16 DE DEZEMBRO DE 1943 51
de descendentes, quando iguais ou inferiores a 5.000$ em relação a cada um deles, podendo o Governo elevar este limite a 10.000$, se assim o julgar conveniente».
Esta alteração, como realização, é realmente pequena, tanto mais que ela é hipotética e eventual; no entanto, vale para nós alguma cousa, porque tudo quanto representa desagravamento das cargas tributárias do povo, ainda que como simples esperança, é para nós de importância e de interesse.
Mas essa alteração vale imensamente mais como tendência que o Governo mostra para o desagravamento deste imposto.
Até onde deve ir esse desagravamento?
No relatório das contas de 1938, o então Ministro das Finanças e hoje Presidente do Conselho, escreveu estas palavras:
«A parte este inconveniente de princípio, realmente grave, de constituir uma fracção do capital anualmente consumido pelo Estado sem que este porventura o constitua por outro, dois problemas sobretudo me preocupam neste imposto: a destruição da unidade da exploração económica que a própria morte porventura teria deixado intacta e a liquidação forçada de valores imobiliários para pagamento do imposto nos prazos curtos da leis.
Há dezenas de anos que as vozes mais eloquentes e mais autorizadas desta Assemblea mostraram exuberante, definitivamente, a ilegitimidade deste imposto.
Hoje não vale a pena terçar armas por essa causa. Julgou-a o próprio Chefe do Governo naquelas palavras lapidares que em síntese luminosa mostram todos os malefícios do imposto, no domínio dos princípios e no campo dos factos. Elas envolvem, na verdade, dois problemas: um de princípio e outro de facto. Problema de princípio: o imposto em alguns casos não incide só sobre o rendimento: toca as próprias fontes que o alimentam. Absorve o próprio capital, o que é contrário a toda a filosofia do imposto e ao melhor direito fiscal.
Problema de facto: destrói a unidade de exploração económica e força os casais à venda de bens imobiliários.
Parece-me, Sr. Presidente, que, perante estes resultados, o desagravamento deveria ser total nos pequenos casais, largamente reduzido nas médias fortunas e justo e equitativo nas fortunas grandes. Em vez disso, a lei de meios traz apenas um hipotético e miudinho desagravamento na taxa adicional aplicado à cota pessoal de 5 contos.
O Sr. Melo Machado: - Chamo a atenção de V. Ex.ª para o facto, que consta da lei de meios, de ter sido deminuída para 8,5 por cento a taxa de contribuição predial rústica no concelho de Mafra depois que vigoram nele as matrizes de cadastro geométrico. Verifica-se que o rendimento colectável dessas propriedades passou de 4:338 contos para 9:789 contos. Como esta deminuição de taxa incide só sobre a contribuição predial, veja V. Ex.ª quanto vai ser agravado o imposto sucessório pago sobre aumento de valores desta natureza.
O Orador: - Agradeço as informações oportunas de V. Ex.ª Elas vêm apenas reforçar as minhas considerações.
Perante o que acaba de ser comunicado pelo Sr. Deputado Melo Machado, nós preguntamos: porque é que o Governo não fez o desagravamento, e pelo contrário parece tê-lo agravado consideràvelmente em alguns casos?
Sr. Presidente: os povos querem sempre ter razão, e a força dos governos está em não lhes dar nenhum motivo para isso. Quere dizer: é preciso que o Poder a tenha. Que razão, tem, pois, o Governo para não fazer o desagravamento, que tantos títulos impõem?
No referido relatório das contas de 1938 afirma-se que depois de profundo estudo sobre o assunto se chego a a esta conclusão: no actual estado de cousas unia reforma radical era absolutamente impossível.
De então para cá aquele estado de cousas não melhorou; bem ao contrário, tragicamente se agravou, não só sob o aspecto económico, financeiro e social, mas principalmente sob o aspecto internacional.
Devemos lealmente confessar que a actual situação internacional criou para o Poder problemas de uma alta gravidade, muito mais importantes do que este pequeno grande problema. Somos obrigados a reconhecer que essas preocupações absorveram o Poder, obrigaram-no a intensos e exaustivos trabalhos, que nos deram um benefício que só o salário da glória é capaz de pagar e que se exprime na conservação do País numa paz digna e honrada.
Este resultado da política do Governo pode porventura explicar que só não haja praticado a reforma radical de que se falava no já referido relatório. Mas na impossibilidade do desagravamento directo poder-se-ia ter ido para o desagravamento indirecto, pela substituição do imposto. Como?
Nos últimos anos, as fontes de rendimento tem-se multiplicado espantosamente, misteriosamente. O capital do nosso tempo tomou, como o velho Proteu, as formas mais diversas, as mais imprevistas, as mais escusas.
Por elas se furta não apenas aos seus deveres fiscais mas também à sua função social. Mais: transforma essa função em actividades de desordem o perturbação, pela especulação e pela agiotagem.
Verifica-se este contraste, que seria paradoxal se não fosse monstruoso: emquanto o pequeno lavrador, que à custa de sacrifícios e de suores conseguiu fazer um pequeno património, quando a morte lhe entra em casa trazendo a orfandade e a viuvez, vê desfazer o seu sonho de educar os filhos e legar-lhes um futuro desafogado, que seria uma riqueza da Nação, afogado nas malhas do fisco, o outro, que enriqueceu pela usura, continua tranquilo a sua obra iníqua, podendo, quando a morte vem, passar intacta a fortuna que noutras mãos continua a sua obra nefasta.
Esta situação parece-me que precisa de remédio e pronto. Como? Tomando esse capital nas únicas manifestações em que elo se revela: no luxo e no vício.
Importa, por isso, que com urgência se realize uma política fiscal, prática e progressiva, sobre matéria sumptuária, isto é, sobro todas as formas de consumo sem compensação alguma: luxo, no sentido vulgar do termo, álcoois, espectáculos inúteis, etc.
Essa política daria ao Governo recursos necessários para se ressarcir da deminuição de receitas resultante do desagravamento do imposto sucessório.
Estaria assim assegurada a defesa dos pequenos casais? Creio que não. Salazar chamou à reforma radical do imposto sucessório um «feixe de problemas».
E na verdade a questão é mais vasta e mais complexa.
Ainda que nós tivéssemos conseguido um desagravamento total, o problema não estaria resolvido.
Nesta questão, o que interessa, além da obediência aos princípios, é a conservação, a defesa dos pequenos lares, dos pequenos patrimónios, que são sempre fontes de riqueza económica e demográfica, poderosos pilares de equilíbrio e da ordem social.
Ora, Sr. Presidente, para proteger eficazmente esses pequenos lares não basta suprimir totalmente o imposto sucessório.
O imposto sucessório, em boa verdade, não opera unicamente por si mesmo; quando aparece, traz sempre