - Falei, sim. Leia V. Ex.ª a base III.
Procura a verdade fiscal, um tudo nada ecléctica.
Houve realmente atenuações, mas não houve privilégios de fiscais. De outra maneira criavam-se desigualados financeiras. Voltava-se ao ancien régime. Quebrava-se a igualdade jurídica. Tingia-se tudo de um absurdo maior quando o privilégio fôsse deferido às entidades mais poderosas.
E quem tem de idealizar um regime tributário há-de preocupar-se com as consequências.
Será necessário evitar que a carga passe, dos ombros do beneficiário de guerra para o comprador.
Será necessário evitar o hábito, assaz, conhecido, de vender só depois de pagar o imposto.
Será preciso evitar toda e qualquer malfeitoria sôbre os bens necessários à vida.
Portanto há que tributar os lucros de guerra, mas não me parece que esteja em causa, como alguns pensam, o nosso sistema fiscal.
Talvez fôsse idea de muita gente que haveria necessidade de reformar o nosso sistema de tributação no sentido do realismo e da personalidade. Mas não estará isso em causa. Nenhum financeiro em tempo de guerra, e, para mais, ante um conflito mundial desta amplitude, iria correr êsse risco de reformas.
Se a tributação dos sobrelucros de guerra se baseia na declaração, é porque êsse é um processo habitual e genérico considerado indispensável na técnica tributária e que funciona apenas como complemento de um sistema fiscal que já deu as suas provas. Entre a presunção e a realidade, entre índices externos e a declaração há apenas um ligeiro ajuste, um ligeiro contacto que corrige e atenua os defeitos recíprocos, as objecções respectivas e fatais a qualquer dos sistemas