418 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 81
Tem a palavra antes da ordem do dia ò Sr. Deputado Froilano de Melo.
O Sr. Froilano de Melo: - Sr. Presidente: acabo de receber da Índia -e suponho que mais alguns camaradas nossos o receberam também- o seguinte telegrama:
«Despacho governador dia 24 foi suspenso Heraldo dois anos abrigo decreto 27:495 artigo 70.º virtude artigo criticando preambulo orçamento. Foi prémio inalterada orientação lusófila mantida jornal durante quarenta anos. Rogo intervenção urgente junto Ministro a fim não homologar decisão governador sem conhecer artigo visado. Segue avião. António Maria da Cunha».
E o próprio facto de o telegrama ter sido expedido da estação inglesa de Belgão já mostra a tensão que esta medida provocou em Goa.
Não faço a mínima ideia de que matéria criminosa ou subversiva trataria esse artigo do Heraldo para provocar punição tão violenta. O Heraldo é dirigido por um indo-português dos mais ilustres, gentleman na máxima acepção da palavra, de um portuguesismo nunca desmentido através da sua longa carreira de médico militar e de jornalista é que seria incapaz de uma incorrecção, que não condiz nem com a sua avançada idade nem com a nobreza da sua linhagem, das mais altas de Goa, e cuja primorosa educação familiar e social Lisboa pode rever em alguns dos seus membros que ocupam lugares de destaque na sociedade intelectual portuguesa contemporânea.
Nem compreendo como para acudir a esse pungente S. O. S. que contém a parte final do telegrama terá S. Ex.ª o Ministro das Colónias de desenvolver prodígios de energia e de tacto a fim de sanar esse conflito, em que se encontra de um lado o delegado do Governo, que é necessário prestigiar, e do outro quase toda a população católica e pró-portuguesa de Goa, que é conveniente não melindrar.
E um tal incidente no momento em que nós em Portugal, dentro e fora do Parlamento, procuramos limar arestas, atrair almas, reconquistar corações! Porque o Heraldo - e é sob este ponto de vista que o caso me interessa-, conquanto não seja um jornal político, é, pela sua compostura e correcção, o guia e o porta-voz da população cristã, e pró-portuguesa da nossa índia. A desolação que sinto ao antever a ironia com que essa notícia terá sido glosada nos meios antiportugueses de Bombaim e outras cidades indianas!
Não posso nem devo, porém, antecipar juízos. E por isso requeiro que, pelo Ministério das Colónias, me sejam fornecidos com urgência todos os esclarecimentos sobre esse incidente lamentável, que, desde já vos digo, e pesando bem a responsabilidade das minhas palavras, no momento que passa é politicamente um verdadeiro desastre.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Sr. Carvalho Viegas: - Sr. Presidente: nesta ocasião, em que se encontra na Guiné o Sr. Subsecretário de Estado das Colónias para assistir ao encerramento das comemorações centenárias do descobrimento daquela colónia e à abertura solene da II Conferência Internacional dos Africanistas Ocidentais, VI gostosamente nos jornais que S. Ex.ª o Sr. Presidente da República agraciara, a título póstumo, com a grã-cruz da Ordem do Império o herói da Guiné major João Teixeira Pinto.
E eu, que tenho o grande orgulho de representar nesta Assembleia essa colónia, que, de todas do nosso actual Império, foi a primeira a ver o sangue português regar-lhe a terra, então duramente inóspita e hostil, que foi um terreiro de heroísmos em pugnas constantes com o seu aguerrido gentio, sempre rebelde a toda a tentativa de reconciliação, não posso deixar de afirmar, como conhecedor da elegância moral da sua população civilizada e ainda dos sentimentos por Portugal da sua população nativa, que esse rincão do nosso Império, neste momento da sua já secular história, traçará mais uma página do honra recebendo galhardamente, em frémitos de bom patriotismo, o representante do Governo da Nação.
Não me foi possível acompanhar S. Ex.ª à colónia que me elegeu seu Deputado, onde diria que esta Assembleia, composta de individualidades de todo o Pais, individualidades de alto relevo moral e mental marcante na sociedade portuguesa, nunca deixou de mostrar a maior consideração e admiração por essa terra do ultramar que apresenta homens seus inspirados no mais alto ideal da pátria portuguesa, tais como, entre muitos outros, o grande governador Honório Pereira Barreto, o expoente máximo de assimilação nossa, Domingos de Araújo, sempre pronto a oferecer a sua vida por Portugal, até que por ele a perdeu, Lamine Injai, que, para salvar a bandeira - a nossa-, se sacrificou no altar das nossas glórias.
A projecção do patriotismo português de Honório Pereira Barreto -homem de cor mas de alma bem branca, que ofereceu a totalidade do seu sacrifício por Portugal, não só dando grande parte da sua fortuna pessoal como até consumindo a sua vida num labutar constante pela nossa nacionalidade, quer repelindo as afrontas e ambições absorventes de estranhos, quer submetendo revoltas do gentio, quer dignificando todos os sectores da administração portuguesa- foi tal que no gabinete do governador existia o seu retraio em tamanho natural, para que todos que ali entrassem sentissem a sua irradiação moral comunicando-lhes a obrigação de trabalharem naquela terra com tanta isenção, dedicação e patriotismo como aquele natural da Guiné, que se tinha devotado a bom servir e honrar Portugal.
Foi pena que o duro clima da. Guiné não aconselhasse a ida ali de S. Ex.ª o Sr. Presidente da República, nessa ocasião em que todos nós, com o coração em sobressalto, temíamos o agravar da sua doença, que, felizmente para todos, já passou, para que, mais uma vez, a população da Guiné pudesse proclamar bem alto a sua admiração, a sua dedicação patriótica e confiante pelo nosso venerando e venerado Chefe do Estado, cujo subtil tacto político, vontade espiritual inata o acrisolado patriotismo souberam vincular, desde a primeira hora, a integração espiritual da Nação inteira, dos portugueses de boa vontade e de sã consciência, nos altos princípios da Revolução de Maio.
A Guiné, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é um testemunho bem seguro de quanto podem o amor pátrio e a fé, é ela toda uniu. página de ouro da nossa história, como é neste momento uma prova segura do ressurgimento do nosso ultramar.
No último número da Revista Militar, em um dos seus artigos, preconiza-se que se convide «alguém de mérito reconhecido para que faça desfilar perante nós essas figuras que ofereceram a sua, vida a bem da nossa «Grande Causa», não se permitindo que o tempo lance no esquecimento aqueles homens que construíram. as balizas do Império, cujos actos documentam a grandeza da Raça, na História do Mundo».
S. Exa. o Sr. Presidente da República condecorando esse bravo que se chamou Teixeira Pinto começa já por consagrar a sua memória j nivelando-o com os melhores pioneiros da colonização portuguesa, inscrevendo-o no quadro de honra dos heróis de Portugal.
Foi feita justiça a esse oficial, esse grande português, que sempre honrou o exército e lhe acrescentou glórias, realizando com a sua valentia; coragem e abnegação