12 DE MARÇO DE 1947 793
ruína, se a tempo não se encontrasse para me substituir a alta competência musical e radiofónica da pessoa eminente que hoje dirige os destinos da rádio nacional e a conduziu à situação de impecável esplendor em que actualmente se encontra.
Sr. Presidente: as colónias têm sofrido, por vezes, com justificado amargor, das facilidades que se têm dado a certas pessoas menos indicadas pela sua experiência, conhecimentos e aptidões para alcançarem cargos coloniais que exigem experiência, conhecimentos o aptidões especiais. Tom sofrido e têm-se queixado.
Esta falta de cuidado na escolha das pessoas para determinados cargos de responsabilidade decerto erros, na escala de infracções às boas regras teóricas que atrás referi - teve especial relevo quando se constituíram os quadros dos organismos de coordenação económica dependentes do Ministério das Colónias. E os homens do ultramar, que viam descer sobre eles, para decidir dos seus interesses, orientar as suas actividades e zelar pela sua prosperidade, numerosas pessoas que não conheciam o meio nem os problemas, que ignoravam as realidades coloniais e as suas particularidades, alcunharam estes emigrantes de «paraquedistas». Depois a designação generalizou-se e teve aplicação a todos os sapateiros que apareceram a dedilhar no rabecão colonial.
No entanto, nem as suas queixas, nem os seus remoques tiveram o condão de fazer regressar as coisas aos bons princípios. São ainda lamentavelmente frequentes os casos de «paraquedismo» colonial - o que, além de reduzir o rendimento útil dos serviços e desviar o sentido de uma acção que, nas colónias mais do que na metrópole, deve ser segura e equilibrada, consciente e experiente, tem ainda o inconveniente gravíssimo de generalizar o conceito, praticamente já admitido, de que podem exercer-se nas colónias, sem grave dano para estas, certas funções importantes sem experiência nem preparação coloniais.
No clima deste conceito perigoso, foram nomeados recentemente - há poucos meses - professores auxiliares da Escola Superior Colonial, e ao abrigo das disposições de uma reforma que parece consagrar o conceito, indivíduos sem a menor experiência colonial, alguns que das colónias nem sequer viram a sombra que a terra faz no mar. Entretanto a frequência da Escola, que ainda em 1942 excedia, no 1.° ano, duzentos alunos, caiu, depois dá reforma, até sete - como se os alunos tivessem compreendido também que não precisam preparação para alcançar cargos coloniais.
E, na verdade, para quê um curso especial, findo o qual se vislumbra um lugar modesto de chefe de posto, se quase ao mesmo tempo era nomeado para um cargo elevado da carreira administrativa - nada menos do que inspector administrativo -, sacrificando direitos de funcionários de carreira preparados e competentes, um indivíduo que nunca estivera nas colónias, nem por elas se interessara, e que até à nomeação mais não fora do que delegado do Ministério Público numa comarca da província?
Estes exemplos de «paraquedismo» -isto é: exemplos de infracção a uma regra que todos temos como sadia, ou seja a da exigibilidade de competência provada por parte das pessoas que se investem em funções de importância política, técnica ou administrativa- não têm no entanto a gravidade que assume uma outra nomeação recente e para a qual desejo chamar a atenção do actual Sr. Ministro das Colónias.
É o facto dessa nomeação que determinou a minha intervenção de hoje.
Trata-se de uma portaria de 29 de Janeiro passado e publicada, salvo erro, na 2.a sério do Diário do Governo de 15 de Fevereiro, que nomeia Artur da Silva Rebolo vice-presidente da Comissão Reguladora de Importação
da Colónia de Angola, nos termos do artigo 5.° do decreto n.° 29:714, de 24 de Julho de 1939.
Devo declarar que não conheço pessoalmente o nomeado - que nunca o vi- e que, por consequência, não me movem contra ele quaisquer sentimentos pessoais. Admito inclusivamente, sem esforço, que seja excelente pessoa e muito simpático. Mas sei, porque tive o cuidado de me informar ao ouvir alguns reparos de escandalizados, que o novo vice-presidente da Comissão Reguladora de Importação da Colónia de Angola como se tratasse de organismo recreativo ao qual não estivessem afectos interesses respeitáveis dos colonos e o próprio prestigio da governação da colónia- nunca esteve nus colónias, nem em Angola, nem noutra qualquer, e que as actividades e competência anteriores que o recomendam se limitam ao curso dos liceus, às funções exercidas durante alguns anos como empregado do Casino do Estoril e de outras organizações da mesma empresa e por fim membro do conselho de administração de um jornal da tarde de Lisboa.
Quanto à legalidade da nomeação, aliás sancionada pelo Tribunal de Contas, não há que objectar. O artigo 9.° (e não 5.°) do decreto n.° 29:714, de Julho de 1939, nos termos do qual o Sr. Rebelo foi nomeado, diz apenas:
O presidente e vice-presidente da Comissão serão nomeados pelo Ministro das Colónias, que fixará a sua remuneração.
Nem sequer se resguarda pùdicamente, como é costume, por detrás de certas expressões vagas, muito frequentes nas leis, tais como as da «idoneidade», «em regra», «poderá», etc., e que permitem, de facto, nomear toda a gente!
Quer dizer: a lei não condiciona a nomeação senão quanto à entidade que nomeia. E assim, perante a lei, podem, indiferentemente, ser nomeados presidente ou vice-presidente do organismo regulador da importação do Angola um analfabeto ou um professor da Universidade, um colonialista ou um dentista, uma competência em assuntos de jogo e turismo ou uma competência em questões económicas. Pode perante a lei - que evidentemente se mostra deficiente!- mas não pode, também evidentemente, perante o bom senso, as boas regras e o sentimento elementar das conveniências e interesses da colónia.
Perdeu-se no Sr. Rebelo, certamente, um bom elemento nas actividades turísticas do Estoril, para as quais se deve encontrar excelentemente preparado - mas não se reuniu o mínimo de garantias para que o mesmo senhor pudesse ser nomeado vice-presidente da Comissão Reguladora de Importação da Colónia de Angola.
Creio que todos os meus ilustres colegas estarão de acordo comigo e com todos os portugueses responsáveis que teórica e unanimemente condenam estas coisas.
Eu sei, todos sabemos, que nomeações inadequadas se fazem por vezes, por força ou conveniência de razões políticas, as mesmas razões políticas que não consentem também por vezes a nomeação das pessoas mais indicadas e competentes para certas funções. Mas a este respeito há que considerar, equilibradamente, que a conveniência política que por um lado se supõe realizar, forçando o espírito claro da lei ou abusando das suas insuficiências - cria automaticamente entre os representantes dos interesses feridos pela incompetência uma situação de inconveniência política que é necessário considerar, pois o saldo entre a conveniência e inconveniência - e é o que se dá no caso presente- é geralmente negativo.
Politicamente (e moralmente também) é muito menos inconveniente uma nomeação ilegal, recaindo em indi-