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370 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 74

ximado de 6:900 presos, sôbre os quais pode vir a actuar o novo juízo de execução da pena.
Parece que este volume poderia, na verdade, exigir um organismo complexo como propõe ã Câmara Corporativa; mas ao apresentar esse número não se quere dizer que todos estes presos de difícil correcção, vadios, condenados a pena maior e condenados ia prisão correccional superior a seis meses, sejam necessàriamente objecto dessa jurisdição.
E, se compararmos estes elementos com os casos submetidos, na verdade, à apreciação do Conselho Superior dos Serviços Criminais no ano de 1943 em todas aquelas matérias que passam agora, por virtude da proposta do Governo ou das alterações sugeridas pela Câmara Corporativa, a ser apreciadas pelo juízo da execução da pena, nós vemos muito reduzido aquele número, a tal ponto que somos levados a crer que a solução proposta pelo Governo é de momento suficiente para resolver os casos que podem vir a ser afectados à competência desse juízo.
Na verdade, os casos efectivamente submetidos à apreciação do Conselho Superior dos Serviços Criminais no ano de 1943 foram:
Classificação de presos de difícil correcção, 9; propostas de liberdade condicional (concessões, recusas e revogações), 593; prorrogação de penas, 131; liberdades definitivas, 50; escolha da espécie de pena nas penas maiores variáveis, 386; aplicação do regime de prisão escola, 31; aplicação do regime de asilo prisão, 1; concessões de trabalho fora das prisões (individuais ou em levas), 15; várias decisões e transferências, em casos especiais, 14; processo de indulto, 313; decisões proferidas sobre pedidos de cancelamento do registo criminal, 121. Número total de decisões ou pareceres do Conselho Superior dos Serviços Criminais proferidos sobre os diferentes casos sujeitos à sua competência jurisdicional no ano de 1943, 1:664.
Nestas condições, estes números são, por si só, suficientes para justificar, repito, como boa a solução apresentada a esta Assemblea na proposta do Governo no tocante à criação do juízo de execução da pena.
Sr. Presidente: a hora vai já muito adiantada e eu não quero por isso prender mais a atenção da Assemblea com o exame de outros elementos, de que poderia dispor, e que justificariam, como preferível, a solução que se contém na proposta do Governo quanto à organização daquele juízo, sendo certo que esta proposta não é mais do que o prosseguimento de uma acção no campo da política criminal que tem merecido não só o elogio dos portugueses, como também a admiração dos estrangeiros.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Querubim Guimarãis: - Sr. Presidente: a economia da proposta presente à nossa apreciação está largamente fundamentada no elucidativo relatório que a precede e em que o Sr. Ministro da Justiça desenvolve os pontos de vista doutrinais sob os quais ela pode ser encarada, as divergentes opiniões dos penalistas, o conceito actual da pena e do direito de punir e os pontos de vista adoptados pelas legislações mais recentes, nomeadamente os códigos penais italiano, espanhol e brasileiro, todos inspirados na moderna orientação da ciência criminal.
A par dessa exposição de doutrina que precede a proposta, o trabalho da Câmara Corporativa-como sempre perfeito e completo, com a intervenção no longo e brilhante parecer, além de um ilustre pedagogo e professor de medicina e de um distinto magistrado, de seis distintos professores de direito, entre eles o autor da reforma prisional de 1936, onde se estabelecem já os princípios e as directrizes que informam a proposta -trabalho esse que é, sem contestação, um dos maiores títulos de honra que assinalam o insigne reformador na sua passagem pela pasta da Justiça -, e a sen lado dois professores especializados na matéria, os Drs. Paulo Cunha e Marcelo Caetano, ambos, se não erro, tendo regido cursos de direito penal-põe-nos diante dos olhos, em complemento, o panorama actual do problema que é objecto da proposta - a jurisdicionalização do cumprimento das penas e das medidas de segurança e a rehabilitação dos delinquentes -, os dois problemas actuais que maior interesse têm despertado no campo da ciência penal.
Desejo aqui muito especialmente destacar o nome do ilustro relator do parecer, que dêste lugar saúdo respeitosamente, como mestre notável na velha Universidade de Coimbra, cujo saber e brilho de inteligência recordo com admiração e cuja acção nos tribunais internacionais do Egipto tanta honra e prestigio deu ao nosso País.
Apesar do seu afastamento, pela fôrça das circunstâncias, das lides universitárias e do contacto com o estudo obrigatório da ciência penal, elaborou um relatório, cuja proficiência, clareza, brilho da exposição e dedução lógica da doutrina se impõem à nossa admiração.
Sr. Presidente: a questão da jurisdicionalização do cumprimento das penas -vocábulo aquele de certa complexidade morfológica mas, no fundo, de simples conteúdo - resume-se em saber se a pena, na sua execução, deve limitar-se a um puro acto da Administração ou se, pelo contrário, deve estar adstrita a uma jurisdição própria, especial ou comum, função de um tribunal especialmente designado para esse efeito, ou encargo atribuído ao próprio tribunal de condenação.
A jurisdicionalização, afinal, é, como diz a proposta, a intervenção do juiz no cumprimento da pena.
O problema tem-se agitado em congressos - citam-se no relatório três: o de Londres (1925), o de Palermo (1933) e o de Berlim (1935); na doutrina, na discussão entre os sectários das escolas penais - os adeptos da escola clássica, de que foi chefe insigne Garrara, e hoje ainda defendida pelos neo-clássicos Del Giudice, Massari e Arturo Rocco, por um lado, e os positivistas, da escola que chefiaram Lombroso, Garofalo e Ferri, por outro; e nas legislações de alguns países - além dos já citados, o código suíço, o polaco, etc.
Funda-se o problema da jurisdicionalização nestes dois motivos determinantes a que alude o relatório da proposta: o princípio da individualização da pena e o princípio da adopção de medidas de segurança.
Sr. Presidente: na evolução do direito penal cada vez mais nos vamos afastando do conceito clássico da pena, que informou a grande maioria das legislações penais do século passado.
Já lá vai o tempo em que o fim do direito penal era reintegrar a ordem jurídica violada, e a pena tinha apenas um carácter punitivo ou retributivo, expressão jurídica da vindicta social, castigo imposto ao delinquente pelo acto praticado violador da ordem constituída, considerado o crime em si próprio e não quanto à pessoa do agente - uma medida punitiva certa para determinado crime, pena proporcionada ao crime qualitativa e quantitativamente, o direito penal quási uma ciência matemática, como chegou a afirmar a Câmara.
A escola positiva veio rasgar à ciência penal horizontes novos e fez surgir o homem delinquente, o agente do crime, na sua predisposição, inclinações e tendências, nos seus precedentes pessoais e hereditários, físicos, morais e psicológicos, deixando de atribuir à pena simplesmente o seu carácter punitivo ou retributivo para a