30 DE JANEIRO DE 1947 425
65 regentes por ano. Além disso, vai funcionar uma escola de regentes agrícolas em Angola, com um curso de três anos, o que limita as possibilidades de colocação nas colónias aos diplomados da metrópole.
Tenho ouvido até sustentar que uma só escola, bem dotada e com amplos terrenos, seria suficiente. Preferível, portanto, como parece ser o intuito da proposta, a melhoria ou ampliação das actuais escolas. Assim, permito-me divergir neste particular da opinião da Comissão de Educação desta Assembleia.
Sr. Presidente: o aspecto mais importante da proposta diz respeito às transformações a introduzir no curso de regentes agrícolas.
Na sua forma actual de organização, os cursos de regentes agrícolas podem ser considerados como escolas técnicas, mas ao mesmo tempo liceus rurais. Argumenta-se que esta organização é deficiente, porque impede as escolas de atender em maior número aos candidatos que procuram a frequência técnica da escola e por obrigar, praticamente, à escolha de uma profissão em idade em que é ainda difícil decidir.
E certo que estes argumentos impressionam. Convém contudo verificar se estas inovações não virão a prejudicar um ensino que já deu longas provas e que, indiscutivelmente, tem preparado número elevado de regentes agrícolas com apreciável aptidão técnica e com excelente formação para o exercício da profissão.
Se as escolas forem consultadas sobre o número de alunos que têm saído para os liceus, tem de se chegar à conclusão de que é uma minoria.
Por outro lado, a profissão agrícola não é perfeitamente comparável às outras, apesar das observações feitas pelo ilustre relator da Câmara Corporativa. Os factores principais na indústria são a matéria e a máquina; na agricultura, a natureza e o homem. E muito mais fácil regular o trabalho fabril do que o trabalho agrícola. Este último está sujeito a muito maiores contingências. Os resultados, portanto, dificilmente podem ser analisados por analogia com a indústria.
Inicia-se o caminho para desintegrar da escola profissional o ensino preparatório e, sem dúvida, no futuro, como diz o douto parecer da Câmara Corporativa, tornam-se perfeitamente simétricas as condições de entrada de todas as escolas técnicas de grau médio.
Parece-me que é de recear essa simetria absoluta.
O equilíbrio rural assenta sobre os laços que unem o cultivador e o solo de implica uma dupla realidade: a da terra e a do homem. Por isso não é fácil submissão total a uma racionalidade técnica.
Aquilo que para os moradores da cidade é apenas paisagem, mais ou menos agradável, é pana o habitante das aldeias o resultado de longo e, por vezes, ingrato esforço, que vem de muitos séculos. Esse sentimento de continuidade e de devoção a uma tarefa essencial à vida da Pátria existe na alma da maioria dos agricultores. Têm, portanto, de ser preparados antes que a cidade os tenha absorvido na multiplicidade das suas seduções e na aliciante promessa de profissões mais cómodas os candidatos a regentes agrícolas. Desde muito novos, é necessário incutir-lhes uma devoção especial à sua profissão, um amor sadio à terra, um interesse vivo pela técnica. Só assim se pode criar aquele espírito de escola tão precioso e necessário pana as realidades da vida.
Julgo que nesta profissão, mais do que em qualquer outra, tem de haver uma certa vocação, que uma preparação adequada desde tenra idade pode fazer despertar. Se alguns desertam a meio caminho é, sem dúvida, lamentável, mas isso acontece em toda a parte.
Tenho tido ocasião de verificar a actuação de regentes agrícolas durante bastantes anos e poderia trazer para aqui numerosos testemunhos para documentar
a minha afirmação dos altos serviços prestados por essa classe à lavoura, nomeadamente no campo da assistência técnica.
Em graves emergências da vida nacional também me foi dado constatar o seu alto espírito patriótico e a sua fé nacionalista. Tais manifestações honram as escolas que os forniam.
Receio, portanto, que alterações tão substanciais no seu modo de recrutamento e preparação venham a ter de futuro graves consequências. Assim o entendeu era parte a Câmara Corporativa, introduzindo modificações baseadas no receio de que a supressão dos cinco primeiros anos reduza demasiadamente o tempo da adaptação dos alunos à sua futura profissão.
Tenho a impressão de que não deve ser indispensável nem são urgentes as reformas que a proposta nos apresenta, quando tanto há ainda que fazer em matéria de ensino elementar e de ensino prático. Talvez se obtivessem os mesmos resultados acentuando as práticas nos primeiros anos do ensino das 15 às 17 horas e dando maior desenvolvimento ía algumas matérias do programa, em especial no que se refere a contabilidade. Ao mesmo tempo julgo que se deveria, por qualquer fornia, facilitar o acesso dos alunos desta escola aos estabelecimentos de ensino superior de Agronomia e Veterinária.
Não faz sentido que os alunos saídos dos liceus com média de 14 valores sejam dispensados dos exames de admissão o, estes cursos e os alunos das escolas de regentes agrícolas não gozem dessa regalia, quando, afinal, para aquele fim, eles têm melhor preparação.
E certo que aquela disposição tem carácter provisório, mas a verdade é que ela se vai tornando definitiva.
O Sr. Pinto Coelho: - V. Ex.ª dá-me licença?
Desejo apenas esclarecer, no mesmo sentido das considerações de V. Ex.ª, que a tendência é para abolir definitivamente os exames de admissão às escolas superiores. Isto não quer dizer que eu concorde com essa tendência, pois não concordo. O que quero dizer é que essa tendência torna ainda mais grave o problema que V. Ex.ª está tratando.
O Orador: - Agradeço a interrupção de V. Ex.ª e achava justo que os regentes agrícolas tivessem vantagens especiais para a sua admissão ao ensino superior.
Sr. Presidente: para terminar desejava ainda focar, muito rapidamente, um aspecto do ensino agrícola que pode revestir grande importância para o futuro da nossa agricultura - o da contabilidade agrícola.
Verifica-se que na prática a maioria das nossas explorações, e mesmo algumas de certo vulto, usam ainda o velho sistema da conta de saco.
Por toda a parte estamos verificando em outros países um grande esforço para modificar esta deficiência. Creio que se tornará cada vez mais indispensável ao agricultor saber interpretar os resultados da sua exploração, até mesmo para evitar exageros, que muitas vezes têm comprometido a causa agrícola.
São bem conhecidos os resultados obtidos pelo Gabinete de Estudos Económicos do Ministério da Agricultura dos Estados Unidos, pela Universidade de Oxford e pela União dos Agricultores Suíços, para citar algumas das mais interessantes organizações nesta matéria.
O bom acolhimento que tiveram por parte de numerosos agricultores os estudos de contas de cultura da vinha, levados a efeito pela Junta Nacional do Vinho, leva a supor que aquilo que se fez no estrangeiro se poderia também fazer com êxito em Portugal. Numa época em que se avizinham intensas modificações na estrutura do comércio mundial, parece-me que valeria a pena iniciar mais trabalhos neste sentido.