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3 DE ABRIL DE 1944 371

revestir do conceito de meio de defesa social, de readaptação ou eliminação dos delinquentes.
Da repulsa do criminoso e da sua inutilização social, olhando apenas ao aspecto repressivo da pena, passou-se ao conceito oposto, do possível aproveitamento do delinquente como valor social, pelo processo curativo de regeneração a que se submeta, tudo rodeado das medidas de segurança necessárias.
Êste o critério da chamada individualização da pena, considerado no crime o homem e como tal tratado cuidadosamente para uma readaptação ao meio social cuja ordem jurídica violou. E como os homens variam de uns para os outros, nos seus impulsos físicos psíquicos e sociais, várias têm de ser também as sanções a aplicar e o tratamento a seguir, deixando assim o crime de ser considerado objectivamente, sujeito, na respectiva sanção, a uma medida matematicamente certa, para se atender à personalidade do homem delinquente, do autor do facto delituoso.
Esta a doutrina hoje dominante, mesmo entre os que não seguem as doutrinas positivistas.
É o novo conceito da pena, derivado da responsabilidade moral, pena baseada no estado perigoso, como se vê no livro de Gunzburg, Les transformations récentes du droit penal, quando se ocupa da «Responsabilidade e defesa social» em capítulo próprio.
As medidas de segurança dependem pois do grau do pericolisidade do delinquente, medidas a aplicar post-de-lito, e portanto não podendo considerar-se medidas de prevenção, como as medidas de policia e assistência social, todas anteriores ao delito, como muito bem expõe num brilhante ensaio sôbre o assunto o Dr. Fernando Braz Teixeira, ao tempo laureado aluno do curso complementar de ciências jurídicas, ao refutar a doutrina contrária.
Bem longe estamos pois do conceito clássico da pena, a que um dos mais fervorosos adeptos da escola positiva (Robinowiez) se refere nestes irónicos e desdenhosos termos, que acho interessante aqui reproduzir:

«O momento está próximo em que a pena clássica, como as velhas diligências, encontrará o seu lugar num canto obscuro do museu de antiguidades para o ensino e a curiosidade das gerações futuras.
E a importância capital das medidas de segurança reside precisamente neste facto - de que elas precipitam o processo de desaparição da pena clássica, minando-lhe a base.
Observadas sob êste ponto do vista, elas constituem uma verdadeira fôrça explosiva que fará saltar o edifício carunchoso da justiça penal clássica.
É aí que reside o seu carácter dinâmico e revolucionário - mesures de sûreté».

Também nos convencemos da possibilidade de no futuro a evolução se dar nesse sentido - a pena ser substituída, pura e simplesmente, pelas medidas de segurança.
Da teoria da retribuição e da intimidação, que representam a concepção liberal do direito individualista, passou-se à teoria da prevenção e reforma dos criminosos, numa nova tendência - a tendência social - do direito penal.
Radrebuch, na sua Filosofia do direito, assinala também essa evolução, salientando como característico no direito social, em contraposição com o direito individualista, «não ser êle um direito recortado sôbre o modelo de um indivíduo isolado e abstracto (pessoa ou agente), mas sôbre a verdadeira e concreta individualidade nas suas bem vivas ligações com a sociedade» (tradução do Prof. Cabral Moncada).
E mais abaixo esclarece nestes termos:

«O novo direito penal foi assim colocado debaixo deste lema: não o crime, mas o criminoso». É como se disséssemos ainda: não o criminoso, mas o homem! O homem real e concreto, com todas as suas qualidades psicológicas e sociológicas, entra assim, desta vez, para dentro do ângulo de revisão do direito.
Sob o prisma desta nova teoria da prevenção e reforma penal, o conceito de agente do crime passa a dissolver-se podemos dizê-lo numa multiplicidade de tipos caracterológicos e sociológicos, tais como: os de criminoso habitual, ocasional e passional; os de reformáveis e irreformáveis, de maiores e menores delinquentes, os susceptíveis de uma plena imputação e os semi-responsáveis, etc.
E o distinto professor de Heidelberg comenta, concluindo:
«Assim se justifica plenamente que a esta nova escola penal se tenha dado a designação de «escola sociológica», pois foi devido à adopção desse prisma que, emfim, certos factos que até aqui só pertenciam à sociologia penetrassem por sua vez no mundo do direito».

Esta, pois, a doutrina corrente entre os tratadistas do direito penal, quer utilizem ou não o conceito de relação jurídica punitiva que o professor Cavaleiro Ferreira considera de manifesta vantagem (Lições ao curso de 1940-1941), quer se ocupem do assunto com referência ao direito de punir, ou seja simplesmente o investigar dos fundamentos racionais desse poder político.
O carácter punitivo da pena, que ela envolve necessariamente, não invalida o conceito de reforma e regeneração do criminoso em que assenta o princípio da individualização, e antes se lhe deve reconhecer a primazia, para que se evite de futuro da parte do mesmo agente nova violação do direito.
No entanto parece hoje renascer o carácter intimidativo da pena nas novas concepções do direito penal fascista e soviético, de defesa do Estado ou da comunidade, o que Radrebuch chama o direito penal terrorista, ambos baseados num direito autoritário manifesto, embora afastados um do outro no sistema político e conceito social que os inspira.
A concepção fascista que o código penal de 1930 consigna acha-se, expressa nestas palavras de Alfredo Rocco, a quem se deve essa grande reforma, no relatório do código:
«O direito de punir não é, pelo contrário, secundo a concepção fascista (que nisto se acolhe à tradição de Romagnosi e de Carmignani, prosseguida, porém, algumas vezes, com evidentes exageros pela escola criminal antropológica) senão um direito de conservação e defesa próprio do Estado, análogo mas substancialmente diverso do direito de defesa do indivíduo e tendo por fim assegurar ou garantir as condições fundamentais e indispensáveis da vida em comum».
Não alonguemos mais a exposição da doutrina, pois não me proponho fazer uma dissertação em lugar que a não comporta e com a carência de competência que me reconheço.
Quis apenas, numa rápida visão panorâmica do problema, expor os novos princípios da ciências penal e do conceito da pena, justificativos da economia da proposta em discussão.
Sr. Presidente: uma vez assente o princípio da individualização e das medidas de segurança ide que deve rodear-se o delinquente, segurança própria e segurança da sociedade, logicamente se impõe a necessidade de uma intervenção durante o cumprimento da pena, adaptando-a a caída criminoso, conforme o grau de pericolosidade ou perigosidade que revela, as suas características pessoais e particularidades intrínsecas do acto criminoso, modificando, portanto, a pena ou alterando-a, deminuindo-a ou prorrogando-a, conforme as necessidades