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838 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 102

concentração industrial dos lacticínios. Data a organização de 13 de Julho do 1939, pelo decreto n.° 29:749.
Dois anos depois, por uma portaria, criaram-se as zonas de abastecimento, dentro das quais não podia ir abastecer-se de leite senão a respectiva fábrica a que ficava adstrita. Cada uma dessas zonas ficava privativa da respectiva fábrica. Era o processo que se entendeu ser melhor para garantir à indústria a matéria-prima de que carecia.
Ninguém mais senão a fábrica respectiva podia utilizar o leite produzido nessa zona. Nem o lavrador, portanto.
Começaram então a digladiar-se os interesses da lavoura e os da indústria: a indústria querendo esmagar a lavoura, que procurava sair da prisão a que a condenavam, reclamando a liberdade de vender o leite que produzia a quem entendesse, e a lavoura, querendo organizar-se em cooperativas, ou por iniciativa dos próprios associados ou por iniciativa dos grémios da lavoura, como lhes era permitido pelo decreto n.° 29:494, de 29 de Março de 1939. Mas as cooperativas não podiam ser vistas com bons olhos pela indústria, que nelas via concorrentes perigosos, o por isso se opunha à criação de novas; o às únicas duas existentes - a de Aldreu, em Barcelos, e a de Sever do Vouga - procurava esmagá-las, invadindo a área que lhes pertencia na compra do leite.

O Sr. Teotónio Pires: - E o Estado tem negado às cooperativas agrícolas os meios legais de conseguirem os seus fins.

O Orador: - E compreende-se isso, dada a orientação económica seguida pelo Governo - a da concentração industrial - da sua única responsabilidade. O erro, se erro havia, de orientação era do Governo, e teria de ser, portanto, coerente na sua actuação até ao fim, pois que, se a indústria se organizou da maneira que se sabe e em tal actividade investiu grandes capitais, foi a convite ou a imposição do Governo, confiada na garantia de protecção que lhe era dada.
As zonas seriam garantia de aquisição do leite de que necessitava a indústria, e, por conseguinte, da sua continuidade; nem de outro modo se compreenderia que se abalançasse a empreendimento tão arrojado e dispendioso como o que revelam as suas instalações, na sua quase totalidade feitas na região leiteira do meu distrito - Avança, Vale de Cambra e Vila da Feira. É grande o número de fábricas que, pela sua aparelhagem e apetrechamento, dirigidas por bons técnicos, puderam, fabricando produtos de boa qualidade, competir, até certo ponto, com o estrangeiro.

O Sr. Teotónio Pires: - As cooperativas também o poderiam fazer.

O Orador: - Naturalmente o Estado, repito, não podia permitir senão o que fosse em conformidade com a orientação que resolveu seguir.
Com a concentração quis-se tornar melhores e mais perfeitos os produtos, disciplinando e condicionando a produção, que, como já disse, até ali proliferava num sem número de fábricas de inferior categoria e fabrique-tas anti-higiénicas, postos de recepção e de desnatação impróprios e insalubres até.
Por números que tenho, relativos a 1930, vê-se que esses postos e fábricas chegaram nesse ano a atingir um total de 450.
Para melhor elucidação apresento mais os seguintes números, extraídos do mapa estatístico, que me forneceu a Intendência de Pecuária de Aveiro, respeitante a estabelecimentos de lacticínios existentes na sua área no decénio de 1935 a 1945.
O total dos postos de recepção, de desnatação e fábricas era, como já disse, de 450 em 1935, descendo depois da concentração a 173 em 1942 e a 165 em 1945.
Os postos de desnatação desceram de 325 em 1935 a 69 em 1945, e as fábricas, de 125 que eram naquele primeiro ano, a 14 em 1942, número mantido até 1945.
Isto que estou citando é relativo a Aveiro e tem importância especial para o problema, visto tratar-se de uma região de lacticínios por excelência, onde a indústria, portanto, tem atingido o maior desenvolvimento.

O Sr. Teotónio Pires: - E nos Açores?

O Orador: - A questão está circunscrita ao continente. Naturalmente a indústria defende-se, procurando chegar a maior compensação no preço dos produtos, adquirindo o leite ao mais baixo preço e vendendo os seus produtos pelo mais alto.
O Governo, então, interveio com o tabelamento-tabelamento do leite e tabelamento dos produtos. Assim tinha em vista acabar com excessos de lucros, que é o objectivo persistente dos produtores, em prejuízo sempre da principal vítima - o consumidor -, sobretudo o da classe média e da classe pobre.
Mas o lavrador também sabe defender-se e procurou então um outro processo, para pôr cobro ao que considerava um abuso, vendo a matéria-prima que criava cedida obrigatoriamente à indústria, que via prosperar enquanto ele definhava, e sem possibilidade de encontrar apoio às suas legitimas reclamações. O que fez? Resolveu desfazer-se, em grande quantidade, das vacas leiteiras.
V. Ex.ª Sr. Presidente, que é da região, bem sabe porque ela assim procedeu. Era porque o leite produzido pelas suas vacas não era vendido por preço compensador. E também porque havia dificuldades, carência mesmo, de transportes. Os automóveis não tinham gasolina, as camionetas não tinham pneus, a carretagem garantia-lhe lucros apreciáveis. Transformou, portanto, a sua actividade, trocando a vaca de leite pelo bovino de trabalho, que o ajudava na lavoura e lhe dava, além das crias que vendia, bons lucros na carretagem.
Na região de Aveiro alturas houve em que as estações de caminho de ferro estavam cheias de novilhos que vinham para Lisboa para sor abatidos para consumo.
Tudo isso provocou a baixa na produção do leite, num decréscimo progressivo, o que se evitaria se o preço de venda fosse compensador. A seca e a falta de pastagens, embora para tal concorressem, foram de menor importância.
Tenho aqui presente um outro mapa estatístico que se refere à produção de leite. Verifica-se por ele que o leite completo saído das fábricas para alimentação humana na região a que me tenho referido passou de 2.107:801 quilogramas em 1939, primeiro ano da concentração, para 150:052,5 em 1943. Depois, em 1944, subiu para 349:327, e em 1945 chegou já a 1.124:908,4.
Isto diz respeito ao leite completo saído para alimentação pública, repito.
Vamos agora ver o que aconteceu com o leite industrializado. Em 1939 foi a produção de 40.796:258 kg,4; depois foi descendo, descendo progressivamente para a casa dos 35, 32 e 29 milhões, até que em 1943 chegou aos 25.843:008 kg,5, dando-se em 1944 uma pequena subida para 28.819:261 kg,5, mas descendo já no ano seguinte, 1945, para 28.293:223 quilogramas.
Este mapa, que me foi fornecido, como outros, a solicitação minha, pela Intendência Pecuária de Aveiro, é bem elucidativo. Denuncia nova orientação da indústria esse aumento de saída de leite das fábricas para alimentação humana verificado em 1944 e 1940. Quer dizer: as fábricas, por isso lhes dever ser mais compensador, dado o preço do leite nos dois grandes centros popula-