288-(54) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 132
directamente o agrónomo, e o proprietário ou o agricultor dificilmente progride - por ignorância em muitos casos, por cepticismo noutros.
69. De há muitos anos que o Ministério da Educação Nacional tem grandes responsabilidades neste estado de coisas. E por Ministério da Educação Nacional quer significar-se o organismo, com suas variadas peças e ramificações, e abstrair-se das pessoas que desempenham ou desempenharam funções duma ou outra natureza. A mentalidade que reinou e reina na superintendência e execução do nosso ensino ainda não atingiu o grau de utilidade prática que o progresso da vida social e económica exige. O aluno vive muito de abstracções, vê poucas vezes a realidade dos fenómenos, utiliza em excesso a memória, é obrigado a decorar em demasia. Não está em contacto, ou está pouco em contacto com a vida, na sua crua realidade. O estudo da lei química ou física, do problema matemático ou mecânico, da língua viva ou morta, faz-se ainda muito pelos livros, sem o exercício ou demonstração práticos. E perdem-se por este modo longas horas em coisas inúteis, ou pouco úteis, que poderiam ser gastas em trabalhos profícuos e rendosos.
Ainda não parece terem sido levados em linha de conta os imensos progressos realizados pela evolução da ciência nos domínios da vida económica do Mundo. Esses progressos exigem profundas alterações nos processos de exploração, tanto agrícola como industrial, e nos métodos de distribuição dos produtos. A cultura intelectual desempenha cada vez maior influência na actividade económica, e se não se formarem técnicos, convenientemente treinados, há-de ser difícil, senão impossível, a qualquer país acompanhar o ritmo do progresso, que, no aspecto económico, atinge graves problemas que directamente se ligam à sua vida política.
Temos de criar mentalidades utilitárias no domínio da educação técnica. E quando se diz mentalidades utilitárias quer significar-se a imperiosa necessidade de evitar desperdícios, redundâncias, insuficiências em todos os domínios da actividade económica, pela formação, nas escolas de todos os graus, de homens aptos a poderem ganhar a sua vida pela aplicação dos modernos métodos de exploração agrícola ou industrial.
Vivemos muito sob o peso de abstracções e enquanto não forem adoptados, nas escolas nacionais de todos os graus e modalidades, métodos que despertem nos alunos a curiosidade intelectual, que é mãe do progresso científico, não haverá possibilidade de formar homens indispensáveis à evolução económica do País.
Qualquer reforma que se não inspire nestes princípios está de antemão condenada ao insucesso, e longas colunas do Diário do Governo desde há muitas dezenas de anos têm demonstrado à evidência esta verdade, que todos conhecem.
Uma reforma completa do ensino superior e de todo o nosso ensino médio não pode consistir apenas em estruturas jurídicas ou limitar-se à construção de edifícios mais ou menos vastos ou luxuosos. Não é apenas do invólucro material onde se ministra o ensino, nem da fórmula jurídica que o encadeia, que ressuma a sua eficiência.
O espírito animador e estimulante de fórmulas jurídicas abstractas está em quem as executa, no treino que sofreu, na mentalidade que o avigora.
E se o professor, embora eivado desse espírito ou dessa mentalidade, não tiver assegurado o tempo necessário para ensinar praticamente a sua disciplina, ou lhe faltarem os elementos para esse efeito, estão de antemão criadas as condições de fracasso para a missão que tem de desempenhar e para a reforma que tem de aplicar.
Tudo isto mostra que nunca pode haver ensino eficiente sem a existência de professores cuidadosamente treinados. E na palavra «treinado» se inclui também a consciência da directriz que orientará na vida pedagógica as actividades dos jovens diplomados.
Ora uma das mais importantes missões do ensino superior é criar mentalidades que possam convenientemente dirigir a formação profissional das novas gerações.
O ensino nos liceus e nas escolas médias - agrícolas e industriais - de carácter técnico há-de ser o que a mentalidade dos professores, considerados no conjunto, quiser que seja. Desde que se lhes ofereçam elementos de natureza experimental e horários adaptados à utilização desses elementos, o ensino pode melhorar consideràvelmente.
São as escolas superiores que criam os professores - os licenciados, os engenheiros, os médicos, os agrónomos, os comercialistas, os veterinários e outros - que amanhã irão formar homens úteis para a vida social, nos seus variados aspectos.
Cuidar do treino dos que hão-de desempenhar tão valiosa tarefa, deve constituir um dos profundos objectivos do Ministério da Educação Nacional.
Parece, dados os índices da vida portuguesa, sobretudo nos seus aspectos económicos e até no aspecto pedagógico, haver conveniência em dar às escolas superiores carácter mais prático.
O desenvolvimento do ensino laboratorial tem sido muitas vezes discutido e aconselhado nestes pareceres - e com a existência de melhores e bem dotados laboratórios poderia aumentar o gosto pela investigação científica da parte do pessoal docente das escolas superiores e até, nalguns aspectos, do das escolas secundárias ou médias. Mas a nossa vida laboratorial é ainda hoje muito reduzida, por incompreensão oficial ou outros motivos, porque se assim não fosse já teriam sido tomadas pelas entidades orientadoras do ensino enérgicas medidas no sentido de dar remédio ao que tem sido apontado como causa de graves deficiências.
69. O Estado, pela instituição de bolsas de estudo no estrangeiro, em relativamente larga escala, procurou obviar a alguns dos males acima apontados. Mas não parece serem grandes os benefícios, em outros aspectos da vida económica, dos métodos adoptados.
Noutro lugar deste parecer se assinalam, com os devidos comentários, as despesas e as actividades do Instituto para a Alta Cultura. Pode agora perguntar-se: que efeitos práticos para o desenvolvimento cultural e económico do País tem a actividade dos bolseiros? Em que circunstâncias e sob que aspectos vieram ou vêm exercer a sua acção em Portugal os indivíduos que estudaram ou praticaram em escolas, Universidades e laboratórios estrangeiros? Como foram aproveitadas pelo interesse nacional as verbas despendidas através do Instituto para a Alta Cultura? Melhorou apreciavelmente o ensino elementar, o dos liceus e outras escolas médias e o superior? Espalharam-se pela indústria ou agricultura os beneficiários das bolsas concedidas?
Quanto à vida económica, e em frente dos índices que os especialistas têm apontado ao público, pode dizer-se não ter havido sensível influência, não por culpa deles, quase sempre, mas porque se não criaram condições laboratoriais ou de experimentação nas escolas médias e superiores onde razoavelmente pudessem exercer a sua função e demonstrar as aptidões adquiridas no estágio em institutos de desenvolvida actividade nas ciências aplicadas.
Nos outros campos de actividade cultural, no da pura especulação científica ou literária, na cultura clássica, os sintomas de êxito não parecem ser muito mais salientes, mas sobre isso não apresentará o relator das contas públicas uma opinião. Deseja apenas emitir o juízo, sujeito a correcções, se for demonstrada a sua necessidade, de que o capital despendido por intermédio do Instituto para a Alta Cultura, no que se refere à formação de