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236 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 130

O Sr. Nunes Mexia: - Ou a entrega a cada criado ou junto ou separado.

O Orador: - Na minha região, se se der farinha de cevada e farinha de trigo aos criados, numa certa percentagem, eu posso garantir a V. Ex.ª que eles não comem um único grama de farinha de cevada, porque a deitam fora.

O Sr. Nunes Mexia: - É porque são fidalgos.

O Orador: - Fidalgos, não. Estão habituados a comer pão de trigo desde que nasceram.

O Sr. Nunes Mexia: - Mas, tratando-se de uma solução nacional, há que passar por cima dessas razões.

O Orador: - Seria o mesmo que obrigar o produtor de vinho, do apreciado vinho verde ou do magnífico Dão (e não falo dos bons vinhos alentejanos para não ferir susceptibilidades), a vender toda a sua produção e a ir comprar à taberna, para seu consumo, o vinho transformado em zurrapa depois de ter passado pelo canjirão do taberneiro.

O Sr. Nunes Mexia: - Não há zurrapa. O problema está nisto: há uma modificação no paladar, e, ainda que eu concorde que modificar o paladar é sempre difícil, sei, no entanto, que se quisermos encontrar uma solução nacional, poderemos fazê-lo, deveremos mesmo fazê-lo, embora seja a pouco e pouco, para que o paladar se possa ir habituando.

O Orador: - A não ser que esta mistura se faça na moagem, com uma fiscalização rigorosa, isso não dá nada. Se derem esses elementos separadamente ao lavrador, ele não os aceita.

O Sr. Nunes Mexia: - Mas não os dêem separados, doem-nos juntos.

O Orador: - Não falou o Sr. Deputado Nunes Mexia da batata como elemento de incorporação, creio que por ser um produto aquoso e de menor rendimento em pão do que a farinha de cereais. Mas a mistura de batata até 20 por cento, que eu já usei, com farinha de trigos, principalmente de trigos rijos, dá um pão óptimo, pelo menos do tipo caseiro de farinha em rama, e até corrige as características defeituosas ou desequilibradas em amido e glúten de certos trigos ordinários e muito glutinoso, como alguns tremeses.
Simplesmente a batata na mistura não dá mais, ou quando muito dará o seu peso em pão, ao passo que a farinha de trigo dá depois de panificada um aumento de cerca de 20 por cento em pão.
Mas como a batata, por ser regada se pode produzir com abundância, e com um lucro razoável, por cerca de metade ou de um terço do preço do trigo, a sua incorporação no pão, mesmo de fabrico caseiro, também baratearia o seu custo. Na presente ocasião seria a maneira de colocar a preço razoável um excesso de batata que parece existir no nosso mercado - cerca de 62:000 toneladas, se não estou em erro - e que pode produzir o aviltamento do seu preço.
A mistura dos três produtos - cevada, milho e batata - será ainda, de futuro, a saída mais fácil e económica para a grande quantidade destes produtos, que serão produzidos nos milhares de hectares a irrigar dentro de poucos anos.
E não só na colocação e consumo destes produtos se deve pensar desde já, mas também na carne das numerosas cabeças de gado em que, forçosamente, tom de ser transformadas as forragens e subprodutos das culturas de regadio, que só através do gado poderão ter utilização económica.
O nosso País tem um tão diminuto poder de compra que, ao fazer-se qualquer campanha a favor de uma determinada produção, em pouco tempo se vê o mercado inundado desse produto e a braços com a crise de abundância, quase sempre mais difícil de resolver econòmicamente num país que produz caro do que as crises de escassez.
Deu-se isso com o trigo, embora influíssem na superprodução também outros factores quando da Campanha do Trigo; deu-se com a batata, com o arroz, e oxalá as minhas preocupações sejam infundadas quanto aos produtos do futuro regadio, mas parece-me prudente começar-se desde já a pensar no assunto.
Sr. Presidente: no escasso tempo que decorreu depois da apresentação do aviso prévio, e longe, a maior parte do tempo, dos meus livros e arquivos, foram estes os elementos que apressadamente pude reunir para basear as mal ataviadas considerações que acabo de fazer, com o fim de demonstrar as precárias condições económicas em que se encontra e sempre tem vivido o cultivador de trigo no nosso País.
É esta uma das parcelas mais importantes da nossa economia e por isso urge remediar o mal. Se depois do que aqui se terá dito e procurado demonstrar ainda subsistirem dúvidas no espírito dos mais incrédulos, que se faça, sem perda de tempo, o preconizado inquérito, amplo, metódico e sério, e que dele saia uma política do trigo traçada a longo prazo, com continuidade e persistência, que garanta a quem trabalha a terra uma justa remuneração do seu trabalho e do capital que nela emprega, são os meus votos e julgo que será esse também o desejo de todos aqueles que, com resignação evangélica, até agora se têm sacrificado para produzir o «pão nosso de cada dia».
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - A discussão do aviso prévio continuará na próxima sessão, que marco para terça-feira. Estão ainda inscritos para o debate os Srs. Deputados Antunes Guimarães e Figueiroa Rego.
A perspectiva dos trabalhos na próxima semana será: sessões na terça, quarta e quinta-feira, se a conclusão deste debate assim o impuser.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 40 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

José Alçada Guimarães.
José Esquível.
D. Maria Luísa de Saldanha da Gama van Zeller.
Querubim do Vale Guimarães.
Ricardo Malhou Durão.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Albano Camilo de Almeida Pereira Dias de Magalhães.
Álvaro Eugênio Neves da Fontoura.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
Armando Cândido de Medeiros.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Fernão Couceiro da Costa.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Gaspar Inácio Ferreira.