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16 DE ABRIL DE 1948 471

Desde que, repito, esta faculdade seja cautelosamente atribuída, parece desnecessário justificá-la. Justifica-se por si própria.
Sr. Presidente: de entre a» normas, destinadas a regular o inquilinato, que nos são propostas, importa considerar duas questões fundamentais, mas inteiramente distintas, que, aliás, a nossa legislação anterior já contemplava: uma, é assegurar a habitação - que cada família, tenha o seu abrigo -, impedindo a rescisão do contrato e dificultando o despejo; outra, é limitar a renda, mais procurando de alguma maneira a sua actualização.
A função social que a propriedade é chamada a desempenhar, através do direito positivo que nos rege (Constituição, artigo 35.º), explica perfeitamente, quando não houvesse outras, razões, a posição tomada quanto à primeira questão.
Desde que o número de casas disponíveis é reconhecidamente inferior ao dos que as necessitam, havia que estabelecer um condicionalismo protector do arrendatário, ainda que com sacrifício do aspecto individual do direito de propriedade.
Este foi, de resto, o caminho seguido por numerosas leis estrangeiras, que tiveram de fazer face às mesmas dificuldades: é a prorrogação forçada da lei espanhola de 21 de Junho de 1920 e continuada pela recente lei de 31 de Dezembro de 1946, das leis francesas de 9 de Março de 1918, 1 de Abril de 1926 e 29 de Junho de 1929, que a lei brasileira de 29 de Agosto de 1946, ainda há bem pouco, portanto, também manteve, e tantas outras.
Pode dizer-se que é uma prática legislativa uniforme, pois foram gerais as perturbações provocadas ;pelas correntes migratórias do campo para a cidade, em virtude das guerras.
Questão mais delicada, pela projecção económico-social que pode ter, e até pela diversidade de soluções que se apresentam para ela, é a dia actualização das rendas.
Eu devo dizer que considero a questão, em si mesma, de indiscutível justiça. Compreendo que em nome da estabilidade da habitação «e criem normas, destinadas a sobrepor-se à própria vontade dos senhorios, cerceando a sua livre disposição. Mas não compreendo o regime tal como se encontra, pois representa uma chocante disparidade: ao arrendatário mantém-se, integralmente, o conjunto de direitos contra fruais, indo ao ponto de poder prorrogar ou fazer cessar, por forma unilateral, o respectivo arrendamento; ao senhorio não ;se permite sequer que os capitais investidos no prédio vão procurando uma retribuição proporcional w, desvalorização da moeda, como aliás sucede em todos os sectores da vida económica.
Adiro, pois, sem a menor relutância, às intenções dos diplomas em debate. Mas por que forma há-de mecanizar-se a actualização das rendas?
Não é fácil, nem talvez possível, prever o, inumerável gama de casos que a aplicação desta medida irá suscitar. Mas há dois factores que hão podem, a meu ver, deixar de considerar-se primaciais: as possibilidades do arrendatário e as necessidades do senhorio.
Quer dizer: o princípio da actualização sistemática seria, teoricamente, o mais defensável; mas nós não podemos consagrá-lo sem ter em conta a capacidade de cumprimento da massa, individualizada, dos arrendatários.
Por esta razão, em vez de um diploma de regras rígidas, ainda que, forçosamente, de feição casuística, suponho que seria preferível entregar o seu ajustamento a tribunais de equidade.
Esta foi a solução dominante nas leis inglesa e brasileira.
Quer a proposta, porém, quer o projecto do Sr. Dr. Sá Carneiro ou o parecer da Câmara Corporativa, preconizam sistemas diversos, tendo embora todos eles como ponto de referência para a actualização o rendimento colectável dos prédios.
É unia solução com foros tradicionais.
A velocidade por que se caminha para atingir esse ponto de referência é que é variável.
Com o projecto alcança-se imediatamente; com a proposta em o parecer esse desiderato obtém-se em andamento mais moderado, sobretudo na proposta.
Além disso a mecânica da proposta tem uma lógica incontestável, bem ao contrário da actualização determinada pela percentagem inicial do parecer, o que me leva a, tendo de aceitar um destes sistemas, optar pelo apresentado pelo Governo.
Todavia, não pode esquecer-se que, ainda que mitigada, daqui deriva uma sobrecarga sobre as rendas, que não deixará de atingir uma cifra de alguns milhares de contos.
Em que medida vai ela reflectir-se nos orçamentos das classes cujos vencimentos ou rendimentos não puderam acompanhar o ritmo da desvalorização monetária?
E este um aspecto que não foi possível aclarar bem.
De forma que, ainda que lógico e moderado o sistema da proposta, seria de desejar vê-lo completado com disposições que atendessem a estas circunstâncias, evitando sobressaltos profundos na vida já atribulada de alguns lares.
Conjuntamente com estas questões, que eu reputo fundamentais, aparecem tratadas outras, também estreitamente ligadas com o inquilinato: a formação do contrato; a caducidade do arrendamento; a transmissão do direito ao arrendamento; a sublocação; o direito de preferência, quer quanto aos prédios para habitação, quer quanto aos destinados ao comércio ou à indústria; as acções de despejo; o depósito de rendas; as alçadas; as sanções penais.
Muitas destas questões mais apropriadamente poderão vir a ser ventiladas quando da discussão na especialidade.
Mas não fujo a opinar desde já que, pelo menos algumas delas,- sem carácter de urgência e de feição muito doutrinária - como a formação do contrato ou o depósito de rendas -, talvez pudessem aguardar - melhor oportunidade para. serem resolvidas, dado que não parece forçoso integrá-las num plano destinado a criar condições favoráveis à construção, que é agora, em última análise, a nosso, preocupação fundamental.
No projectado Código da Locação, e após estudo mais amadurecido, teriam certamente melhor assento.
Destaco, no entanto, uma destas questões - a sublocação -, porque a tenho visto apreciar, e discutir com grande vivacidade.
Ora eu penso que, ao contrário, não é com vivacidade, mas sim com ponderação, que ela terá de ser proveitosamente tratada e resolvida.
Há, por certo, verdadeiros abusos praticados à sombra da faculdade de sublocar, e por vezes mesmo sem que tal faculdade exista - e aqui está logo o primeiro abuso.
Mas não podemos esquecer que talvez 23 por cento da população citadina - em Madrid calculou-se em 35 por cento - tem a sua vida doméstica ligado, a estas disposições.
Muitas situações podem até considerar-se legitimadas desde que os senhorios não usaram do seu eventual direito de despejo.
De momento eu creio que seria preferível procurar uma compensação razoável e justa para o senhorio,