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30 DE JANEIRO DE 1947 421

elas estão já por tal forma sobrecarregadas, elas têm já tantos encargos a satisfazer, que não me parece nem justo nem oportuno que só lhes deixe ainda mais o encargo da instrução.
As receitas, por exemplo, duma junta de província são tão exíguas o limitadas que não dão para satisfazer de forma alguma as atribuições que lho são imputadas pelo Código Administrativo.
Na verdade, o Código Administrativo imputa-lhes funções de assistência, de cultura e de fomento e coordenação económica. Mas tem de reconhecer-se que o volume total das suas receitas não dá já para atender só uma destas modalidades da sua actividade, quer a assistêncial, quer a de cultura, quer a de fomento o coordenação económica.
Tenho para mim opinião formada de que na verdade as juntas de província podem desempenhar uma função importante na vida do País, sobretudo na coordenação, na orientação e na conexão entre todas as actividades da província.
Mas para isso é preciso que se modifiquem as correspondentes disposições do Código Administrativo.
Haveria ainda na generalidade um ponto que desejaria tocar, embora pareça que isto é já intrometer-me com o campo da especialidade: será o do ensino agrícola, designadamente o ensino feito e o regime adoptado nas escolas de regentes agrícolas. Impressionam os números que já aqui foram apontados sobre a frequência do ensino agrícola e até mesmo das escolas de regentes agrícolas, porque num país que se diz essencialmente agrícola são porventura estas as escolas menos frequentadas.

O Sr. Carlos Borges: - Também não podem ser muito frequentadas, porque é caríssimo o ensino; é só para gente rica.

O Orador: - Ora eu ia a dizer exactamente o que o Sr. Dr. Carlos Borges acaba do afirmar. O regime que se adopta, de internato, nas escolas de regentes agrícolas veio, a meu ver, dificultar a frequência dessas escolas. A Escola de Santarém diplomou até hoje muitos regentes agrícolas, que trabalham, pode dizer-se, em quase todos os organismos económicos do Estado. E trabalham de maneira a honrar a sua classe, a dignificá-la, mostrando-se aptos para as funções que lhes são atribuídas, cumprindo-as com zelo, dedicação, devoção e espírito de disciplina. Trabalham regentes agrícolas na Junta de Colonização Interna; trabalham regentes agrícolas na Junta Nacional do Vinho; trabalham regentes agrícolas na Janta Nacional dos Produtos Pecuários; trabalham regentes agrícolas em quase todos os organismos de coordenação económica que hoje existem em Portugal.
E dentro do funcionamento desses organismos pode ver-se que os regentes agrícolas são do funcionalismo que melhor serve. O trabalho por eles realizado na Junta de Colonização Interna e na Junta Nacional do Vinho, organismos que mais de perto conheço, é apreciado e estimado pelos seus superiores hierárquicos pelo seu magnífico rendimento. E isto corrobora a afirmação que aqui fiz: é que esses regentes saíram do famílias que sentem a dureza da vida, que sentem a necessidade de conquistar a vida, que sentem a necessidade de trabalhar e que anseiam por se elevar e se dignificar.
Mas é certo, Sr. Presidente, que, tal como está organizado o ensino e tal como funcionam as escolas agrícolas, no regime de internato, que pode na verdade ter superiores vantagens na formação dos rapazes, essas escolas tornam-se inacessíveis precisamente para as classes que mais se dirigiam para esses cursos.

O Sr. Carlos Borges: - Apoiado!

O Orador: - Esses rapazes não querem o curso simplesmente para terem um diploma ou para terem uma posição de mais destaque, mas sim para conquistarem um meio de ganhar a sua vida pela especialidade a que se dedicam.
Os frequentadores dessas escolas saíam dos filhos dos pequenos agricultores, saíam dos filhos de famílias modestas que viviam junto das escolas, saíam até dos filhos de homens de modesta profissão, como sejam os condutores de automóveis, os chauffeurs de praça, que à custa do seu trabalho o muita dedicação conseguiam que os seus filhos frequentassem e tirassem o curso de regentes agrícolas.
E evidente que hoje a toda essa gente, a toda esta fonte de recrutamento de regentes está vedado para os seus filhos tirar esse curso. Porquê? Porque o regime de internato, com as inerentes despesas a que obriga, está fora das suas possibilidades.

O Sr. Marques de Carvalho: - A proposta prevê um largo regime de bolsas precisamente para pagar o internato àqueles que se reconheça podem vir a ser um valor social útil.

O Orador: - As bolsas e os patronatos não são um meio tão acessível e tão apropriado nem ao alcance do todos, e quando digo ao alcance de todos digo no conhecimento do todos os que desejariam frequentar esses cursos.

O Sr. Carlos Borges: - A verdade é que só os ricos podem ser recebidos nessas escolas.

O Orador: - Dantes havia famílias que se deslocavam para as cidades onde existiam essas escolas e aí arranjavam uma maneira qualquer de ganhar a vida, precisamente para que os seus filhos saíssem das casas onde se encontravam instalados.

O Sr. Marques de Carvalho: - Mas isso, além do mais aumentaria o mal do urbanismo. Seria mais gente a sair das suas aldeias para as cidades.

O Orador: - Tudo isso, teoricamente, está certo. Simplesmente, aos homens que vivem nas aldeias, às famílias que vivem nas aldeias, que nelas trabalharam durante gerações sucessivas, chega um momento em que sentem a necessidade e a legítima aspiração de se deslocarem para a cidade, para darem rumos novos aos seus filhos e nova orientação à sua vida.
Não são esses os que vem agravar o fenómeno do urbanismo. Esses vêm à procura da conquista da vida, como ou vim e tantos outros, que não teriam chegado onde estão se se lhes opusessem esses entraves e essas dificuldades.
Apoiados.

Há que ter em considerarão os interesses das populações rurais, e não apenas os interesses das populações citadinas. Há que facilitar aos componentes dessas populações a possibilidade de um dia se verem erguidos um pouco mais além do meio em que viveram os seus antepassados, porque isso é uma aspiração legítima, é uma aspiração humana, é uma aspiração natural.
Consequentemente, parece-me que o puro regime de internato para frequência dessas escolas resulta contraproducente.
Se se põe o argumento de que o regime de internato facilita a deixar-se imbuir do espírito da profissão a que o indivíduo se dedica e que quer obter através da escola, o mesmo argumento seria de apresentar quanto às escolas industriais e comerciais, quer elementares quer complementares.