232 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 130
lada «Agricultura extensiva, cultura intensiva e económica », nas quais pus em evidência o inconveniente de um tal sistema, caro, contingente e antieconómico, e o perigo iminente para a economia da exploração agrícola em se aumentar a área da cultura à custa dos pousios, isto é, diminuindo os anos de descanso das terras, processo cómodo e à primeira vista conveniente, mas destruidor da matéria orgânica, difícil ou impossível de se reconstituir naquele meio por outra forma prática, segura e económica que não seja a do pousio, para se manter em nível conveniente a produtividade da terra.
Mas com mágoa constatei que o meu apelo não foi ouvido; «a desorientação continuou e agora a maior parte dessa» terras mais pobres, como nas serras de Mértola e de Serpa, desfavorecidas ainda pelo clima e pelo excesso de chuvas, que as deslava e arrasta para os rios a melhor terra e os princípios fertilizantes, negam-se a produzir».
Há já alguns anos que as produções vêm baixando, tornando antieconómica a cultura cerealífera, pois «quando se esgota a matéria orgânica - estas terras - negam-se a produzir e têm que ficar de pousio», como de há muito havia também observado e escrito o Prof. Rebelo da Silva e o fizeram noutros países outros autores de grande nomeada, como Sir John Russel.
Apesar do aumento progressivo do preço do trigo nos últimos anos, nas regiões das terras mais pobres - e é o caso do sul do distrito de Beja- já quase desapareceram os seareiros nestes últimos anos, e as terras que eles dantes disputavam pura as cultivarem ao quarto têm ficado de pousio porque os poucos seareiros que escaparam à ruína económica dos últimos anos nem mesmo ao oitavo as puderam ou quiseram cultivar.
Seria interessante, Sr. Presidente, apurar quantos seareiros, o mesmo é dizer famílias de pequenos agricultores, viviam até 1940, por exemplo, à custa da cultura do trigo e deixaram de o produzir, pelo menos para venda em quantidade que possa influir no abastecimento do País.
Sabe-se, pela observação directa e pela falta de procura de terra, que essa laboriosa classe deve ter diminuído talvez não menos de 90 por cento, mas não consegui números oficiais para o demonstrar. Ainda tentei obter da Federação Nacional dos Produtores de Trigo esses elementos, pela diminuição dos manifestos de pequenas quantidades até 10:000 quilogramas, por exemplo, mas os números registados e obsequiosa e prontamente fornecidos pela Federação não nos elucidam.
Se é certo que desapareceram muitos manifestantes por terem deixado de produzir trigo para venda, e ainda mais por terem deixado de o cultivar, essa quebra foi preenchida com a baixa de categoria de outros cultivadores, e principalmente por ser facultado aos produtores fazerem mais de um manifesto, e ainda por ser permitido aos grémios agruparem pequenos produtores num só manifesto, além de outras circunstâncias.
Ainda há poucos dias me dizia um progressivo lavrador do termo de Mértola que até 1943 dava terra à ração a 330 seareiros e em 1946 já tinha só 2. Todos os outros haviam desaparecido, ficando as terras por cultivar. E como eram terras pobres, que não davam conta ao lavrador cultivá-las, tiveram de ser aproveitadas paru pastagem. Este ano só com o pequeno aumento que teve o preço do trigo ($20) e na esperança de que o custo da cultura baixasse, visto que tínhamos entrado na psicose da baixa, já apareceram numerosos seareiros a pedir terra à ração para alqueivarem, e quem sabe à custa de quantos sacrifícios o vão fazer na expectativa de ganharem alguma coisa.
Os elementos que a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Beja amavelmente me forneceu sobre o movimento de empréstimos por ela feitos no último decénio mostram claramente o agravamento da situação económica do lavrador alentejano.
Mesmo não desejando abusar da generosidade de VV. Ex.ªs em me escutarem, julgo indispensável fazer algumas referências a estes números.
Indicarei apenas os números redondos relativos aos milhares de escudos. Para 1938 transitaram do ano anterior empréstimos no valor de 444 contos. Já transitaram para o ano seguinte (1939) 71 empréstimos, no valor de 1:433 contos. De 1939 para 1940 transitaram 113 empréstimos, no valor de 2:525 contos. De 1940 para 1941 250 empréstimos, no valor de 7:073 contos. Para o ano seguinte (1942) transitaram 230 empréstimos, no valor de 7:414 contos. Para 1943 baixaram um pouco, para 220 empréstimos e 6:917 contos, exactamente por ter sido o ano de 1942 de boas produções de trigo.
De 1943 para 1944 tornou a subir o número de empréstimos por pagar (234), no valor de quase 8:175 contos. De 1944 para 1945 baixou um pouco a importância dos empréstimos (7:709 contos), mas aumentou o número de mutuários para 260, o que mostra as dificuldades financeiras de um maior número de agricultores. De 1945 para 1946 transitaram 382 empréstimos, no valor de 12:415 contos, e de 1946 para 1947, 352, no valor de 12:094 contos. De 1947 para 1948 já transitaram por pagar mais empréstimos (370), no valor de 12:229 contos.
Em conclusão: de 444 contos que ficaram por pagar em 1937 foram aumentando os empréstimos em dívida até 1947, ano em que já ficaram por pagar 12:229 contos. Os empréstimos feitos e o seu montante aumentaram também progressivamente de 137 em 1938, no valor de 2:441 contos, até 1947, ano em que foram feitos 365 empréstimos, no valor de 12:164 contos.
Pelo mapa que também gentilmente nos enviou, a nosso pedido, a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Serpa, relativo ao mesmo decénio, chegamos a conclusões idênticas.
Assim, nesta Caixa transitaram de 1937 para 1938 233 empréstimos, no valor de 3:699 contos, e foram aumentando sucessivamente o número de empréstimos e a sua importância, de forma que em 1943 já transitaram para 1944 502 empréstimos, no valor de 6:288 contos, e de 1947 transitaram para 1948 700 empréstimos por pagar, no valor de 9:875 contos.
Esclarece ainda o ilustre director desta Caixa: «Julgamos conveniente esclarecer que, se o número de empréstimos não tem aumentado sensivelmente nos últimos dois anos, não é porque a lavoura não tenha tido necessidade de o fazer, mas sim porque grande parte dos agricultores tem o seu crédito esgotado e não pode já levantar mais dinheiro ... É também conveniente notar que grande número de empréstimos são arrumados nos seus vencimentos por encontro com novos empréstimos, em geral de valor aumentado, porque os mutuários não estão em condições de fazer a sua liquidação a dinheiro, e assim vão vivendo à espera do tal ano cerealífero das trinta sementes, que nunca chega».
Devemos ainda lembrar que, se é certo que o maior valor dos empréstimos se deve em parte ao menor valor do dinheiro, também é certo que o maior número de mutuários só se pode atribuir às maiores dificuldades que a lavoura do trigo tem suportado durante estes últimos anos, devidas, não só às baixas produções, mas principalmente a não lhe ter sido pago o trigo por um preço que se aproximasse, pelo menos, do seu preço de custo.
E não se pode atribuir este aumento de dificuldades à quebra de outros rendimentos da exploração agrícola, porque os lavradores que recorreram a estes empréstimos