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12 DE DEZEMBRO DE 1947 59

fluo. Alegar-se-á, porventura, que isso é impor à riqueza uma limitação. Nos diremos que é apenas reconhecer à riqueza a sua natureza e mesmo a sua glória, já que essa função representa a sua razão de ser, a sua legítima e eficiente justificação. Não há, não pode haver, direito absoluto nem na extensão nem no uso. Se assim não fosse teríamos legitimado a miséria, reconhecido um regime de castas, estabelecido a velha servidão pagã, algemado a maior parte dos homens aos pés do deus Moloch. A nossa doutrina é uma doutrina de libertação; essa afirma-se na função social da riqueza, que tem por limites o bem comum. Em defesa da personalidade colectiva da Nação? Também em defesa e segurança da própria riqueza, que no cumprimento daquela função tem a base da sua estabilidade, pois que a história mostra que, na ordem fisiológica como na ordem social, todos os órgãos terminam quando cessa a sua função.
Assim pensam todas as nações que querem viver e progredir, assim pensam as grandes nações do Mundo, as potências de maior envergadura económica. Já antes da guerra, a Hungria cobrava 80 por cento nos rendimentos que excediam 1 milhão de pengos. A Inglaterra aplica hoje sobre certos rendimentos taxas fiscais que para nós têm a aparência de um confisco. Os Estados Tinidos limitam o volume da riqueza de que, por doação, os cidadãos podem dispor, fazendo reverter o excedente a favor do Estado. E afinal a política que a nossa velha legislação aplicava à instituição dos morgadios.
Estes não podiam exceder uns tantos mil cruzados. Quando o património os excedia, formava-se outro morgadio, criava-se outro património familiar.
Alega-se ainda que tal limitação representa um sacrifício. Se por sacrifício se quer designar a limitação, eu digo que o sacrifício é lei fundamental de toda a sociedade e que, como disse Mella, o sacrifício comparte com a justiça o governo da sociedade. Nenhuma sociedade se fundou e viveu jamais sob o primado do interesse particular. Este, fomentado pelas paixões, só produz a confusão e o caos. Mas foi precisamente para evitar a confusão e o caos que se estabeleceu o Poder Público. Toda a sociedade está pois constituída neste dilema fatal: ou a limitação voluntária e meritória da riqueza ou a limitação forçada e sem mérito. Ou a riqueza se autolimita, derramando no seio da sociedade a abundância de bens que formam «a justiça entre os cidadãos», tornando-se a socialmente útil», ou o Estado, como corregedor do interesse público, a força ao cumprimento dessa função através do imposto, cujo produto se destina a serviços sociais.
O capitalismo anónimo, a riqueza concentrada que vive e actua nos subterrâneos, onde não chega a fiscalização do Estado nem a luz da moral, representa, embora se declare seu inimigo, um associado e poderoso factor do comunismo.
O liberalismo desamortizou a propriedade social em propriedade individual, criando o capitalismo anónimo, fonte de pauperismo e de miséria; o comunismo segue-lhe o exemplo: converte a propriedade individual em propriedade socializada, sinónimo do pauperismo e da miséria colectiva. O capitalista anónimo, colectivismo de empresa, é caminho direito para o capitalismo de Estado, para o colectivismo de massas. A reforma parece-nos por isso lógica e harmónica com os objectivos que se propôs como defesa dos pequenos patrimónios: a defesa contra todos os inimigos tradicionais da Nação. Se a família é o centro em volta do qual se trava a «luta de civilizações», essa luta define-se por um conceito de propriedade, e logicamente, visto que a família tem na propriedade a segurança da sua soberania, o meio de cumprir as suas altíssimas funções. Defendendo a família e investindo com o capitalismo anónimo, a reforma exprime com exactidão a defesa nacional na luta contra o comunismo, ameaça das nossas tradições e da nossa personalidade colectiva.
Sr. Presidente: poderia a reforma ir mais longe? Poderia elevar-se ainda mais alto a base de incidência do imposto? Não poderia ter-se reduzido a taxa de compensação? Quero crer que a reforma resultou de um estudo demorado e consciencioso e que o Governo a levou até onde neste momento podia ir. E de esperar que novas alterações nela venham a ser introduzidas, de harmonia com o desafogo financeiro do Estado e novas exigências sociais da Nação.
Mas, tal como consta da lei, a reforma representa uma autêntica revolução na ordem e na paz, exprime um valiosíssimo esforço daquela revolução que é preciso levar a cabo para que não vingue a revolução da desordem e do caos.
Nisso reside o seu melhor e maior merecimento. Nisso consiste a razão fundamental do meu aplauso.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Pacheco de Amorim: - Sr. Presidente: diz o douto e bem elaborado parecer da Camará Corporativa que entre as inovações da actual proposta de lei de meios se conta o artigo 9.°, que pede apoderes para manter o princípio constitucional, princípio este básico das finanças públicas portuguesas: equilíbrio do orçamento e das contas.
E acrescenta: «Assim, o Ministro das Finanças, nos termos desta disposição, para assegurar o referido equilíbrio e o regular provimento da tesouraria, fica autorizado a reduzir ou suspender dotações orçamentais e a condicionar, do acordo com os interesses do Estado ou da economia nacional, a realização de despesas públicas ou de organismos ou entidades subsidiados ou comparticipados pelo Estado».
Numa palavra, pelo proposto artigo 9.° fica o Ministro das Finanças autorizado a comprimir as despesas públicas, o que, em princípio, achamos muito bem. E também fica autorizado pelo mesmo artigo, «duma forma indeterminada, o estabelecimento de novos adicionais às receitas gerais do Estado», o que, em princípio também, não achamos muito mal. Simplesmente não percebemos.
Diz o douto parecer que «não conhece a Câmara Corporativa qual seja a intenção do Governo, mas manifesta a esperança de que não se torne necessário recorrer a tal medida de agravamento tributário».
Fazendo nosso o voto da Câmara Corporativa, também não sabemos qual seja a intenção do Governo, mas a lógica autoriza-nos a concluir qual seja o seu estado de espirito no que diz respeito à política da moeda e dos preços.
Por isso dissemos há uns instantes que não percebíamos e agora podemos dizer que percebemos.
Digamos por miúdos o que é que não percebíamos e o que é que percebemos.
Quando no ano passado se discutiu nesta Câmara a proposta da lei de meios, a expectativa das esferas governativas era a de deflação natural, produzida pelo engrossamento da circulação dos produtos no mercado interno e no externo. Demonstrei nesta Assembleia que a deflação natural estava ainda distante, pois que, antes que ela se desse, necessário seria exaurir primeiro a circulação potencial e só depois poderia começar a supressão do excesso de numerário circulante que então encharcava o mercado. Por outro lado, que o mercado externo não forneceria tão cedo bens de produção em ritmo acelerado, porque as necessidades lá fora eram muitas e a produção relativamente pequena.