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824 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 101

O Orador: - Repito: a Câmara encontra-se neste momento solicitada para emitir o seu voto sobre estes três pontos concretos: primeiro, anulação, ou sustação, se quiserem, de todos os despachos que autorizaram a importação de lãs; segundo, criação de uma nova unidade fabril pela qual a lavoura passa a ter directa intervenção na indústria, ou a lavoura e as demais actividades industriais sugeridas pelo Sr. Dr. Nunes Mexia se associam na tal empresa de tipo nacional destinada exclusivamente a trabalhar à façon; terceiro, suspensão pura e simples, ou, mais lealmente, revogação do despacho normativo de 17 de Dezembro de 1946 e seu aditamento de 23 do mesmo mês.
São estas três decisões que esperam o aplauso ou a repulsa de V. Ex.ªs
Sem necessidade de ir mais longe, suponho-me no direito de afirmar que a aprovação de tais votos representaria qualquer coisa de aberrativo e de antagónico com os princípios afirmados, os discursos proferidos e as leis aprovadas por esta mesma Assembleia Nacional.

O Sr. Nunes Mexia: - Agradeço desde já a V. Ex.ª essa demonstração.

O Orador:- V. Ex.ª não tem que mo agradecer, porque é evidente que a vou fazer, mas para toda a Assembleia.
Fá-la-ei sempre afastado de detalhes técnicos do problema das lãs, mas invocando aquele tenuíssimo velo que deve unir as atitudes de todas as assembleias, nomeadamente das assembleias de natureza política como esta, e daqueles que as constituem e têm responsabilidades políticas e pessoais nas medidas, nos princípios e nos discursos anteriormente formulados.
Esse velo, essa linha de ligação, chama-se coerência.
E sairia bem embaraçada logo da aceitação do primeiro voto em que estão de perfeita harmonia os ilustres Deputados Srs. Drs. Figueiroa Rego e Nunes Mexia.
Tenho ouvido repetir, aqui e lá fora, dezenas de vezes, e sempre com crescente aplauso, que o Estado é uma pessoa de bem.
Ora este Estado pessoa de bem concedeu autorizações para importação de lãs; assegurou aos beneficiários dessas autorizações que podiam comprometer-se nus transacções inerentes a essas importações; assumiu para com eles um compromisso de ordem moral.
Garanto a V. Ex.ªs, sob minha palavra de honra, que não conheço o nome de um só dos beneficiários dessas autorizações, mas admito que eles, confiados na palavra do Estado, estabeleceram relações comerciais com os produtores estrangeiros, firmando contratos destinados a satisfazer às importações autorizadas, tomaram compromissos de ordem comercial e jurídica, que são já agora inalteráveis sem grave responsabilidade para com aqueles com quem trataram, estando sujeitos ao pagamento de indemnizações por perdas e danos se faltarem.
Obrigaram-se perante o estrangeiro vendedor de lãs e podem ter-se obrigado perante nacionais que delas carecessem.
Esta última relação jurídica era lícito, inclusivamente, tê-la estabelecido antes mesmo de compradas as lãs no mercado estrangeiro.
V. Ex.ªs não ignoram que no Código Comercial existe o artigo 467.°, incluído no título de compra e venda, que permite a venda de coisa pertencente a outrem.
Por consequência, se a Câmara, directa ou indirectamente, perfilhar semelhante voto - directamente aprovando-o nos seus precisos termos, indirectamente dando a sua aprovação a uma moção que o englobe-, coloca em muito má postura o Estado pessoa de bem a induzir outrem, os particulares, a tomarem compromissos a que mais tarde os força a faltar...

O Sr. Figueiroa Rego:- V. Ex.ª dá licença?

O Orador: -Dou. Mas não se anticipe V. Ex.ª... Sei o que vai dizer!...
A p. 747 do Diário das Sessões V. Ex.ª limita essa revogação de autorizações àquelas em que não haja compromissos formais.

O Sr. Figueiroa Rego: - Justamente!

O Orador:- Tenho por V. Ex.ª a mais alta consideração e só por isso não me alongo a demonstrar a sem razão da tal pretensa limitação.
A que chamam V. Ex.ªs autorização sobre que não haja compromisso formal?
Visam, porventura, aquelas autorizações em que se demonstre a existência de contratos formais, ou mercadoria já embarcada, ou créditos abertos irrevogáveis?
Não chega! Confiados na autorização do Estado, muitos outros importadores autorizados se poderão ter comprometido!

O Sr. Figueiroa Rego: - E há ainda as prévias autorizações.

O Orador: - Continua a não chegar.
Obtida a autorização para importação, ao beneficiário era lícito procurar garantir-se com a colocação no mercado interno da lã que ia importar ...

O Sr. Nunes Mexia: - Na prática a venda e a compra que viabilizasse aquela acham-se sempre sincronizadas.

O Orador: -Sempre é exagero. Podem não se adiar. Ainda V. Ex.ª não era nascido já o artigo 467.º do Código Comercial consentia nada mais nada menos que o inverso do que V. Ex.ª assegura realizar-se sempre ...
Falemos claro!
O contrato de compra e venda de lãs é uma banal transacção comercial que não carece de formalidades especiais.
A simples troca de duas cartas comerciais - uma a oferecer a lã, outra a prometer comprá-la - documenta-o.
O voto dos Srs. Drs. Figueiroa Rego e Nunes Mexia e o compromisso desta Assembleia redundariam numa inutilidade, pois bastaria que um amigo do importador autorizado se prestasse a confirmar-lhe a compra da lã a importar para esta fraude infantil inutilizar a limitação proposta pelo Sr. Dr. Figueiroa Rego.
Praticaríamos, por conseguinte, uma violência ridícula, inútil e desprestigiante para o Estado.
Desprestigiante, pois colocá-lo-íamos a anular determinadas operações que oito dias, quinze dias, três semanas, um mês antes consentira; violenta e inútil, atenta a manifesta facilidade de fraude; ridícula... por essa mesma facilidade.

O Sr. Botelho Moniz:- V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Botelho Moniz: - Eu queria simplesmente perguntar se a importação de lãs está ou não condicionada? Se está condicionada, a autorização de importação é ou não é dada individualmente a determinadas firmas? Portanto a hipótese do artigo 467.° do Código Comercial