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12 DE MARÇO DE 1947 799

Esta consideração me leva a outra-à do rendimento doe ovinos.
Qual, no total, esse rendimento? E em que proporção nele entram os diferentes produtos o vinícolas? Terão inteira razão os que proclamam a necessidade de proteccionismo forte, até ao ponto de se proibir a entrada de lãs estrangeiras enquanto não for consumida a lã nacional?

O Sr. Melo Machado: - Ninguém pediu isso.

O Orador: - Pediu o Sr. Deputado Figueiroa Rego.

O Sr. Figueiroa Rego:-V. Ex.ª, Sr. Deputado Soares da Fonseca, dá-me licença que eu explique?
Pus o paralelo simplesmente com o espirito de garantir um determinado nível à lã nacional em proporção à lã estrangeira.

O Orador: - Não sei ou não sabia, e nem podia adivinhar, qual a intenção que estava no espírito de V. Ex.ª Sei apenas que V. Ex.ª tinha feito a afirmação referida; e é a afirmação em si mesma, objectivamente, que visei. De intenções não curo. Sou demasiado destituído para descobrir intenções diferentes das que resultam do próprio sentido das palavras. É por isso que costumo fazer questão das palavras... A fala não foi dada ao homem para encobrir o pensamento, mas para o exprimir.
Ia eu a dizer, Sr. Presidente, que procurei reflectir sobre o rendimento da espécie pecuária ovinícola.
A princípio quedei-me a pensar nestes aspectos vagos, talvez sobretudo sentimentais, mas por isso mesmo impressionantes:
Dizia-se antigamente que as ovelhas davam um rendimento de 100 por 100 (com fornecerem carne, leite e estrume) e que, por cima disto (portanto como acréscimo, secundariamente), enquanto não davam a própria pele, se despiam todos os anos para vestirem o dono.
Mas isto era talvez só antigamente, quando ainda havia indústrias caseiras para trabalharem o têxtil lanar. Hoje, a avaliar pelo ilustre autor do aviso prévio, as ovelhas continuam a despir-se - mas para vestirem toda a gente, menos o produtor, que fica tão tosquiado como o próprio rebanho.
Esta simples consideração, portanto, não me podia bastar. E continuei assim o meu raciocínio: contra a orientação da Federação Nacional dos Industriais de Lanifícios e da indústria reclamou e tem reclamado sobretudo o Sul. O Norte mantém-se silencioso, quase se diria indiferente.
Todavia, se considerarmos o Sul constituído pêlos distritos de Faro, Beja, Évora, Portalegre, Setúbal, Lisboa, Santarém e Castelo Branco e o Norte pêlos distritos restantes, verifica-se o seguinte, conforme o arrolamento de 1940:
O número de ovinos é sensivelmente igual no Norte e no Sul - 1.806:523 cabeças no Norte e 2.083:352 no Sul, ou seja, respectivamente, 46,44 por cento e 53,56 por cento.
A percentagem de manifestantes é mais elucidativa ainda - 193:505 no Norte e 54:657 no Sul - ou, em percentagens, 77,98 .por cento e 22,02 por cento.

O Sr. Figueiroa Rego: -Evidentemente. Um menor número de cabeças por proprietário não pode dar outros números. Eu citei o distrito de Bragança.

O Orador:-Pois evidentemente, Sr. Deputado Figueiroa Rego. Mas uma coisa é a razão da percentagem maior no Norte e outra coisa é a conclusão a tirar da existência dessa maior percentagem, que é a seguinte:
Se da orientação aqui atacada tivessem resultado os graves danos que se disseram, deveriam ser sensivelmente iguais no Norte e no Sul, com a diferença de no Norte ser muito maior o número de lesados.
Porquê, então o silêncio da produção nortenha?
Talvez o Norte, mais sofredor e mais modesto, não saiba e não tenha sequer tempo para fazer contas.
Efectivamente, em regra, não sabe e; se soubesse, não podia, até porque, em muitos casos, a sua magra exploração agrícola mal daria para o papel e lápis.
Acresce que no Norte há mais lã churra.
Ora, quanto a lã churra ...

O Sr. Nunes Mexia: -Não está em causa a lã churra.

O Orador:-Deixe-me V. Ex.ª expor o meu pensamento. Verá, depois, por que motivo a lã churra é trazida à colação.
Ia eu a dizer, Sr. Presidente, que encontrei nesta Câmara um ilustrado colega que, sendo lavrador abastado no Norte, é também uma reconhecida competência em problemas financeiros e económicos.
Ora S. Ex.ª disse-me que só tinha ovelhas de lã churra; que esta se vende por muito menos de metade, quase por um terço, da lã merina ou cruzada; mas que, não obstante, considerava o seu rebanho um dos melhores rendimentos da sua considerável casa agrícola.
E não percebi então como, havendo no Norte produtores que consideram lucrativa a exploração de ovinos fornecedores de lãs mais baratas, os produtores do Sul se batem tão afanosamente por comparar o problema das lãs ao do trigo.

O Sr. Nunes Mexia:-V. Ex.ª dá-me licença? É que a ovelha de lã churra dá em peso o dobro da ovelha de lã fina. Consequentemente, compensa a diferença de preço. Também em muitos casos verificados no Norte do País na apascentação do gado se não fazem contas ao custo do pastor e até, em certos casos, ao valor da pastagem.

O Orador:-Quanto a contas, aceito que no Norte poucos as farão ou saberão fazer. Já me referi a isso, sem que de tal possa tirar-se a ilacção de prejuízos, como também amplamente referi. Quanto a contas no Sul, talvez às vezes sejam bem feitas demais... Possivelmente terei ainda oportunidade de focar esse ponto.
Sobre lã churra, aceitemos que dá o dobro do peso. Mas, como o preço desta lã é inferior a metade do preço da lã fina, não chega a haver compensação. Aliás, espero apontar que é um mal de grande parte da lavoura alentejana explorar normalmente rebanhos com vista à produção de lã.

O Sr. Nunes Mexia:-Abastecido o País durante a guerra, é essa a sua recompensa!

O Orador:-Verifico estar V. Ex.ª de acordo comigo em que parte da lavoura alentejana pensa sobretudo na produção de lã.
Se isto é bem ou mal adiante se verá, no decorrer das minhas considerações.
Por agora, direi que não nego nem o esforço feito pela lavoura durante a guerra, nem os serviços que prestou ao País. Prestei-lhe até as minhas homenagens 110 começo do meu discurso. Mas, como também já acentuei, não são os princípios de uma economia de guerra que eu defendo para uma economia de paz. E estou a raciocinar para a normalidade dos tempos de paz.
Posto isto continuo na minha ordem de considerações.
Voltei-me para as estatísticas, Sr. Presidente, e delas não tirei conclusão diversa da que venho apontando.