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12 DE MARÇO DE 1947 797

O Sr. Nunes Mexia: -Nós, que, à margem desta elevada função, somos produtores, o que nos interessa sobretudo são as coisas concretas.
Então, se é um facto absolutamente real a importação de vários milhões de quilogramas de lã estrangeira, se realmente as lãs estrangeiras são melhores e mais baratas, eu pergunto a V. Ex.ª em que medida se estendeu ao consumidor o beneficio dessas melhorias de laboração?

O Orador: - «Se realmente»... Mas, contra o que sempre foi, e ainda ninguém demonstrou o contrário, não são realmente melhores e, contra o que repetidas vezes aqui se acentuou, não foram mais baratas?
Porque não provou V. Ex.ª isso?! Quanto a preços, eu estou a falar e só posso falar na possibilidade e probabilidade de preços mais baixos. Não estou a fixar a medida dessa baixa, nem ninguém aqui a pode determinar.

O Sr. Figueiroa Rego: -V. Ex.ª dá-me licença?
A quantidade de lã nacional que entra na confecção de todos os artefactos anda em relação deste ano para o ano passado na proporção de l para 2, É fácil, mantendo os preços, obter uma larga margem de redução. E desde que aqui foi afirmado que o preço por quilograma ia até 60$ para a lã estrangeira, não é de admitir que se barateiem os preços.

O Orador: - É o que resta provar.
Mas, Sr. Presidente, estava eu a comentar a necessidade de guardar serena imparcialidade no exame de todas as questões.
Com esta chuva de apartes ia perdendo o fio das minhas considerações iniciais. Volto a ele para dizer que, não obstante todo o exposto, hei-de lealmente confessar uma pontinha de parcialidade.
Não sou nem contra a produção, nem contra a indústria, nem contra o comércio. Sobretudo, sou, não direi pela lavoura, mas pela agricultura.

O Sr. Melo Machado:-Como faz V. Ex.ª a distinção?!

Orador:-Era fácil prever a objecção. Ainda aqui afirmarei que se não trata de mera questão de palavras.
A distinção falta base científica. Dou, por isso, a razão do meu dito: no Norte, a que pertenço, dos pequenos e médios proprietários diz-se simplesmente que são «proprietários», considerando-se os maiores de entre os médios «proprietários com casa de lavoura». Só aos abastados, aliás poucos, se dá verdadeiramente, e bem, o nome de lavradores.
Ora, pêlos, mesmos motivos políticos, económicos e sociais com que discordei nesta Assembleia de certos excessos de concentração industrial preconizados numa proposta de lei, defendo e acarinho os pequenos casais agrícolas.
É que, Sr. Presidente, eles são o mais sólido elemento de estabilidade social; neles vive maior número de famílias e de famílias mais numerosas; a gente que os cultiva trabalha como nenhuma outra e aufere menos lucros do que qualquer outra; ama o c torrão», como ela própria diz; tem um verdadeiro «vício» da terra, como dela disse um dia o Sr. Presidente do Conselho: laboriosa e sofredora, paciente e desprotegida, toda essa população rural precisa que a defendam mais com os baixos preços das mercadorias a comprar do que com os altos preços dos produtos a vender, visto ela ter sempre muito para comprar e pouco para vender.
No fundo, esta pontinha de parcialidade é ainda, e só, defesa do consumidor.
Já vai longo o meu preâmbulo, que teria querido breve. Mas, ainda antes de entrar no centro do problema que propus expor à Assembleia, direi duas breves palavras.
Sr. Presidente: a lavoura queixa-se da indústria, esta queixa-se daquela e ambas se queixam do comércio. Todos, têm alguma razão.
Sem se negarem os progressivos esforços de muitos dos seus melhores elementos, deve a produção manter o número de ovinos mais vantajosamente adequado» aos recursos de que dispõe, isto é, dotados do máximo de produtividade que for permitido pelas condições do meio, melhorando ao mesmo tempo a tecnologia das suas operações de tosquia, enrolamento, armazenagem e escolha ou apartação.
Deve o comércio ser feito por processos menos empíricos e mais práticos, como já aqui foi dito, e disciplinar-se honestamente, de modo a evitarem-se possibilidades de especulação.
Deve a indústria apetrechar-se convenientemente de material e de técnica, aproveitando ao máximo o têxtil lanar e baixando ao mínimo os seus custos de produção.
Do mesmo modo, deve velar-se pelo preço do tecido à saída da fábrica, pêlos lucros dos intermediários e, sobretudo, pela fúria (gananciosa do alfaiate, que, sob pretexto de tudo estar caro, nos fica ainda muito mais caro do que tudo...
Como, porém, não foram estes os verdadeiros fins do aviso prévio, passemos ao que neste é essencial.
O seu ilustre autor, Sr. Deputado Figueiroa Rego, visou fundamentalmente os dois pontos seguintes:
1.° Acusar de inoportuna a liberdade de importação de lãs;
i2.° Responsabilizar esta importação pelo aviltamento dos preços das lãs nacionais ou até pela impossibilidade da sua transacção.
O primeiro ponto - a causa - foi já abordado, e sempre com brilho, por vários oradores, embora nem todos se tenham pronunciado no mesmo sentido. Do segundo ponto - o efeito - ocuparam-se sobretudo os ilustres Deputados Srs. Melo Machado, engenheiro Mira Galvão e Dr. Nunes Mexia. Dele, principalmente, me ocuparei também, encarando sobretudo o que poderia chamar ó aspecto agropecuário.
Que pensar, no aspecto agropecuário, do presente aviso prévio?
Será legítima a queixa da lavoura contra a importação de lãs estrangeiras? Será justa a sua reivindicação de que se mantenha para as lãs nacionais um tabelamento, e designadamente o tabelamento de 1945? Será de deferir o pedido de que se proíba à indústria a manufactura das lãs de fora enquanto não consumir as lãs de dentro? Numa palavra: o têxtil lanar português carecerá, não só de protecção, mas de forte protecção oficial e legal?
Duas afirmações me impressionaram fortemente desde o primeiro dia em que se levantou esta questão das lãs : a da profunda diferença entre os preços das lãs nacionais e as cotações das lãs estrangeiras; a da estreita semelhança entre o problema da nossa lã e o do nosso trigo.
Partindo do pressuposto de serem exactas ambas as afirmações, as conclusões tiradas da segunda arredariam, naturalmente, as conclusões derivadas da primeira.
Ora, Sr. Presidente, não podia duvidar da primeira afirmação. Era facto de há muito apurado. E, sem necessidade de recorrer a outras considerações, compreende-se tal facto mediante esta simples explicação: durante séculos., mesmo depois de extinta como forma típica de organização económico-social, a pastorícia