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126 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 122

ela constitui directamente também uma fonte de trabalho.
Primeiro deixem-me dizer que na propriedade essa riqueza se distribui por 350:000 vinicultores, o que desde logo lhe empresta um sentido eminentemente social.
Depois a vinha é cultura essencialmente colonizadora, quer dizer, não só mobiliza grande número de braços, como ainda garante, na roda do ano, a contínua ocupação dos mesmos. E só quem não se tenha um dia debruçado sobre os problemas da mão-de-obra na agricultura é que pode esquecer os gravíssimos inconvenientes económicos, sociais e morais que advêm para uma massa rural influenciada por crises ora de falta, ora de excedente de mão-de-obra.
Só nos 345:000 hectares de vinha e nas respectivas adegas podemos calcular, segundo a estimativa do engenheiro agrónomo Cunha Parro, da Junta Nacional do Vinho, a utilização anual de 57 milhões de dias de salários (unidades-homens).
Isso já era bastante.
Mas o vinho não fica na propriedade, segue para o consumo do mercado interno e externo. E então é todo o trabalho dos transportes, dos armazéns, das tanoarias, da indústria do vidro, dos fungicidas, da cortiça, dia caixotaria, etc., e ainda essa prestimosa classe que permite levar o vinho ao consumidor, constituída por mais de 55:000 pessoas.
No dizer do nosso ilustre colega, meu querido amigo e meu sábio Prof. Luís Cincinato da Costa, «não seria difícil concluir que mais de metade do País está ligada a esse primordial valor da nossa riqueza pública».
Parece, portanto, que sob o aspecto social é grave pecado combater-se o uso do vinho, antes será virtude fomentar-se o seu consumo.
Pode dizer-se, Sr. Presidente, que se aceitam as incontestáveis vantagens de carácter económico e da mobilização e distribuição do trabalho que o consumo do vinho faculta, mas que se ignora a sua influência sobre a saúde pública.
Será ou não o vinho uma bebida higiénica?
Todos sabemos que há quem o condene, a ponto de haver certos países que chegaram a decretar leis secas. E eu direi, como afirmou o Prof. Dr. Kaufman, da Universidade de Missouri: «estes estão dominados por uma falta surpreendente do sentido da verdade».
Desde a mais remota antiguidade que o uso do vinho é defendido.
Já Hipócrates, considerado o pai da Medicina, há dois mil e quinhentos anos dizia: «O vinho é uma coisa conveniente ao homem, tanto ao homem são como ao homem doente; deve ser usado e ministrado no momento oportuno e numa justa proporção, segundo a constituição individual».
E através dos tempos os grandes médicos -, baseados em estudos científicos, proclamaram as virtudes do vinho.
E Galeno, Calvo e Plínio, e depois, para me referir a tempos menus recuados, tapamos com Paterson, Júlio Cloquet, Guy de Chauliac, Ambroise Pare, Sydenham, Dupuztren e Malgaigue, Richerand, Bonchordat, Disprone e Dubois, Nelaton, Baudelocque até Laborde, Duclaux, Gautier, Maurice, Perrin, Labemand e Duroz, Hopp-Seyler, Bruke, Volflag, Bunge, Albertoni, Rossi, Porteman e assim sucessivamente. Não desejaria porém esquecer-me da contribuição trazida à defesa do vinho pelos médicos portugueses da actualidade, entra os quais citarei: Samuel Maia, Heitor da Fonseca; Mário Rosa, Carlos Santos, Rafael da Cunha Franco, Toscano Rico, Marques de Almeida, Malafaia Baptista, Ernesto Roma, Adriano Burguete, D. Salvador da Cunha, Mário Cardia, etc.
Sei que é fastidioso para VV. Ex.ªs a enumeração de todo este rosário de nomes - e tantos ficaram por citar -, mas creiam que também foi fastidioso para mim poder esclarecer a minha consciência na busca dos depoimentos de medicina.
Afãs continuemos.
Segundo Duclaux, 79 gr,5 de bom álcool vínico produzem 512 calorias. Ora 37 gramas de gordura e 45 gramas de hidratos de carbono representam 520 calorias, tendo verificado que não se dá alteração na economia quando se substitui o álcool vínico pelas gorduras ou os hidratos.
Armando Gautier e outros médios confirmaram que o vinho tomado em quantidades convenientes fixa 1 gr,5 por dia e por quilograma de peso de cada pessoa.
Um litro de vinho parece oferecer um valor alimentar igual a 600 gramas de pão, 600 gramas de leite, 500 gramas de carne, 1 quilograma de batata, além das vitaminas C e B.
Compreende-se, pois, o valor que o consumo do vinho representa no complemento da ração alimentar das classes menos abastadas do nosso País, por ser abundante e barato.
Compreende-se a afirmação do Sr. Dr. Joaquim Decref, da Academia Real de Medicina de Madrid e vice-presidente da Sociedade Espanhola de Higiene.

O vinho, tal como se produz em Espanha e quando tomado em quantidades moderadas, constitui não só uma bebida higiénica, estimulando as secreções gástricas, como também, pela sua composição complexa, proporciona elementos importantes para a nutrição, além de que, pelo seu álcool etílico, representa um alimento químico de natureza dinâmica directamente utilizável pelo organismo, sendo insubstituível na economia doméstica do trabalhador do nosso País, em virtude do seu preço pouco elevado.

E, para não maçar mais VV. Ex.ªs, direi apenas que, para além do valor fisiológico, o vinho tem o seu valor terapêutico, indicando o que nos diz o Dr. Maurício Loeper, professor da Faculdade de Medicina de Paris:
1.º O vinho pode e deve ser aconselhado:
a) Na dispepsia hiposténica e na hipercloridia;
h) Nas infecções, visto que aumenta a resistência do organismo;
a) Na astenia e na anemia;
d) Em determinadas oligúrias, hipoazotúrias ou hipoclorúrias cuja origem não seja nefropata.
2.º É discutível a sua acção na tuberculose pulmonar.
3.º Está contraindicado:
a) Na gastrite mucosa e hipergenética;
L) Na hipersensibilidade gástrica;
e) Nas colites e na coleldiase;
d) Na hipertensão;
e) Na nefrite crónica;
f) Na cirrose do fígado.
É bem de aceitar que o Dr. Gueniot, que viveu mais de cem anos, atribuísse a sua longevidade ao uso contínuo, mas moderado, do vinho.

O Sr. Mendes de Matos: - Aí é que está o problema. O problema está na moderação.

O Orador: - Perfeitamente de acordo. Por isso o Sr. Dr. Samuel Maia diz: «O vinho é bom, no bom momento, em boa conta».
Mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, curvemo-nos diante da opinião de um dos mais luminosos valores de todos os tempos, esse homem extraordinário cujo labor transfigurou a ciência, salvando milhares de vidas, esse