288-(10) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 132
nião das melhores e mais imparciais competências sobre os assuntos tratados. Não há a veleidade de conhecer tudo ou de sobre tudo discorrer.
O método adoptado tem sido o de colher a opinião das entidades que mais autorizadamente se têm dedicado aos assuntos que se pretendem discutir, sobretudo a de quem sobre eles tem larga experiência, juntar essas opiniões, debatê-las com os que as emitem, e extrair do conjunto uma ideia objectiva que possa ser posta ao Pais de forma simples e clara.
Assim sucedeu com os estudos sobre a energia e os rios portugueses, publicados em apêndices aos pareceres de 1942 e 1943, nos quais intervieram especialistas de dentro e fora das estações oficiais. Eram vastos os projectos que neles se delineavam e ambiciosa a projecção no futuro de suas consequências.
Dizer a um país a consumir por ano apenas 600 milhões de unidades de energia que era possível obter pelo aproveitamento integral dos rios cerca de 9 biliões e resolver simultaneamente problemas de grande magnitude em qualquer parte do Mundo - como o da navegação do Tejo e do Douro, o da exploração por ano de 1 milhão de toneladas de hematites em Trás-os-Montes, o da rega de vastos tratos de terrenos na Cova da Beira e no Ribatejo, e outros - poderia parecer à primeira vista que se ultrapassavam os limites das possibilidades nacionais, tanto na ordem financeira como na técnica e até política.
Mas os factos e a opinião bem informada em breve reconheceram que o que singelamente então se relatara começava a ter foros de realidade próxima.
O início das barragens de Belver e Pracana, primeira pedra no esquema do aproveitamento do Tejo, o estudo da de Fratel e o reconhecimento do Tejo internacional, além do início recente dos aproveitamentos em Espanha para lá de Alcântara, marcam definitivamente a possibilidade de transformar dentro de uns anos o grande rio numa fonte ubérrima de bens materiais, que compreenderá, como foi previsto, a navigabilidade por barcos de 1:000 toneladas até bem dentro de Espanha, a produção de grandes quantidades de energia a preço compensador, a elevação do caudal no estio, que permitirá fácil rega nos ricos terrenos de jusante, e ainda o domínio de caudais, pelo menos dentro de certos limites.
O caso do Douro está hoje, parece, no primeiro plano das concepções económicas de todos os que se dedicam a estes problemas, e ninguém já duvida da sua exequibilidade e importância, nem da urgência que há em efectuá-lo no mais curto espaço de tempo possível.
O País não pode permitir-se ter lá em cima, nas cabeceiras portuguesas do rio, inactivos, jazigos de ferro que se diz ultrapassarem 150 milhões de toneladas e que só podem ser explorados se houver transportes baratos. Tem ali ao pé, a uns parcos quilómetros, um rio já regularizado, que com meia dúzia de barragens se transforma numa excelente via fluvial e que ainda por cima pode produzir considerável quantidade de energia em condições de ser utilizada na fusão dos minérios.
É um projecto largo e ousado, um esquema completo que produz energia e ferro, domina as águas, valoriza uma região pobre, leva a vida e a seiva a populações atrasadas que vivem há longos anos do esforço ingente da terra.
No nosso acanhado meio, de coisas pequeninas, que uma educação comezinha afastara da visão dos grandes problemas, estes dois esquemas apareceram, quando postos na sua forma integral, como utopias que, se pudessem um dia ser realidades, estavam ainda longe da compreensão da vida portuguesa. Mas em breve se verificou que eles são factíveis, tanto no ponto de vista técnico como financeiro.
A sua magnitude não deve amedrontar o génio de um povo que tantas obras grandes produziu em oito séculos de história - em Portugal e noutros continentes - e que fez e está fazendo a suprema obra que pode caber a uma nação - que é a de fundar, política e economicamente, outras nações.
O País não pode viver apenas de pequenos projectos. Tem de alargar as suas ambições e honestamente visar alto. Precisa de abarcar os problemas num sentido de conjunto, de coordenar as variáveis que os constituem e resolvê-los ousadamente com um objectivo seguro e sereno que é o do máximo proveito para o bem comum.
Todas as tristes polémicas e pequeninas vaidades que a humanidade deixa transparecer quando solevantam questões que vão de encontro a velhos e preguiçosos hábitos mentais de nada valem perante a justeza das coisas, e a realidade das eternas e frutuosas benesses que a Providência, muitas vezes generosamente, põe ao alcance dos homens.
5. Nunca devemos, porém, perder a noção das realidades que envolvem num manto sombrio as actuais condições do Mundo. A geração a que pertencemos encontrou diante de si uma tarefa de tal magnitude que ainda hoje parece milagre não ter soçobrado neste torvelinho de paixões que perturbaram o País e mais tarde a Europa nas primeiras décadas deste século.
O 28 de Maio nasceu de um revolto mar de agitações políticas, e não foi possível, no meio delas, imprimir à economia nacional o desenvolvimento que os recursos internos permitiam.
As disponibilidades financeiras herdadas pela actual situação atingiam o fundo de uma longa e contínua descida para o caos.
Houve necessidade, no longo período que vem até agora, de reconstituir a fazenda de um morgadio arruinado e de pôr ao canto da arca disponibilidades que permitissem o desenvolvimento em larga escala, e na medida apropriada, da potencialidade económica da Nação.
Alguma coisa se conseguiu, pode dizer-se que muito se conseguiu, sem contudo se poder afirmar que o muito significa tudo o que podia conseguir-se.
Mas há quem julgue, e acontecimentos recentes o confirmam, que não tem fundo o tesouro penosamente amealhado, e que é possível arquitectar e construir inúmeros e quantas vezes fantasistas projectos, ou levar um modo de vida superior aos nossos rendimentos e disponibilidades à vista, ou até a prazo.
O caso da industrialização ilustra os factos. Imagina-se em muitos sectores que a industrialização do País o levará ao Eldorado da abundância - que nela reside a suprema ventura.
O relator das contas públicas tem talvez, e parcialmente, responsabilidades neste estado de espírito, porque já há longos anos vem aconselhando, com persistência devotada, a necessidade de desenvolver os recursos industriais susceptíveis de ser desenvolvidos. Mas deseja acentuar aqui, como aliás o tem feito sempre com clareza, que a industrialização do País pode enevoar o futuro, se não vier acompanhada de outras medidas que tendam a aproveitar correctamente os seus frutos.
Em primeiro lugar, a criação de novas indústrias ou o desenvolvimento das existentes pressupõe duas coisas fundamentais: uma é a de que o preço de custo dos produtos manufacturados possa competir, em idênticas circunstâncias, com os de nações concorrentes; outra é a da existência de poder de compra e de capacidade de consumo dentro do Pais que permita às novas indústrias as melhores condições de exploração.
Baixo preço de custo faz supor educação técnica apropriada em todos os sectores, desde a mão-de-obra até ao ensino médio e superior, organização administrativa efi-