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15 DE MARÇO DE 1944 217

Estou em boa companhia dizendo isto porque o Sr. Presidente do Conselho afirmou um dia que as leis verdadeiramente fazem-nas os homem que as executam.
Não há muito que dizer nesta tribuna sôbre o problema da assistência, porque, em boa verdade, neste parecer os assuntos primordiais desse problema foram tratados e focados com inteligência e saber invulgares. De resto, não temos de que nos admirar que assim tivesse acontecido, visto que o parecer da Câmara Corporativa se encontra subscrito por algumas das maiores figuras morais e intelectuais da nossa terra.
É um estudo profundo da matéria em análise. Não são palavras de lisonja; as minhas palavras correspondem à verdade. De resto, habituei-me, desde sempre, quanto às pessoas vivas, a empregar poucos adjectivos, porque tenho receio, por vezes, de me arrepender.
É que, Sr. Presidente, os adjectivos empregados às pessoas sem conta nem medida são como que a chave falsa com que muitos medíocres e insignificantes entram nas Academias, com que muitas pessoas sem honra, sem brio e sem dignidade entram no convívio e intimidade das pessoas de bem.
Assim, as minhas palavras, referindo-se, quer ao Govêrno, quer às pessoas que subscrevem o parecer da Câmara Corporativa, não podem ser consideradas como palavras de lisonja.
De resto, eu quero viver tranquilo e sossegado na paz da minha consciência, sem jamais ter lisonjeado fôsse a quem fôsse.
A assistência, Sr. Presidente, é um dever social. Porém, por maior que seja o amor do próximo, nada se faz sem que se obedeça a um plano previamente estudado e elaborado. A assistência sem um plano é a desordem. A assistência exercida sem obedecer a um plano geral dispersa as actividades, sendo o seu rendimento nulo ou quási nulo.
É, pois, evidente a oportunidade da proposta, que é, no fundo, um plano de assistência.
É evidente que a elaboração desse plano pertence ao Estado.
Segundo a Constituição, o Estado tem o dever, tem a obrigação de assistir a todos aqueles que careçam da sua assistência. Isto deduz-se clara e expressamente dos artigos 6.°, 14.° e 40.° da Constituição.
Com efeito, o artigo 6.° da Constituição consigna no n.° 3.° que incumbe ao Estado «zelar pela melhoria de condições das classes sociais mais desfavorecidas, obstando a que aquelas desçam abaixo do mínimo de existência humanamente suficiente».
O artigo 14.° diz assim: «Em ordem à defesa da família, pertence ao Estado e autarquias locais: 1.° Favorecer a constituição de lares independentes e em condições de salubridade e a instituição do casal de família; 2.° Proteger a maternidade; 3.° Regular os impostos de harmonia com os encargos legítimos da família e promover a adopção do salário familiar; ...».
E ainda o artigo 40.° determina: «É direito e obrigação do Estado a defesa da moral, da salubridade, da alimentação e da higiene pública».
Sendo os problemas da assistência social de verdadeiro interesse nacional, fundamentais para a vida das nações e dos povos, é evidente que os princípios consignados na Constituição são os únicos que se harmonizam com uma boa e sã doutrina.
A importância do assunto, dada pelos factos e pela Constituição, bem explica, Sr. Presidente, a existência de um Ministério próprio, preconizada pela Câmara Corporativa na base XVI do seu parecer.
Realmente a complexidade do problema e a sua magnitude explicam a criação de um Ministério que exclusivamente se consagre a todos estes problemas da
assistência, passando para êle todos os serviços que andam dispersos pelos vários departamentos do Estado.
Apoiados.
Êsse Ministério seria o órgão coordenador de toda a actividade assistencial do País.
Em todos os distritos (e não falo nas províncias, porque, por um lado, a sua extensão quási fazia com que o órgão não tivesse eficiência e, por outro lado, são raras as regiões do País em que a província corresponde a uma realidade viva de interesses idênticos o harmónicos) haveria um órgão coordenador da actividade assistencial que estivesse, Sr. Presidente, intimamente ligado - em ligação de toda a ordem - com o órgão coordenador central: o Ministério que eu preconizo.
Além disso, em cada concelho, e ligado ao órgão coordenador distrital, haveria um órgão concelhio, que fôsse a base da actividade assistencial do concelho.
Entendia que êste órgão coordenador distrital devia ser presidido pelo governador civil, o representante do Govêrno, e o órgão concelhio fôsse presidido pelo presidente da câmara, também representante do Govêrno.
Todos entendem que há necessidade de um órgão coordenador; entende-o o Govêrno na sua proposta de lei e entende-o a Câmara Corporativa no seu parecer.
Mas quer o Govêrno quer a Câmara Corporativa desejam que êsse órgão coordenador sejam as Misericórdias.
Não nego, Sr. Presidente, às Misericórdias a sua grande importância e a sua grande tradição histórica. Entendo, porém, que o órgão coordenador deve estar acima das diversas instituições de utilidade pública e das diversas instituições piedosas e de beneficência; entendo que deve ser um órgão independente que trabalhe acima destas instituições.
É que - e isto é humano -, se a coordenação fôsse exercida por certa e determinada instituição, êsse órgão coordenador coordenava-se a si próprio, mas esquecia-se das outras actividades assistenciais. A vaidade dos homens, que é um dos grandes males do mundo, mas que é uma realidade que todos conhecem e não pode ser desconhecida dos homens públicos, leva, Sr. Presidente, na ânsia de fazer mais e melhor, essa actividade coordenadora a lembrar-se só de si e a esquecer-se dos outros.
Há um concelho no País em que as diversas pessoas colectivas de utilidade pública e instituições piedosas se ligaram, formando um centro de informação social, em que está coordenada a acção de todas essas instituições. Sem prejuízo da autonomia e da individualidade própria, todos se associaram para realizar uma obra de coordenação da actividade assistencial exercida por uma delas.
Tem êste centro um conselho geral, que é composto pelos presidentes de todas essas instituições, e uma comissão executiva eleita pelo mesmo conselho geral.
Há no centro assistentes e visitadoras, que fazem os seus inquéritos quer aos indivíduos, quer aos agregados familiares, inquirindo dos males físicos e morais, quer de uns quer de outros.
Em resumo: há ali uma actividade assistencial coordenada em auto-coordenação.
Se fôsse possível estender ao País a orgânica desse sistema, estou convencido, Sr. Presidente, de que os resultados seriam bons; estou convencido, pelos factos que apontei e ainda pelo que sei, visto que administro casas de assistência e caridade há mais de trinta anos, de que bons frutos se colheriam de tal sistema.
Um plano de assistência social implica um considerável aumento de despesa.
Ainda há dias eu tive nas mãos um livro de Piccinnini, professor da Faculdade de Medicina de Nápoles - Defesa da Saúde Humana nos Estados Unidos da América -, que trata com um carinho verdadeiramente notável êste assunto; e de tal forma que há muitos problemas que